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Unesp 2021 - 1ª fase - dia 1


Questão 11 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Os sertões

Para responder às questões de 09 a 15, leia o texto extraído da primeira parte, intitulada “A terra”, da obra Os sertões, de Euclides da Cunha. A obra resultou da cobertura jornalística da Guerra de Canudos, realizada por Euclides da Cunha para o jornal O Estado de S.Paulo de agosto a outubro de 1897, e foi publicada apenas em 1902.

Percorrendo  certa  vez,  nos  fins  de  setembro  [de 1897],  as cercanias de Canudos, fugindo à monotonia de um canhoneio¹ frouxo de tiros espaçados e soturnos, encontramos, no descer de uma encosta, anfiteatro irregular, onde as colinas se dispunham circulando um vale único. Pequenos arbustos, icozeiros² virentes viçando em tufos intermeados de palmatórias³ de flores rutilantes, davam ao lugar a aparência exata de algum velho jardim em abandono. Ao lado uma árvore única, uma quixabeira alta, sobranceando a vegetação franzina.
O sol poente desatava, longa, a sua sombra pelo chão e protegido por ela — braços largamente abertos, face volvida para os céus — um soldado descansava.
Descansava... havia três meses.
Morrera no assalto de 18 de julho [de 1897]. A coronha da Mannlicher4 estrondada, o cinturão e o boné jogados a uma banda, e a farda em tiras, diziam que sucumbira em luta corpo a corpo com adversário possante. Caíra, certo, derreando-se  à  violenta pancada  que  lhe  sulcara  a  fronte,  manchada  de  uma  escara preta.  E  ao enterrarem-se, dias  depois, os mortos, não fora percebido. Não compartira, por isto, a  vala comum de menos de um côvado de fundo em que eram jogados, formando pela última vez juntos, os companheiros abatidos na batalha. O destino que o removera do lar desprotegido fizera-lhe  afinal  uma concessão: livrara-o  da promiscuidade  lúgubre de um fosso repugnante; e deixara-o ali há três meses – braços largamente abertos, rosto voltado para os céus, para os sóis ardentes, para os luares claros, para as estrelas fulgurantes...
E estava intacto. Murchara apenas. Mumificara conservando os traços  fisionômicos, de  modo a incutir a ilusão exata de um lutador cansado, retemperando-se em tranquilo sono, à sombra daquela árvore  benfazeja. Nem um verme — o mais vulgar dos trágicos analistas da matéria — lhe maculara os tecidos. Volvia ao turbilhão da vida sem decomposição repugnante, numa exaustão imperceptível. Era um aparelho revelando de modo absoluto, mas sugestivo, a secura extrema dos ares.

(Os sertões, 2016.)

¹canhoneio: descarga de canhões.
²icozeiro: arbusto de folhas coriáceas, flores de tom verde-pálido e frutos bacáceos.
³palmatória:  planta  da  família  das  cactáceas,  de  flores  amarelo-esverdeadas, com a parte inferior vermelha, ou róseas, e bagas vermelhas.
4Mannlicher: rifle projetado por Ferdinand Ritter von Mannliche


Considerando  o  contexto  histórico  de  produção  do  texto,  o  soldado abandonado e seu “adversário possante” podem ser identificados, em termos políticos, como



a)

militarista e civilista, respectivamente.

b)

abolicionista e escravista, respectivamente.

c)

escravista e abolicionista, respectivamente.

d)

republicano e monarquista, respectivamente.

e)

monarquista e republicano, respectivamente.

Resolução

Para responder a essa questão, o candidato deveria ter em mente que a obra “Os Sertões” aborda a Guerra de Canudos, conflito ocorrido entre 1896 e 1897, durante a primeira década do regime republicano no Brasil. Tem-se, portanto, um contexto histórico em que a república brasileira ainda está em construção.

a) Incorreta. A campanha de Canudos ocorre durante o governo de Prudente de Morais, civil que assume a presidência após dois governos militares (Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto). Surge, nessa época, um movimento civilista (que defende a presença de civis e o afastamento de militares da política) e, ao mesmo tempo, há uma revolta nos círculos militares (que se colocam como órgão necessário à organização do país). No entanto, o trecho citado não menciona essa disputa política entre civis e militares, mas o embate entre as tropas do governo e os habitantes de Canudos.

