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Unicamp 2020 - 2ª fase - dia 1 - Português, Inglês e Redação


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Redação

REDAÇÃO

PROPOSTA 1

 Você trabalha como colunista em uma revista eletrônica brasileira, bastante acessada por ambientalistas de diferentes países. Esse público demanda, constantemente, matérias sobre a biodiversidade e sobre o caráter multiétnico e multicultural do Brasil. O editor da revista encomendou a você um podcast que aborde a inter-relação entre esses dois temas e sua importância para a sustentabilidade.

Para se preparar para o seu podcast, você escreve o texto que lerá no dia da gravação. Nele você deve:

a) relacionar biodiversidade e sociodiversidade, b) tratar da importância da preservação do patrimônio cultural e ambiental para o crescimento sustentável do Brasil e c) argumentar de modo a convencer seus ouvintes.

Podcasts são arquivos digitais de áudio publicados na internet e que podem ser ouvidos, até mesmo em celulares, a qualquer momento, por qualquer pessoa. São considerados “textos para ouvir”.

Para redigir seu texto, leve em conta os excertos apresentados a seguir.

1) O patrimônio genético nacional e os conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade brasileira contribuem para o desenvolvimento de novos produtos, muitos deles patenteados para ser comercializados. Isso porque o Brasil é um dos poucos países que reúnem as principais características para ter um sistema de acesso ao patrimônio genético e aos conhecimentos tradicionais a ele associados, de modo a promover o desenvolvimento sustentável. A primeira característica é a biodiversidade: são mais de 200 mil espécies já registradas em seus biomas (Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pantanal e Pampa) e na Zona Costeira e Marinha. Este número pode chegar a mais de 1 milhão e oitocentas mil espécies. A segunda característica é a sociodiversidade: são mais de 305 etnias indígenas, com cerca de 270 diferentes línguas, além de diversas comunidades tradicionais e locais (quilombolas, caiçaras, seringueiros, etc.) e agricultores familiares, que detêm importantes conhecimentos associados à biodiversidade. (Adaptado de Patrimônio Genético e Conhecimentos Tradicionais Associados. Disponível em https://www.mma.gov.br/patrimonio-genetico.html. Acessado em 02/08/2019.)

2) o cerrado é milagre, como toda a vida

(é também pedaço do planeta que desaparece)

abraço meu irmão pequizeiro

(...) os jatobás sorriem

as perobas não dizem nada, apenas sentem

(...)

agora prepare seu coração:

correntão vai passar e levar tudo

ninho de passarinho rasteiro também

depois do correntão,

brotou o que tinha que brotar

mas já era tarde – faca fina do arado cortou a raiz

pela raiz e aí não brotou mais nada. aliás, brotou

coisa melhor: soja, verdinha, verdinha

 

que beleza, diziam

(...)

antes de terminar pergunto: quem vai pagar

o preço de tamanha destruição?

“daqui a cem anos estaremos todos mortos”,

disse alguém.

certo. estaremos todos mortos

mas nossos netos, não

o cerrado é milagre, minha gente

(Nicolas Behr, O cerrado é milagre, em Primeira Pessoa. Brasília: LGE Editora, 2005, p. 109.)

 

3) O Cerrado é o lugar onde a sabedoria popular se materializa em planta. Lá as aparências, de fato, enganam. Onde se veem arbustos de galhos retorcidos há o mais importante sistema de captação e reserva de água do Brasil fora da Amazônia. Um sistema baseado em vegetação e que garante nove das principais bacias hidrográficas do país. Ameaçado pela expansão do agronegócio, reduzido a cerca da metade de seu tamanho original, ele agora caminha para a maior extinção de plantas já registrada no mundo, com consequências para a oferta de água e a regulação do clima do centro-sul do país. Falamos de perda de biodiversidade, de segurança hídrica e climática. Um hectare desmatado de Cerrado tem mais impacto hoje do que um hectare desmatado na Amazônia. Não se trata de impedir a produção agrícola. Ao contrário, ela tem condições de aumentar sem precisar desmatar mais – frisa Bernardo Strassburg, diretor do Instituto Internacional para a Sustentabilidade. (Adaptado de Ana Lucia Azevedo, Desmatamento do Cerrado pode levar à extinção de 1.140 espécies de plantas. Disponível em O Globo, 14/10/2018. Acessado em 02/08/2019.)

4) O último relatório da ONU que alerta sobre a velocidade com que as espécies estão se extinguindo (uma de cada oito está ameaçada) assinala que essa destruição da natureza é mais lenta nas terras onde vivem os povos indígenas do que no resto do planeta. Mas também destaca a crescente ameaça que ronda essas comunidades na forma de expansão da agricultura, urbanização, mineração, novas infraestruturas. O Brasil, que abriga a maior parte da Amazônia e o ecossistema mais rico do mundo, é um dos países onde essa ameaça é mais evidente. Segundo Nurit Bensusan, da ONG Instituto Socioambiental (ISA), o papel dos indígenas ganha uma dimensão importante: “Por conhecerem tão intimamente as florestas, eles têm uma percepção muito antecipada das mudanças ambientais. Sabem como lidar com isso. Por exemplo, param de caçar em uma área durante um tempo e assim aliviam o impacto antes que quaisquer outros.” Os indígenas são parte essencial dos alertas rápidos e da prevenção. (Adaptado de Naiara Galarraga Gortázar, Por que os indígenas são a chave para proteger a biodiversidade planetária: a ONU destaca que nas terras habitadas pelos povos originários o desaparecimento de espécies é mais lento que no resto do mundo. Disponível em El País, 08/05/2019. Acessado em 04/08/2019.)

 

REDAÇÃO

PROPOSTA 2

        Você é um(a) escritor(a) que publica uma crônica em uma revista semanal. Sempre se viu como uma pessoa livre de preconceitos e sempre apoiou a igualdade de gêneros. Hoje, porém, ao ler uma matéria no El País, você se deu conta de que, certa vez, vivenciou um episódio em que considerou normal uma das atitudes listadas nessa matéria, as quais, segundo Ianko López, revelam o micromachismo enraizado em nossa sociedade.

        Diante da sua tomada de consciência, você decidiu que esse será o tema da sua crônica desta semana. Identificou, então, entre as atitudes listadas (excerto 1) a que corresponde à situação que você vivenciou. Em sua crônica, você deve, tal como fez Chimamanda Ngozi Adichie (excerto 2): a) narrar o episódio vivenciado por você, b) relacioná-lo à atitude micromachista escolhida e c) expor suas reflexões sobre os sentimentos que o reconhecimento dessa atitude despertou em você.