b) Incorreta. O embate entre exército e sertanejos no arraial de Canudos não se relaciona a questões abolicionistas ou escravistas; trata-se de um contexto histórico marcado pelo processo de consolidação do regime republicano. O abolicionismo é um pensamento presente no século XIX, e a escravidão foi abolida em 1888, não sendo, portanto, um problema do momento abordado pela questão.

c) Incorreta. Conforme apontado no item anterior, a Guerra de Canudos não está relacionada a pensamentos abolicionistas ou escravistas, mas ao contexto da primeira década do regime republicano.

d) Correta. Embora não contestassem diretamente o novo regime, os sertanejos que moravam no arraial de Canudos foram acusados de pretender restaurar a monarquia. Dessa forma, o exército ganhou apoio da opinião pública para justificar suas investidas contra a comunidade. Portanto, o “soldado abandonado” representa, em termos políticos, um membro do exército republicano, enquanto que seu “adversário possante”, pela lógica oficial do governo, seria monarquista.

e) Incorreta. Conforme apontado no item anterior, o “soldado abandonado” mencionado no texto faz parte do exército republicano; já seu “adversário possante” é membro do arraial de Canudos, tido como monarquista. Há, portanto, uma inversão na identificação, em termos políticos, dessas duas figuras.

Questão 12 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Climas brasileiros Climatologia

Para responder às questões de 09 a 15, leia o texto extraído da primeira parte, intitulada “A terra”, da obra Os sertões, de Euclides da Cunha. A obra resultou da cobertura jornalística da Guerra de Canudos, realizada por Euclides da Cunha para o jornal O Estado de S.Paulo de agosto a outubro de 1897, e foi publicada apenas em 1902.

Percorrendo  certa  vez,  nos  fins  de  setembro  [de 1897],  as cercanias de Canudos, fugindo à monotonia de um canhoneio¹ frouxo de tiros espaçados e soturnos, encontramos, no descer de uma encosta, anfiteatro irregular, onde as colinas se dispunham circulando um vale único. Pequenos arbustos, icozeiros² virentes viçando em tufos intermeados de palmatórias³ de flores rutilantes, davam ao lugar a aparência exata de algum velho jardim em abandono. Ao lado uma árvore única, uma quixabeira alta, sobranceando a vegetação franzina.
O sol poente desatava, longa, a sua sombra pelo chão e protegido por ela — braços largamente abertos, face volvida para os céus — um soldado descansava.
Descansava... havia três meses.
Morrera no assalto de 18 de julho [de 1897]. A coronha da Mannlicher4 estrondada, o cinturão e o boné jogados a uma banda, e a farda em tiras, diziam que sucumbira em luta corpo a corpo com adversário possante. Caíra, certo, derreando-se  à  violenta pancada  que  lhe  sulcara  a  fronte,  manchada  de  uma  escara preta.  E  ao enterrarem-se, dias  depois, os mortos, não fora percebido. Não compartira, por isto, a  vala comum de menos de um côvado de fundo em que eram jogados, formando pela última vez juntos, os companheiros abatidos na batalha. O destino que o removera do lar desprotegido fizera-lhe  afinal  uma concessão: livrara-o  da promiscuidade  lúgubre de um fosso repugnante; e deixara-o ali há três meses – braços largamente abertos, rosto voltado para os céus, para os sóis ardentes, para os luares claros, para as estrelas fulgurantes...
E estava intacto. Murchara apenas. Mumificara conservando os traços  fisionômicos, de  modo a incutir a ilusão exata de um lutador cansado, retemperando-se em tranquilo sono, à sombra daquela árvore  benfazeja. Nem um verme — o mais vulgar dos trágicos analistas da matéria — lhe maculara os tecidos. Volvia ao turbilhão da vida sem decomposição repugnante, numa exaustão imperceptível. Era um aparelho revelando de modo absoluto, mas sugestivo, a secura extrema dos ares.

(Os sertões, 2016.)

¹canhoneio: descarga de canhões.
²icozeiro: arbusto de folhas coriáceas, flores de tom verde-pálido e frutos bacáceos.
³palmatória:  planta  da  família  das  cactáceas,  de  flores  amarelo-esverdeadas, com a parte inferior vermelha, ou róseas, e bagas vermelhas.
4Mannlicher: rifle projetado por Ferdinand Ritter von Mannliche


A  paisagem  retratada  no  texto  mostra-se  compatível  com  o  clima que registra



a)

temperaturas elevadas no verão e amenas no inverno e precipitações escassas na maior parte do ano.

b)

temperatura amena pela ação dos fortes ventos e precipitação concentrada nos meses de inverno.

c)

temperaturas  elevadas  e  precipitações  escassas  e  mal  distribuídas ao longo do ano.

d)

temperaturas acima dos 35ºC e chuvas intensas, porém mal distribuídas, ao longo do ano.

e)

temperatura média elevada e duas estações bem definidas, seca e chuvosa, ao longo do ano.

Resolução

O texto extraído do livro "Os sertões", de Euclides da Cunha, tem uma narrativa que se passa  no interior do Nordeste, na sub-região do Sertão. Essa área apresenta domínio do clima semiárido que possui como uma das características marcantes a escassez e irregularidade de chuvas.

Os baixos índices pluvimétricos são provocados pelo predomínio da atuação de sistemas de alta pressão atmosférica (anticiclones) ao longo do ano, além da influência de barreiras orográficas (relevo) que dificultam a chegada da umidade ao interior da região Nordeste.

Considerando isso, pode-se afirmar que:

a) Incorreta. O clima semiárido apresenta médias térmicas mensais elevadas o ano inteiro e, à despeito de uma certa diversidade regional no que diz respeito à distribuição da pluviosidade, o período mais chuvoso tende a se concentrar entre fevereiro e abril. 

b) Incorreta. As temperaturas não são amenas, são elevadas em virtude da localização em área de baixa latitude.

c) Correta. As temperaturas são elevadas em função da localização da região em baixa latitude e a escassez de chuvas  é reflexo da atuação dos sistemas de alta pressão pois esses sistemas inibem a formação de nuvens por conta do movimento de subsidência (descida) do ar característicos dos anticiclones. Deve-se ressaltar também que anticiclones dificultam a chegada de massas de ar úmidas, pois se constituem em sistemas de dispersão de massas de ar (movimento divergente). O resultado da ação desse padrão atmosférico dominante é que em poucos momentos do ano a umidade chega ao Sertão deixando a chuva com uma distribução bastante irregular nessa região.

d) Incorreta. O clima semiárido é caracterizado por chuvas escassas e não chuvas intensas.

e) Incorreta. As características descritas nessa alternativa se referem ao clima tropical semiúmido, dominante especialmente na porção central do Brasil e porções de estados próximos a essa região.

Questão 13 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Os sertões

Para responder às questões de 09 a 15, leia o texto extraído da primeira parte, intitulada “A terra”, da obra Os sertões, de Euclides da Cunha. A obra resultou da cobertura jornalística da Guerra de Canudos, realizada por Euclides da Cunha para o jornal O Estado de S.Paulo de agosto a outubro de 1897, e foi publicada apenas em 1902.

Percorrendo  certa  vez,  nos  fins  de  setembro  [de 1897],  as cercanias de Canudos, fugindo à monotonia de um canhoneio¹ frouxo de tiros espaçados e soturnos, encontramos, no descer de uma encosta, anfiteatro irregular, onde as colinas se dispunham circulando um vale único. Pequenos arbustos, icozeiros² virentes viçando em tufos intermeados de palmatórias³ de flores rutilantes, davam ao lugar a aparência exata de algum velho jardim em abandono. Ao lado uma árvore única, uma quixabeira alta, sobranceando a vegetação franzina.
O sol poente desatava, longa, a sua sombra pelo chão e protegido por ela — braços largamente abertos, face volvida para os céus — um soldado descansava.
Descansava... havia três meses.
Morrera no assalto de 18 de julho [de 1897]. A coronha da Mannlicher4 estrondada, o cinturão e o boné jogados a uma banda, e a farda em tiras, diziam que sucumbira em luta corpo a corpo com adversário possante. Caíra, certo, derreando-se  à  violenta pancada  que  lhe  sulcara  a  fronte,  manchada  de  uma  escara preta.  E  ao enterrarem-se, dias  depois, os mortos, não fora percebido. Não compartira, por isto, a  vala comum de menos de um côvado de fundo em que eram jogados, formando pela última vez juntos, os companheiros abatidos na batalha. O destino que o removera do lar desprotegido fizera-lhe  afinal  uma concessão: livrara-o  da promiscuidade  lúgubre de um fosso repugnante; e deixara-o ali há três meses – braços largamente abertos, rosto voltado para os céus, para os sóis ardentes, para os luares claros, para as estrelas fulgurantes...
E estava intacto. Murchara apenas. Mumificara conservando os traços  fisionômicos, de  modo a incutir a ilusão exata de um lutador cansado, retemperando-se em tranquilo sono, à sombra daquela árvore  benfazeja. Nem um verme — o mais vulgar dos trágicos analistas da matéria — lhe maculara os tecidos. Volvia ao turbilhão da vida sem decomposição repugnante, numa exaustão imperceptível. Era um aparelho revelando de modo absoluto, mas sugestivo, a secura extrema dos ares.