Crônica é um gênero textual que aborda temas do cotidiano. Normalmente é veiculada em jornais e revistas. O cronista trata de situações corriqueiras sob uma ótica particular.

        Para redigir o seu texto, leve em conta os excertos apresentados a seguir.

1) As atitudes machistas mais flagrantes são claras para nós. Aquelas que, de forma manifesta e constante, colocam a mulher em uma posição inferior ao homem em contextos sociais, econômicos, jurídicos e familiares. Aquelas que consideram que o homem e a mulher nascem com objetivos e ambições diferentes na vida. No entanto, apesar das reivindicações históricas dos anos 1970 e da crescente conscientização em relação ao machismo em todos os âmbitos culturais e políticos nos últimos anos, há pequenos resquícios que continuam interiorizados em muitos de nós. São sequelas da nossa educação e dos produtos culturais que nos formaram como pessoas e que fazem com que, apesar de criticarmos e denunciarmos o machismo, ainda possamos cair em algumas de suas armadilhas sem perceber. O micromachismo, como vem sendo chamado nos últimos cinco anos, se manifesta em formas de discriminação muito sutis que acontecem todos os dias, até mesmo nos ambientes mais progressistas. Segue uma lista baseada em exemplos que demonstram que talvez tenhamos entendido o grosso das reivindicações feministas, mas ainda precisamos ler as letras miúdas.

1. Achei necessário explicar algo a uma mulher sem que ela me pedisse, pelo simples fato de ser mulher.
2. Comentei com um amigo que ficou cuidando dos filhos: “Hoje te deixaram de babá.”
3. Perguntei a uma mulher se ela estava “naqueles dias” quando me respondeu com indiferença ou desprezo.
4. Disse que “ajudo” nas tarefas do lar, subentendendo que esse é um trabalho da mulher em que eu estou ajudando, e não participando em condições de igualdade.
5. Em meu trabalho ou entre amigos, só chamo os homens para jogar futebol, pressupondo que as mulheres não querem jogar.
6. Perguntei a uma mulher quando vai ter filhos, mas nunca perguntei o mesmo a um homem.
7. Pago todos os meus jantares com mulheres acreditando que é o que se espera de mim.
8. Descrevi uma mulher como “pouco feminina”.
9. Usei a palavra “provocante” para descrever a roupa de uma mulher.
10. Comentei que “essas não são formas para uma moça falar.”
11. Na televisão, aprecio homens ácidos e divertidos e mulheres bonitas.
12. Fiz o comentário “Ela é uma mulher forte”, subentendendo que as mulheres, em geral, são fracas.
13. Deixo meu filho adolescente ficar na rua até as 3 da madrugada, mas obrigo minha filha a voltar antes da meia-noite.

(Adaptado de Ianko López, Micromachismos: se é homem e faz alguma destas coisas, deve repensar seu comportamento. Disponível em El País. https://brasil.elpais.com/brasil/2018/03/07/politica/1520426823_220468.html. Acessado em 28/06/2019.)

2) Quando eu estava no primário, em Nsukka, uma cidade universitária no sudeste da Nigéria, no começo do ano letivo, a professora anunciou que iria dar uma prova e quem tirasse a nota mais alta seria o monitor da classe. Ser monitor era muito importante. Ele podia anotar, diariamente, o nome dos colegas baderneiros, o que por si só já era ter um poder enorme; além disso, ele podia circular pela sala empunhando uma vara, patrulhando a turma do fundão. É claro que o monitor não podia usar a vara. Mas era uma ideia empolgante para uma criança de nove anos, como eu. Eu queria muito ser a monitora da minha classe. E tirei a nota mais alta. Mas, para minha surpresa, a professora disse que o monitor seria um menino. Ela havia se esquecido de esclarecer esse ponto, achou que fosse óbvio. Um garoto tirou a segunda nota mais alta. Ele seria o monitor. O mais interessante é que o menino era uma alma bondosa e doce, que não tinha o menor interesse em vigiar a classe com uma vara. Mas eu era menina e ele, menino, e ele foi escolhido. Nunca me esqueci desse episódio. Se repetimos uma coisa várias vezes, ela se torna normal. Se vemos uma coisa com frequência, ela se torna normal. Se só os meninos são escolhidos como monitores da classe, então em algum momento nós todos vamos achar, mesmo que inconscientemente, que só um menino pode ser o monitor da classe. Se só os homens ocupam cargos de chefia nas empresas, começamos a achar “normal” que esses cargos de chefia só sejam ocupados por homens. Eu tendo a cometer o erro de achar que uma coisa óbvia para mim também é óbvia para todo mundo. Um dia estava conversando com meu querido amigo Louis, que é um homem brilhante e progressista, e ele me disse: “Não entendo quando você diz que as coisas são diferentes e mais difíceis para as mulheres. Talvez fosse verdade no passado, mas não é mais. Hoje as mulheres têm tudo o que querem.” Oi? Como o Louis não enxergava o que para mim era tão óbvio? (Adaptado de Chimamanda Ngozi Adichie.
Sejamos todos feministas. Tradução de Christina Baum. São Paulo: Companhia da Letras, 2015, p. 15-17.)

Você deverá escolher apenas UMA das propostas para desenvolver. Não se esqueça de marcar a proposta escolhida na folha de resposta reservada para a Redação.



Comentários

Neste ano, a UNICAMP trouxe à baila dois gêneros textuais que ainda não haviam sido contemplados em seus vestibulares anteriores: podcast e crônica. Para ambos, a banca ofereceu ao candidato, além das instruções esperadas para a elaboração dos textos, um quadro conceituando brevemente cada um dos gêneros. Assim: 

Podcasts são arquivos digitais de áudio publicados na internet e que podem ser ouvidos, até mesmo em celulares, a qualquer momento, por qualquer pessoa. São considerados “textos para ouvir”.

 

Crônica é um gênero textual que aborda temas do cotidiano. Normalmente é veiculada em jornais e revistas. O cronista trata de situações corriqueiras sob uma ótica particular.

Para a Proposta 1, o candidato deveria considerar-se um colunista de uma revista eletrônica brasileira cujo público-alvo são ambientalistas de diferentes países que costumam demandar do veículo matérias sobre biodiversidade e sobre caráter multiétnico e multicultural do Brasil. Para atender a tal demanda, o editor da revista solicitou a você um podcast que abordasse a inter-relação entre tais temas e sua importância para a sustentabilidade. Apesar de o podcast ser um gênero de áudio, por não se tratar de uma fala espontânea, o colunista deve escrever o texto que será lido no dia da gravação, no qual se cumpram os itens obrigatórios da proposta temática, quais sejam: relacionar biodiversidade e sociodiversidade;  tratar da importância da preservação do patrimônio cultural e ambiental para o crescimento sustentável do Brasil e, por fim, argumentar de modo a convencer seus ouvintes. Assim, o podcast solicitado pela UNICAMP tem caráter argumentativo.

O candidato, para a elaboração do texto, não poderia se furtar do uso dos excertos apresentados. No primeiro excerto, os conceitos de biodiversidade (elevado número de diferentes espécies espalhadas por diferentes biomas brasileiros) e de sociodiversidade (elevado número de etnias indígenas, com muitas línguas diferentes e diversas comunidades tradicionais e locais, além de agricultores familiares) são apresentados como características do Brasil, "um dos poucos países que reúnem as principais características para ter um sistema de acesso ao patrimônio genético e aos conhecimentos tradicionais a ele associados, de modo a promover o desenvolvimento sustentável". No segundo excerto, o poema "O cerrado é milagre" problematiza a destruição desse bioma brasileiro e as possíveis consequências para as futuras gerações. No terceiro excerto, novamente o bioma do Cerrado é protagonista e o texto traz algumas informações interessantes: os arbustos de galhos retorcidos do Cerrado são um importante sistema de captação e a principal reserva de água do Brasil fora da Amazônia e o sistema baseado em vegetação garante nove das principais bacias hidrográficas do país. Contudo, o agronegócio tem ameaçado o Cerrado brasileiro, tendo reduzido-o à metade de sua extensão original e trazendo consequências imediatas, como a maior extinção de plantas já registrada no mundo e comprometendo a oferta de água e a regulação do clima do centro-sul brasileiro. O excerto conclui que não se trata de impedir a produção agrícola, mas de esta ser crescente sem que seja necessário desmatar mais, agravando ainda mais a perda de biodiversidade e a insegurança hídrica e climática. No quarto excerto, é apresentado o resultado do último relatório da ONU sobre a velocidade com que as espécies estão entrando em extinção e segundo o qual tal perda de biodiversidade é mais lenta em terras ocupadas por povos indígenas, possivelmente porque "Por conhecerem tão intimamente as florestas, eles têm uma percepção muito antecipada das mudanças ambientais. Sabem como lidar com isso. Por exemplo, param de caçar em uma área durante um tempo e assim aliviam o impacto antes que quaisquer outros". O mesmo relatório alerta para a crescente ameaça que as comunidades indígenas vêm sofrendo, por meio da expansão agrícola, da urbanização, da mineração e de novas infraestruturas. Destaca-se o Brasil nesse contexto em função de o país abrigar a maior parte da Amazônia, ecossistema mais rico do mundo, mas também por ser o Brasil um dos países em que a ameaça aos povos indígenas é mais evidente. 

Dessa forma, de posse de todas as informações que os excertos trouxeram, o candidato teria condições de relacioná-los e articulá-los à proposta da redação.

Já para a Proposta 2, o candidato deveria se colocar na posição de um escritor ou escritora que semanalmente publica uma crônica em uma revista e cujo perfil é o de uma pessoa que sempre se enxergou como livre de preconceitos e apoiadora da igualdade entre os gêneros. No entanto, ao ler uma matéria (transcrita na prova como texto-fonte, aliás) do El País sobre atitudes machistas enraizadas na nossa cultura, percebeu que já naturalizou, em certa ocasião, um episódio como um dos transcritos na matéria. Isso trouxe ao escritor/escritora uma tomada de consciência que foi a motivação para a elaboração da próxima crônica a ser publicada e na qual tal episódio deve ser narrado, relacionado à atitude micromachista identificada e, posteriormente, reflexões devem ser feitas sobre os sentimentos que o reconhecimento dessa atitude despertou no escritor/escritora. 

Mais uma vez, o candidato não poderia se furtar do uso dos excertos apresentados. O primeiro deles é justamente o texto de Ianko López publicado no El País, que despertou a tomada de consciência do escritor/escritora. Neste texto, apresenta-se o conceito de micromachismo, ou seja, as formas de discriminação mais sutis do cotidiano e que passam despercebidas, sem que, muitas vezes, sejam reconhecidas como machistas. O texto elenca 13 exemplos desse tipo de atitude e em cima de um deles é que o texto do candidato deveria ser baseado. O excerto 2 serve como exemplo de reflexão ao candidato, pois é de autoria de Chimamanda Ngozi Adichie e narra um episódio de sua infância que pode ser considerado como exemplo do micromachismo: mesmo depois de conseguir a nota mais alta da turma, seu colega menino é que foi nomeado monitor de sala, pois seria "óbvio" que meninas não poderiam ocupar tal função. E, apesar de o episódio datar de longa data, a autora defende que as dificuldades para as mulheres, em várias questões, permanecem até hoje e muitas vezes não são explícitas, a ponto de não serem óbvias até mesmo para indivíduos que se dizem progressistas.

Assim, por meio da leitura dos dois excertos e da proposta, o candidato teria que redigir a sua crônica exemplificando uma situação de machismo tão sutil que, quando de sua ocorrência, não foi percebida como tal, mas cuja tomada de consciência veio após a leitura do texto de Ianko López. 

Questão 1 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

A teus pés aliteração

este livro

Meu filho. Não é automatismo. Juro. É jazz do coração. É

prosa que dá prêmio. Um tea for two total, tilintar de verdade

que você seduz, charmeur volante, pela pista, a toda. Enfie a

carapuça.

E cante.

Puro açúcar branco e blue.

(Ana Cristina César, A teus pés. São Paulo: Companhia das Letras, 2019, p. 29.)


a) No poema “este livro” usa-se um recurso poético chamado aliteração. Explique o que é aliteração e identifique um exemplo de aliteração presente nesse texto poético.

b) O poema propõe uma definição do próprio livro e inclui algumas “instruções” para o provável leitor. Identifique dois verbos que instruem o leitor e explique a frase “Não é automatismo”, com base no conjunto do poema.



Resolução

a) A aliteração é um recurso poético caracterizado pela repetição de fonemas que correspondem a sons consonantais; em geral, é empregada para conferir musicalidade ao texto. No excerto do poema de Ana Cristina César verifica-se a aliteração nos seguintes fragmentos:

prosa que dá prêmio”: repetição dos fonemas correspondente a /p/ e /r/.

“Um tea for two total, tilintar de verdade”: repetição do fonema correspondente a /t/.

pela pista”: repetição do fonema correspondente a /p/.

branco e blue”: repetição do fonema correspondente a /b/.

b) Os verbos que instruem o leitor são “enfiar” em “Enfie a carapuça” e “cantar” em “E cante”. Note-se que esses verbos estão flexionados no modo imperativo, o que reforça o aspecto instrucional do texto.