(Os sertões, 2016.)

¹canhoneio: descarga de canhões.
²icozeiro: arbusto de folhas coriáceas, flores de tom verde-pálido e frutos bacáceos.
³palmatória:  planta  da  família  das  cactáceas,  de  flores  amarelo-esverdeadas, com a parte inferior vermelha, ou róseas, e bagas vermelhas.
4Mannlicher: rifle projetado por Ferdinand Ritter von Mannliche


Além da primeira  parte  intitulada “A terra”, outras duas partes, intituladas “O homem” e “A luta”, compõem Os sertões. Verifica-se  assim,  na  própria  estrutura da obra, uma nítida  influência do



a)

Determinismo.

b)

Idealismo.

c)

Iluminismo.

d)

Socialismo.

e)

Liberalismo.

Resolução

a) Correta. De acordo com a corrente do Determinismo, principalmente a difundida ao longo do século XIX e impulsionada por Taine e pelas filosofias cientificistas, o comportamento humano resulta da influência de fatores ligados ao meio, à “raça” e ao momento histórico. Essas três “forças” determinantes das ações humanas são apresentadas, na obra “Os Sertões”, em cada uma de suas partes constituintes: em “A terra”, o estudo geográfico minucioso do sertão baiano procura demonstrar como tal ambiente atua na formação do homem sertanejo; na segunda parte da obra, “O homem”, há uma análise antropológica que contrapõe a “raça sertaneja” aos “mestiços do litoral”; finalmente, “A Luta” é um estudo historiográfico que narra as investidas do exército contra Canudos. Desse modo, nessa última parte, as duas primeiras são unidas de forma a demonstrar como o homem sertanejo (segunda parte), por estar adaptado ao meio em que vive (a primeira parte), foi capaz de resistir bravamente às investidas das tropas enviadas pelo governo, mesmo que tenham sucumbido ao final. Trata-se assim de uma estruturação que segue exatamente os preceitos da corrente determinista, porque comprovaria as teses veiculadas por essa filosofia.

b) Incorreta. O retrato proposto por Euclides da Cunha no trecho e em toda obra “Os Sertões” procura descrever de forma científica os personagens retratados. Trata-se de um princípio de observação, descrição e análise que se afasta de uma postura que busca preceitos metafísicos ou irreais para a concepção ali retratada, como pediria a corrente do Idealismo.

c) Incorreta. O Iluminismo foi um amplo movimento intelectual nascido na Europa durante o século XVIII. Pregando a superioridade da razão e do intelecto, as obras que se inspiram nesse movimento trazem a racionalidade e a ciência para um lugar central. Nesse sentido, não é possível afirmar que haja uma nítida influência do Iluminismo na construção de “Os sertões”, uma vez que a análise elaborada por Euclides da Cunha passa pela descrição e relato dos fatos com intenções de demonstrar de que maneira as condições sociais e ambientais interferem na composição dos povos e na história do Brasil, de maneira geral, e não a capacidade racional dos indivíduos ali retratados ou as possibilidades que a racionalidade poderia lhes trazer.

d) Incorreta. Embora sejam apresentados elementos que permitam uma identificação da observância da luta de classes ou de relações de distribuição desigual dos meios, elas não constituem o eixo estrutural da obra. Euclides da Cunha deixa evidente, em vários momentos, seu olhar observador que nota a discrepância entre os combatentes e, do mesmo modo, as condições infortunas dos homens do sertão; no entanto, ele não utiliza desses elementos para incorporar em seu discurso ou no discurso das personagens ali postas elementos que indiquem uma crítica ao sistema de organização da sociedade capitalista.

e) Incorreta. Liberalismo foi uma doutrina econômica, política e social que surgiu na Europa, no século XVIII, contra o mercantilismo e a intervenção do Estado na economia. Sendo assim, tendo em vista que a obra “Os Sertões” retrata a violenta intervenção do Estado que resulta na total dizimação da comunidade de Canudos, não há elementos que a filiem aos ideias liberalistas.