Ao definir seu livro, o eu-lírico afirma que “não é automatismo”, ou seja, não se trata de uma obra convencional, adequada à regras, formas ou princípios literários. Nesse sentido, a autora não está preocupada em reproduzir automaticamente uma expressão poética que se encaixe em um modelo preestabelecido. Antes disso, segundo ela própria, seu livro é “jazz no coração”, “prosa que dá prêmio”, “Um tea for two total, tilintar de verdade”, “charmeur volante, pela pista, a toda”, “Puro açúcar branco e blue” – tais expressões aludem ao fato de que o livro seria antes uma obra que vem do coração, das experiências e emoções mais profundas e intensas do eu-lírico e que, por isso, expressaria a verdade e a autencidade de sua subjetividade.

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Quarto de despejo Casimiro de Abreu

Texto I

(...) Contemplava extasiada o céu cor de anil. E eu fiquei compreendendo que eu adoro o meu Brasil. O meu olhar posou nos arvoredos que existe no início da rua Pedro Vicente. As folhas movia-se. Pensei: elas estão aplaudindo este meu gesto de amor a minha Pátria. (...) Toquei o carrinho e fui buscar mais papeis. A Vera ia sorrindo. E eu pensei no Casemiro de Abreu, que disse: “Ri criança. A vida é bela”. Só se a vida era boa naquele tempo. Porque agora a época está apropriada para dizer: “Chora criança. A vida é amarga”.

(Carolina Maria de Jesus, Quarto de despejo. São Paulo: Ática, 2014, p. 35-36.)

Texto II

RISOS

Ri, criança, a vida é curta,

O sonho dura um instante.

Depois... o cipreste esguio

Mostra a cova ao viandante!

 

A vida é triste ̶ quem nega? ̶

Nem vale a pena dizê-lo.

Deus a parte entre seus dedos

Qual um fio de cabelo!

 

Como o dia, a nossa vida

Na aurora ̶ é toda venturas,

De tarde ̶ doce tristeza,

De noite ̶ sombras escuras!

 

A velhice tem gemidos,

̶ A dor das visões passadas ̶

̶ A mocidade ̶ queixumes,

Só a infância tem risadas!

 

Ri, criança, a vida é curta,

O sonho dura um instante.

Depois... o cipreste esguio

Mostra a cova ao viandante!

(Casemiro J. M. de Abreu, As primaveras. Rio de Janeiro: Tipografia de Paula Brito,1859, p. 237-238.)

 


a) Nas três linhas iniciais do texto I, a autora estabelece uma relação entre o sujeito da ação e o espaço em que ele se encontra. Mencione e explique dois recursos poéticos que compõem a cena narrativa.

b) A representação da infância no texto I se aproxima e, ao mesmo tempo, difere daquela que se encontra no texto II. Considerando que o texto I é um excerto do diário de Carolina Maria de Jesus e o texto II é um poema romântico, identifique e explique essa diferença na representação da infância, com base nos períodos literários.



Resolução

a) No excerto mencionado, observa-se o emprego de dois recursos poéticos na prosa de Carolina Maria de Jesus. Um deles, relacionado a um aspecto formal, é a rima entre “anil” e “Brasil” observada no excerto: “Contemplava extasiada o céu cor de anil. E eu fiquei compreendendo que eu adoro o meu Brasil.” Outro recurso, relacionado à construção de sentido, é o emprego da personificação, presente em “O meu olhar posou nos arvoredos (...)” e “As folhas movia-se. Pensei: elas estão aplaudindo (...)”; nos dois trechos, a autora atribui ações e intencionalidade a seres inanimados.

b) O trecho de Quarto de despejo evidencia que a autora, embora não tenha tido acesso à educação formal, apresentava familiaridade com a cultura letrada e frequentemente dialogava com autores e obras do cânone literário. Nesse caso, ela retoma intertextualmente um verso de Casimiro de Abreu, poeta do romantismo brasileiro, e polemiza com um poema em que esse autor expressa uma visão idealizada da infância. Nesse poema, intitulado “Risos”, o eu-lírico, colocando-se na posição de quem tem experiência e conhecimento sobre a vida, interpela uma criança e a aconselha a rir, ou seja, a ser feliz no momento de sua infância, única fase em que é possível experimentar a felicidade, visto que a juventude e a vida adulta serão marcadas pelos dissabores e desilusões. Trata-se de uma postura típica da segunda geração romântica, em que os poetas apresentavam uma concepção pessimista sobre a vida e procuravam fugir da realidade, projetando a felicidade no mundo dos sonhos, no amor e até mesmo na infância perdida. Carolina de Jesus escreve sua obra entre as décadas de 50 e 60, no período após o Estado Novo, em que houve uma abertura democrática para a emergência de vozes até então ignoradas na literatura brasileira. Nesse contexto, a autora - caracterizada como mulher, negra, pobre, moradora da favela e catadora de lixo - encontra uma receptividade para sua obra e publica seus diários sob o título “Quarto de Despejo”. Nesse livro, ela relata seu cotidiano na favela do Canindé e suas andanças pela cidade de São Paulo no trabalho de recolher do lixo materiais que poderiam ser vendidos nos ferros-velhos; forma pela qual ela conseguia sobreviver e sustentar seus três filhos. No excerto citado, ao observar o sorriso de sua filha Vera, a autora se recorda do poema de Casimiro de Abreu, reproduzindo um de seus versos com uma pequena alteração: no texto original, o poeta diz “Ri, criança, a vida é curta”, enquanto a autora o cita como ““Ri criança. A vida é bela”. Tal alteração contribui para a expressão da visão de mundo de Carolina de Jesus, uma vez que ela recria o verso dizendo “Chora criança. A vida é amarga”.  Dessa forma, ela se opõe à concepção idealizada da vida e da infância presente no poema romântico, expressando a difícil realidade enfrentada não apenas por sua família, mas por grande parte da população brasileira que, naquele período, se via empurrada para as favelas, às margens dos rios da cidade e às margens da própria cidadania.

Questão 3 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

A falência

Resumindo seus pensamentos de vencido, Francisco Teodoro disse alto, num suspiro:

― Trabalhei, trabalhei, trabalhei, e aqui estou como Jó!

(...)

― Como Jó! Repetiu ele furioso, arrancando as barbas e unhando as faces. Não lhe bastava o arrependimento, a dor moral, queria o castigo físico, a maceração da carne, para completa punição da sua inépcia.

Não saber guardar a felicidade, depois de ter sabido adquiri-la, é sinal de loucura. Ele era um doido? Sim, ele era um doido. Tal qual o avô. Riu alto; ele era um doido!

(Júlia Lopes de Almeida, A Falência. Campinas: Editora da Unicamp, 2018, p. 296.)


a) O protagonista de A Falência encarna um tipo representativo da sociedade brasileira do século XIX. Aponte quatro características desse tipo social constatadas na trajetória de Francisco Teodoro.

b) No excerto acima, o narrador se detém no momento em que o protagonista, atormentado, revê sua trajetória e se recorda do avô. Caracterize a voz narrativa nesse excerto e explique seu funcionamento.



Resolução

a) Francisco Teodoro, protagonista do romance A falência, representa um tipo social comum no contexto brasileiro do século XIX. Para atender à questão proposta, o candidato deveria citar quatro das seguintes características que definem esse tipo social:

I - Trata-se do imigrante português que chega ao Brasil com o objetivo de fazer fortuna.

II - Em sua terra de origem, esses imigrantes eram muito pobres e enfrentavam condições precárias de vida.

III - Tal como Francisco Teodoro, os portugueses, normalmente, se empregavam no comércio.

IV - Esses sujeitos orientavam-se pela ética do trabalho e da acumulação, uma vez que consideravam que a riqueza só poderia ser alcançada pelo esforço e pela previdência.

V - Estando estabelecidos na nova sociedade, casam-se e constituem família de acordo com o modelo patriarcal, que preconizava a autoridade da figura paterna e a submissão da mulher, da mesma forma que via nos filhos um modo de dar continuidade ao trabalho e transmitir a herança.

b) No excerto apresentado, a voz narrativa descreve o desespero de Francisco Teodoro que, por um ato de imprudência, perde toda sua fortuna. A angústia do personagem é expressa pelo discurso direto nos seguintes trechos “― Trabalhei, trabalhei, trabalhei, e aqui estou como Jó!  (...) ― Como Jó! Repetiu ele furioso, arrancando as barbas e unhando as faces.” Entretanto, observa-se uma mudança na voz narrativa no trecho em que o personagem revê sua trajetória e se recorda do avô: nesse ponto, ao invés do discurso direto, observa-se o emprego do discurso indireto livre, através do qual os pensamentos do personagem misturam-se à voz do narrador em terceira pessoa. Esse procedimento pode ser verificado no seguinte trecho: “Ele era um doido? Sim, ele era um doido. Tal qual o avô. Riu alto; ele era um doido!”.

Questão 4 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Ambiguidade e Polissemia Figuras de Linguagem

era uma vez uma mulher
e ela queria falar de gênero

era uma vez outra mulher
e ela queria falar de coletivos

e outra mulher ainda
especialista em declinações

a união faz a força
então as três se juntaram

e fundaram o grupo de estudos
            celso pedro luft

(Angélica Freitas, Um útero é do tamanho de um punho. São Paulo: Companhia das Letras, 2017, p.14.)

 


Considerando o poema e a imagem, resolva as questões.

a) Explique as ambiguidades presentes nas duas primeiras estrofes do poema.

b) Que figura de linguagem é usada nos três últimos versos do poema? Justifique sua resposta.



Resolução

a) A ambiguidade presente nas primeiras estrofes se dá por meio das palavras “gênero” e “coletivos”. Uma leitura possível, antes de se chegar ao final do texto, seria a de que a palavra “gênero” se relaciona às questões de feminilidade e/ou masculinidade da espécie humana. Além disso, esse mesmo léxico também pode remeter à flexão, no feminino e no masculino, de algumas classes de palavras, por exemplo o substantivo e o adjetivo. Já a palavra “coletivos” pode ser, a princípio, relacionada às situações que envolvem a coletividade, ou seja, àquilo que abrange várias pessoas que compartilham características comuns. Por fim, essa mesma palavra pode ser associada aos substantivos coletivos estudados na gramática. Dessa forma, a ambiguidade pode ser justificada pela dupla possibilidade de leitura das duas palavras analisadas.

b) Considerando a leitura dos três últimos versos, pode-se afirmar que há o uso da ironia, figura por meio da qual se diz o contrário do que se quer dar a entender. Existe, neles, uma quebra de expectativa, visto que os versos anteriores fazem referência a três mulheres que se juntaram para discutir questões, possivelmente, relacionadas a movimentos feministas e, no final, é mostrado, ironicamente, que elas criaram um grupo de estudo cujo nome remete a um linguista, ou seja, a um homem. Isso é irônico justamente por trazer uma ideia contrária da que era esperada, pois o poema direciona o leitor a acreditar que, no final, essas três mulheres iriam se unir e se fortalecer com o intuito de abordar questões próprias do movimento feminista, e não para criar um grupo de estudo que leva o nome de um homem.

Além da ironia, também há, especialmente no penúltimo verso, a elipse, visto que o sujeito do verbo “fundaram” é ocultado.

 

Questão 5 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Interpretação de Textos Pressupostos e Subentendidos

Voltou à moda o velho “faça você mesmo” ou bricolagem. A ideia de que às vezes é melhor trabalhar com a mão na massa, engajando os cidadãos, se tornou uma metáfora para práticas pedagógicas, ações políticas, retórica empreendedora. Mas poucos usam, no Brasil, o termo que melhor representa essa potência criativa de que as pessoas são capazes: gambiarra. Palavra menos nobre, gambiarra existe, no Brasil e em outros países de língua portuguesa, quase sempre como um termo popular, dialetal ou depreciativo. Porque é um faça-você-mesmo rebelde que recombina peças já existentes, no interior de regras dadas, para inventar novas funções e afirmar novas regras. Escolhi cinco livros que mostram as gambiarras em ação, entre eles, A invenção do cotidiano: Artes de fazer, de Michel de Certeau. Nesse livro, o historiador e teólogo francês apresenta um estudo analítico e um elogio político da criatividade do “cidadão comum”. Ao traçar uma distinção entre estratégias (as regras do jogo formuladas pelos que têm o poder de estabelecer regras) e táticas (os gestos, ações, invenções dos subjugados, que tentam lidar com as regras, mas também achar um jeitinho de driblá-las), Certeau revela as gambiarras que fazem com que o cotidiano se invente e reinvente.

(Adaptado de Yurij Castelfranchi, Livros para imaginar, apreciar e fazer gambiarras. Disponível em https://www.nexojornal.com.br/estante/favoritos/2019/5-livros-para-imaginar-apre ciar-e-fazer-gambiarras. Acessado em 10/08/2019.)


a) Explique por que a gambiarra é, ao mesmo tempo, indisciplinada e criativa.

b) Segundo Castelfranchi, como Michel de Certeau associa a ideia de gambiarra às ações políticas do cidadão comum? Responda com base em dois exemplos citados no texto.