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Valores semânticos (adjetivo) Os sertões

Para responder às questões de 09 a 15, leia o texto extraído da primeira parte, intitulada “A terra”, da obra Os sertões, de Euclides da Cunha. A obra resultou da cobertura jornalística da Guerra de Canudos, realizada por Euclides da Cunha para o jornal O Estado de S.Paulo de agosto a outubro de 1897, e foi publicada apenas em 1902.

Percorrendo  certa  vez,  nos  fins  de  setembro  [de 1897],  as cercanias de Canudos, fugindo à monotonia de um canhoneio¹ frouxo de tiros espaçados e soturnos, encontramos, no descer de uma encosta, anfiteatro irregular, onde as colinas se dispunham circulando um vale único. Pequenos arbustos, icozeiros² virentes viçando em tufos intermeados de palmatórias³ de flores rutilantes, davam ao lugar a aparência exata de algum velho jardim em abandono. Ao lado uma árvore única, uma quixabeira alta, sobranceando a vegetação franzina.
O sol poente desatava, longa, a sua sombra pelo chão e protegido por ela — braços largamente abertos, face volvida para os céus — um soldado descansava.
Descansava... havia três meses.
Morrera no assalto de 18 de julho [de 1897]. A coronha da Mannlicher4 estrondada, o cinturão e o boné jogados a uma banda, e a farda em tiras, diziam que sucumbira em luta corpo a corpo com adversário possante. Caíra, certo, derreando-se  à  violenta pancada  que  lhe  sulcara  a  fronte,  manchada  de  uma  escara preta.  E  ao enterrarem-se, dias  depois, os mortos, não fora percebido. Não compartira, por isto, a  vala comum de menos de um côvado de fundo em que eram jogados, formando pela última vez juntos, os companheiros abatidos na batalha. O destino que o removera do lar desprotegido fizera-lhe  afinal  uma concessão: livrara-o  da promiscuidade  lúgubre de um fosso repugnante; e deixara-o ali há três meses – braços largamente abertos, rosto voltado para os céus, para os sóis ardentes, para os luares claros, para as estrelas fulgurantes...
E estava intacto. Murchara apenas. Mumificara conservando os traços  fisionômicos, de  modo a incutir a ilusão exata de um lutador cansado, retemperando-se em tranquilo sono, à sombra daquela árvore  benfazeja. Nem um verme — o mais vulgar dos trágicos analistas da matéria — lhe maculara os tecidos. Volvia ao turbilhão da vida sem decomposição repugnante, numa exaustão imperceptível. Era um aparelho revelando de modo absoluto, mas sugestivo, a secura extrema dos ares.

(Os sertões, 2016.)

¹canhoneio: descarga de canhões.
²icozeiro: arbusto de folhas coriáceas, flores de tom verde-pálido e frutos bacáceos.
³palmatória:  planta  da  família  das  cactáceas,  de  flores  amarelo-esverdeadas, com a parte inferior vermelha, ou róseas, e bagas vermelhas.
4Mannlicher: rifle projetado por Ferdinand Ritter von Mannliche


Considerando-se o contexto, o termo que qualifica o substantivo na expressão “adversário  possante” (4º  parágrafo) tem sentido oposto ao termo que qualifica o substantivo em



a)

“violenta pancada” (4º parágrafo).

b)

“tranquilo sono” (5º parágrafo).

c)

“anfiteatro irregular” (1º parágrafo).

d)

“fosso repugnante” (4º parágrafo).

e)

“vegetação franzina” (1º parágrafo).

Resolução

A expresão "adversário possante" é usada para caracterizar como forte o opositor do soldado que fora ferido, logo, deve ser marcada a alternativa que traz um termo que se oponha a esse sentido.

a) Incorreta. O termo "violenta", que qualifica o substantivo "pancada", não remete a nada que se oponha a forte.

b) Incorreta. O termo "tranquilo", que caracteriza o substantivo "sono", não remete a nada que se oponha a forte.

c) Incorreta. O termo "irregular", que caracteriza o substantivo "anfiteatro", não remete a nada que se oponha a forte.

d) Incorreta. O termo "repugnante", que caracteriza o substantivo "fosso", não remete a nada que se oponha a forte.

e) Correta. O termo "franzina", que caracteriza "vegetação", tem um sentido oposto ao de "possante", uma vez que este remete à força, robustez, enquanto que aquele retoma um sentido de fragilidade, fraqueza. 