Resolução

a) A gambiarra consiste na inventividade para solucionar uma situação-problema, ao mesmo tempo que se relaciona à quebra de regras já existentes. Ou seja, para que um indivíduo faça uma gambiara, ele precisa atribuir funções novas a, por exemplo, um objeto, e essa atitude exige criatividade e, também, reflete uma ação rebelde, visto que esse objeto já tinha funções pré-estabelecidas. Dessa forma, é válido afirmar que a gambiarra é criativa por necessitar da capacidade de invenção de um indivíduo e, também, que ela é indisciplinada justamente por ir de encontro a regras a fim de que um problema seja solucionado.

b) De acordo com Castelfranch, Michel de Certeau associa a ideia de gambiarra às ações políticas do cidadão-comum, fazendo um elogio à criatividade desse cidadão, pois este elabora estratégias e táticas a fim de lidar com as regras impostas por aqueles que detêm o poder, mas, ao mesmo tempo, com intuito de driblar tais regras, de modo a reinventar o seu cotidiano.

Questão 6 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

entrevista (interpretação) Pressupostos e Subentendidos

O dicionarista e historiador Nei Lopes, autor do Dicionário banto do Brasil, afirmou, em entrevista à Revista Fapesp:

Resolvi elaborar um dicionário para identificar os vocábulos da língua portuguesa com origem no universo dos povos bantos, denominação que engloba centenas de línguas e dialetos africanos. Palavras como babá, baia, banda, caçapa, cachimbo, dengo, farofa, fofoca e minhoca, por exemplo, têm origem provável ou comprovada em línguas bantas e o quimbundo pode ter sido o idioma que mais contribuiu à formação de nosso vocabulário. Ao constatar tal quantidade de palavras originárias de idiomas bantos que circulam pelo país, quis comprovar a importância dessas culturas para o contexto nacional. Assim, escrever dicionários, para mim, também é uma tarefa política. Percebi que dicionários funcionam como um meio didático eficaz para disseminar conhecimento.

Os currículos costumam começar a abordagem sobre a África a partir da escravidão, partindo do princípio de que os nossos ancestrais foram todos escravos. Nos ensinamentos sobre o assunto, é preciso descolonizar o pensamento brasileiro, deixando evidente como os grandes centros europeus espoliaram o continente e que, hoje, a realidade africana é fruto dessas ações.

(Adaptado de Nei Lopes, O dicionário heterodoxo. Entrevista concedida a Cristina Queiroz. Revista Fapesp. Edição 275, jan. 2019.  Disponível em http://revistapesquisa.fapesp.br/ 2019/01/10/nei-braz-lopes-o-dicionarista-heterodoxo/. Acessado em 23/08/2019.)

 


a) Explique, com base em dois argumentos presentes no texto, por que, para o autor, escrever dicionários é uma tarefa política.

b) Que crítica o autor faz aos currículos escolares e que abordagem propõe para o assunto?



Resolução

a) De acordo com o que o autor afirma no excerto da entrevista, escrever dicionários é uma tarefa política que pode ajudar a mudar conceitos e concepções que se encontram enraizados no modo de se compreender a história e a sociedade. Um argumento que sustenta esse ponto de vista é que, ao elaborar um dicionário com vocábulos da língua portuguesa que se originaram dos idiomas bantos, Nei Lopes apresenta a contribuição dessas culturas de origem africana para o contexto brasileiro. Ao disseminar esse tipo de conhecimento através do dicionário, o autor apresenta uma perspectiva que vai além de uma visão que reduz os ancestrais africanos somente à condição de escravos. Essa nova perspectiva possibilita descolonizar o pensamento, evidenciando que, no passado, a África foi espoliada pelas potências europeias e que a realidade atual do continente é resultado dessas ações. Outro argumento que reforça o ponto de vista do autor é que dicionários funcionam como um meio didático eficaz para disseminar conhecimento e as escolhas dos conhecimentos que serão disseminados e do que será enfatizado são tarefas políticas. Em suma, ao escrever esse dicionário, Lopes retrata os africanos como produtores de cultura, muito além da condição de escravizados, o que acarreta mudanças políticas na compreensão da história da formação do país e de seu povo.

b) Nei Lopes critica o fato de os currículos escolares abordarem a história da África a partir da escravidão, partindo do pressuposto de que os ancestrais africanos eram todos escravos, ou seja, como se a condição de ser escravo fosse inerente ao africano daquele período. Para se contrapor a essa abordagem, o autor propõe a “descolonização do pensamento brasileiro” a partir da demonstração de que as potências europeias espoliaram a África e que os seres humanos que viviam nesse continente foram colocados na condição de escravos por essas mesmas potências; assim, ele propõe que se faça uma reflexão sobre a realidade africana contemporânea como resultado desse processo histórico.

Questão 7 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

intertexto Verbo denotação conotação

Texto I

“Menino do Rio” (Caetano Veloso, Cinema Transcendental, 1979.)

Menino do Rio

Calor que provoca arrepio

Dragão tatuado no braço

Calção corpo aberto no espaço

Coração, de eterno flerte

Adoro ver-te

(...)

O Havaí, seja aqui

Tudo o que sonhares

Todos os lugares

As ondas dos mares

Pois quando eu te vejo

Eu desejo o teu desejo

Texto II

“Haiti” (Caetano Veloso e Gilberto Gil, Tropicália 2, 1993.)

(...)

E quando ouvir o silêncio sorridente de São Paulo

Diante da chacina

111 presos indefesos, mas presos são quase todos pretos

Ou quase pretos, ou quase brancos quase pretos de tão pobres

E pobres são como podres e todos sabem como se tratam os pretos

(...)

Pense no Haiti, reze pelo Haiti

O Haiti é aqui

O Haiti não é aqui

(Disponível em http://www.caetanoveloso.com.br/. Acessado em 12/10/2019.)

 

  • Havaí é uma ilha do Pacífico, um Estado norte-americano conhecido pelo turismo e por suas praias paradisíacas que atraem surfistas do mundo inteiro.
  • Haiti é uma ilha do Caribe, atualmente sob intervenção da ONU; é o país mais pobre das Américas, com mais de 60% da população subnutrida.

a) O verso “O Havaí, seja aqui” (texto I), de Caetano Veloso, e o verso “O Haiti é aqui” (texto II), de Caetano e Gilberto Gil, refletem diferentes posições em relação aos lugares a que se referem. Explique como o uso do verbo “ser” define cada uma dessas posições.

b) Explicite as duas visões dos compositores ao dizerem: “O Haiti é aqui” / “O Haiti não é aqui” (texto II).



Resolução

a) No texto I, o verbo “ser” está flexionado no presente do subjuntivo, mostrando que o eu-lírico da música possui o desejo de que o lugar onde ele está, representado pelo advérbio “aqui” o qual se relaciona à cidade do Rio de Janeiro, seja o Havaí, um cenário paradisíaco e idealizado.

Por sua vez, no texto II, o verbo “ser” está flexionado no presente do indicativo, fazendo com que tal construção saia da idealização existente no texto I e parta para uma situação concreta e real. O texto II utiliza o presente do indicativo para denunciar uma realidade social cruel e constante, na qual a cidade de São Paulo e por extensão todo o Brasil estão inseridos.

b) Ao dizer “O Haiti é aqui”, os compositores fazem uma abordagem simbólica e figurada, pois comparam a realidade do Brasil à do Haiti, visto que ambos lugares sofrem de fome, pobreza, violência e outros problemas sociais.  Logo em seguida, de forma paradoxal, os compositores afirmam “O Haiti não é aqui” e, dessa vez, fazem uma abordagem literal, já que Brasil e Haiti são, de fato, localizações diferentes.

Questão 8 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Estrutura Vocabular - Processos de formação de palavras Prefixal e Sufixal

Texto I

Em Bacurau, vilarejo fictício no meio do nada que recebe o nome de um pássaro “brabo” de hábitos noturnos, o sertão é também o centro do país. Bacurau cheira a morte. A primeira sequência do longa é a passagem de um caminhão-pipa que atropela caixões pelo caminho. No povoado isolado, mas hiperconectado à internet, os moradores, com uma grande variedade de gêneros, raças e sexualidades, vivem sem água e escondem-se quando o prefeito em campanha pela reeleição chega para distribuir mantimentos vencidos, e despejar livros velhos em frente à escola local. Aí já começa a resistência: em meio à penúria, os moradores organizam-se e ajudamse entre si. Quando o vilarejo literalmente desaparece dos mapas digitais e a comunidade perde a conexão com a internet, a presença de forasteiros coincide com o misterioso aparecimento de cadáveres crivados à bala e Bacurau vive uma carnificina.

(Adaptado de Joana Oliveira, Em ‘Bacurau’, é lutar ou morrer no sertão que espelha o Brasil. El País. Disponível em https://brasil.elpais.com/brasil/2019/08/20/cultura/15663 28403_365611.html. Acessado em 20/10/2019.)

Texto II

(Adaptado do Instagram de Lia de Itamaracá. Disponível em https://www.insta 7zu.com/tag/LiaDeltamaraca. Acessado em 20/10/2019.)


a) Explique por que “bacuralizar” é um neologismo e qual é o processo de formação dessa palavra.

b) Considere as informações sobre o enredo do filme Bacurau presentes no texto I e sobre o papel do Estado na vida da comunidade no texto II. A partir dessas informações, crie um exemplo do uso de “bacuralizar” para cada acepção da palavra registrada no texto II.



Resolução

a) Neologismo é um fenômeno linguístico que consiste na criação de uma palavra nova. Dessa forma “bacuralizar” é um exemplo de neologismo, visto que é um verbo novo criado a partir do substantivo “bacurau”. O processo de formação utilizado para a criação desse novo léxico foi a derivação sufixal, com o acréscimo do sufixo –izar ao substantivo.

b) Considerando os textos I e II, um exemplo de construção que atenda à acepção 1 do verbo “bacuralizar” é: A população do povoado bacuralizou-se para resolver o problema da falta de água, visto que a prefeitura se omitia. Já um exemplo de uso desse mesmo verbo que ilustre a acepção 2  é: A comunidade do vilarejo bacuralizou-se em construções locais com o intuito de se defender das autoridades.

Questão 9 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Evolução Ciclos Biogeoquímicos Environment Science

An international group proposed a framework of nine planetary boundaries that underpin the stability of the global ecosystem. Since the mid-1950s, many elements that ensure the habitability of the planet are degrading at an accelerating pace. The latest research indicates that, as a result of human activity, we have now exceeded the “safe” levels for four planetary boundaries.
Considering these changes, some people believe that human beings can adapt with the help of technology, but that’s not based on fact. “There is no convincing evidence that a large mammal, with a core body temperature of 37°C, will be able to evolve that quickly,” said Prof. Will Steffen of the Australian National University and the Stockholm Resilience Centre.

 

(Fonte: K. L. Nash e outros, Planetary boundaries for a blue planet. Nature ecology & evolution, v. 1, p. 625- 1634, out. 2017. Adaptado de https://www.theguardian.com/environment/2015/ jan/15/rate-of-environmental-degradation-puts-life-on-earth-at-risk-say-scientists. Acessado em 26/09/2019.)

As respostas devem ser apresentadas em português.
a) Considerando as informações da figura, cite um dos limites planetários que apresenta alto risco. Explique como podemos associá-lo à atividade humana no planeta.
b) A afirmação do Prof. Will Steffen se refere a um processo biológico para manter a homeostase corporal nos seres humanos. Que processo é esse e qual a sua importância para os seres humanos?



Resolução

O enunciado da questão menciona que um grupo internacional propôs um quadro de nove fronteiras planetárias que sustentam a estabilidade do ecossistema global. Desde meados da década de 1950, muitos elementos que garantem a habitabilidade do planeta estão se degradando em um ritmo acelerado. As últimas pesquisas indicam que, como resultado da atividade humana, nós agora excedemos os níveis "seguros" para quatro fronteiras planetárias.

Para mensurar isto, temos os limites planetários (Planetary Boundaries) que são divididos em:

  • Alto risco - que são aqueles que estão além da zona de incerteza (High risk - beyond zone of  uncertainty)
  • Risco crescente - na zona de incerteza (Increasing risk - in zone of certainty)
  • Seguro - Abaixo do limite (Safe - below boundary)
  • Os limites que ainda não foram quantificados (Boundary not yet quantified)

a) O candidato deveria citar um dos limites planetários que apresenta alto risco e explicar como podemos associá-lo à atividade humana no planeta.

No quadro, as zonas de alto risco, identificadas em preto, são: a integridade da biosfera - diversidade genética e os fluxos biogeoquímicos do fósforo e do nitrogênio. Bastava escolher um deles.

Se escolheu a redução da diversidade genética, o candidato poderia relacioná-la com o elevado crescimento populacional e com a distribuição desigual da riqueza, ocasionando a intervenção humana em habitats anteriormente estáveis, o que acarreta:

  • perda e fragmentação dos habitats;
  • introdução de espécies e doenças exóticas;
  • exploração excessiva de espécies de plantas e animais;
  • uso de híbridos e monoculturas na agroindústria e nos programas de reflorestamento;
  • contaminação do solo, água, e atmosfera por poluentes; e
  • mudanças climáticas.

Se escolheu o fluxo biogeoquímico do nitrogênio, o estudante poderia citar as ações antrópicas que interferem nesses ciclos, tais como os sistemas agrícolas, que desde o advento da agricultura têm promovido a fixação do nitrogênio no solo, reduzindo sua devolução à atmosfera. Nos últimos 150 anos, esse efeito tem se acentuado, com o aumento da produtividade agrícola, o uso de fertilizantes e o uso de combustíveis fósseis para a geração de energia e a poluição. Grande parte do nitrogênio fixado pela ação do homem, ao invés de retornar à atmosfera na forma de N2, é liberada como óxido nítrico (NO), que dá origem à chuva ácida, ou como óxido nitroso (N2O), que contribui para o efeito estufa.

Já, se escolheu o fluxo biogeoquímico do fósforo, o vestibulando poderia citar a interferência humana através das atividades de mineração, uma vez que o principal reservatório de fósforo na natureza são as rochas. Além disso, a intensificação do uso de fertilizantes contendo fósforo tem interferido em seu ciclo biogeoquímico.

b) De acordo com o texto: "considerando essas mudanças, algumas pessoas acreditam que os seres humanos podem se adaptar com a ajuda da tecnologia, mas isso não é baseado em fatos. 'Não há evidências convincentes de que um grande mamífero, com uma temperatura corporal central de 37°C, será capaz de evoluir tão rapidamente', disse o Prof. Will Steffen, da Universidade Nacional Australiana e do Centro de Resiliência de Estocolmo.

A homeostase consiste na manutenção das condições internas do organismo dentro de uma faixa ótima e constante, de modo a manter o equilíbrio dos processos vitais. Na espécie humana, por exemplo, os sistemas excretor, nervoso e endócrino e o processo de termorregulação são essenciais para a manutenção e garantia da homeostase. Mediante às mudanças climáticas globais, que incluem alterações da temperatura média do planeta, manter a temperatura corporal constante (homeotermia) torna-se um desafio ainda maior. A temperatura corporal do ser humano é de cerca de 37 °C e, em situações de atividade física ou frio extremo, a tendência é que ocorram flutuações nessa temperatura média. Para evitar que essas flutuações aconteçam, existem mecanismos que garantem a homeotermia, dentre os quais podemos citar: elevação da taxa metabólica, sudorese, eriçamento de pelos, tremor e controle do diâmetro de alguns vasos sanguíneos da pele (vasodilatação e vasoconstrição).

Assim, o processo biológico a que se refere a afirmação do professor Will Steffen para manter a homeostase corporal nos seres humanos é a homeotermia. Essa característica é de fundamental importância para garantir a atividade enzimática adequada, uma vez que o metabolismo é controlado por um grande número de enzimas e vias metabólicas que dependem de temperaturas ótimas para o seu funcionamento.

Além da temperatura ótima do corpo, outros atributos biológicos da nossa espécie e das espécies de seres vivos das quais dependemos podem ter um grande impacto em nossa capacidade de adaptação a um cenário de mudanças climáticas globais. Embora as populações humanas e as populações de plantas e animais domesticados tenham o potencial de se adaptar e manter a homeostase em um novo ambiente, por meio do processo de evolução por seleção natural, este geralmente ocorre ao longo de um período excepcionalmente longo. Tendo em vista o tamanho corporal dos seres humanos, suas necessidades energéticas e sua expectativa de vida, é improvável que sejamos capazes de evoluir em uma velocidade que seja compatível com a taxa com a qual o planeta está mudando.

A evolução pode ser acelerada pela seleção artificial realizada pelos seres humanos, bem como pela engenharia genética. Assim, além da importância da evolução para a compreensão dos processos que levaram ao surgimento das espécies atuais, ela também pode ser catalisada pela tecnologia, permitindo grandes avanços nas áreas da medicina, agricultura, indústria e combate a impactos ambientais.

 

Questão 10 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Conflitos na Ásia e Oceania Politics

O texto abaixo descreve um importante monumento associado a um evento histórico ocorrido nos Estados Unidos. Leia-o e responda às questões, em português.

This Memorial is a tribute of remembrance and honor to the 2,977 people killed in the terrorist attacks near the turn of the 21st century. The Memorial’s twin reflecting pools feature the largest manmade waterfalls in North America. The pools sit within the footprints where the Twin Towers once stood. The names of every person who died in the attacks are inscribed into bronze panels edging the Memorial pools, a powerful reminder of the largest loss of life resulting from a foreign attack on American soil and the greatest single loss of rescue personnel in American history.

a) Por que o memorial foi construído? Cite, em português, uma passagem do texto que destaca a importância do evento descrito para a história dos EUA.
b) Aponte um impacto geopolítico para os EUA do acontecimento descrito no texto e identifique um país do Oriente Médio posteriormente envolvido no acontecimento. 



Resolução

a) O Memorial foi construído como uma homenagem às 2.977 pessoas mortas nos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001.

Uma passagem do texto que destaca a importância do evento para os Estados Unidos é:

"(...) maior perda de vidas resultante de um ataque estrangeiro em solo americano e a maior perda de pessoal de resgate na História da América."

"(...) the largest loss of life resulting from a foreign attack on American soil and the greatest single loss of rescue personnel in American history."

b) O principal país do Oriente Médio posteriormente envolvido no acontecimento é o Afeganistão. Os atentados de 11 de setembro foram considerados o estopim para um nova política externa do então presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, chamada de "Guerra ao terror". As reações imediatas foram o aumento das medidas de segurança do país, principalmente no controle de entrada de pessoas cuja nacionalidade eram de países do Oriente Médio e a invasão do Afeganistão com intuito de capturar Osama Bin Laden (cuja autoria dos atentados fora reivindicada) e derrubar o governo Talibã com a justificativa de serem responsáveis por abrigar o grupo Al-Qaeda, que tinha em Osama Bin Laden a figura de seu líder.

Essa política conhecida como "Guerra ao terror" também resultou na invasão do Iraque anos depois, com a justificativa de que o governo ditatorial de Saddam Hussein possuía um arsenal de armas químicas que colocavam em ameaça todo o globo.