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Vozes verbais

Para responder às questões de 09 a 15, leia o texto extraído da primeira parte, intitulada “A terra”, da obra Os sertões, de Euclides da Cunha. A obra resultou da cobertura jornalística da Guerra de Canudos, realizada por Euclides da Cunha para o jornal O Estado de S.Paulo de agosto a outubro de 1897, e foi publicada apenas em 1902.

Percorrendo  certa  vez,  nos  fins  de  setembro  [de 1897],  as cercanias de Canudos, fugindo à monotonia de um canhoneio¹ frouxo de tiros espaçados e soturnos, encontramos, no descer de uma encosta, anfiteatro irregular, onde as colinas se dispunham circulando um vale único. Pequenos arbustos, icozeiros² virentes viçando em tufos intermeados de palmatórias³ de flores rutilantes, davam ao lugar a aparência exata de algum velho jardim em abandono. Ao lado uma árvore única, uma quixabeira alta, sobranceando a vegetação franzina.
O sol poente desatava, longa, a sua sombra pelo chão e protegido por ela — braços largamente abertos, face volvida para os céus — um soldado descansava.
Descansava... havia três meses.
Morrera no assalto de 18 de julho [de 1897]. A coronha da Mannlicher4 estrondada, o cinturão e o boné jogados a uma banda, e a farda em tiras, diziam que sucumbira em luta corpo a corpo com adversário possante. Caíra, certo, derreando-se  à  violenta pancada  que  lhe  sulcara  a  fronte,  manchada  de  uma  escara preta.  E  ao enterrarem-se, dias  depois, os mortos, não fora percebido. Não compartira, por isto, a  vala comum de menos de um côvado de fundo em que eram jogados, formando pela última vez juntos, os companheiros abatidos na batalha. O destino que o removera do lar desprotegido fizera-lhe  afinal  uma concessão: livrara-o  da promiscuidade  lúgubre de um fosso repugnante; e deixara-o ali há três meses – braços largamente abertos, rosto voltado para os céus, para os sóis ardentes, para os luares claros, para as estrelas fulgurantes...
E estava intacto. Murchara apenas. Mumificara conservando os traços  fisionômicos, de  modo a incutir a ilusão exata de um lutador cansado, retemperando-se em tranquilo sono, à sombra daquela árvore  benfazeja. Nem um verme — o mais vulgar dos trágicos analistas da matéria — lhe maculara os tecidos. Volvia ao turbilhão da vida sem decomposição repugnante, numa exaustão imperceptível. Era um aparelho revelando de modo absoluto, mas sugestivo, a secura extrema dos ares.

(Os sertões, 2016.)

¹canhoneio: descarga de canhões.
²icozeiro: arbusto de folhas coriáceas, flores de tom verde-pálido e frutos bacáceos.
³palmatória:  planta  da  família  das  cactáceas,  de  flores  amarelo-esverdeadas, com a parte inferior vermelha, ou róseas, e bagas vermelhas.
4Mannlicher: rifle projetado por Ferdinand Ritter von Mannliche


Observa-se o emprego de voz passiva no trecho

 



a)

“Descansava... havia três meses.” (3º parágrafo)

b)

“Caíra,  certo,  derreando-se  à  violenta  pancada  que  lhe sulcara a fronte, manchada de uma escara preta.” (4º parágrafo)

c)

“Nem um verme — o mais vulgar dos trágicos analistas da matéria — lhe maculara os tecidos.” (5º parágrafo)

d)

“Volvia  ao  turbilhão  da  vida  sem  decomposição  repugnante, numa exaustão imperceptível.” (5º parágrafo)

e)

“E  ao  enterrarem-se,  dias  depois,  os  mortos,  não  fora  percebido.” (4º parágrafo)

Resolução

a) Incorreta. O sujeito da forma verbal “descansava” (um soldado) está elíptico. Não se trata de um sujeito que é paciente do processo verbal. A forma verbal “havia”, como verbo impessoal, não admite sujeito e, portanto, não apresenta voz verbal ativa ou passiva.

b) Incorreta. O sujeito da forma verbal “caíra” (um soldado) está elíptico e não assume papel paciente no processo verbal. O sujeito desinencial também é constatado na forma verbal “derreando-se”, porém trata-se de um sujeito que exerce papel agente e paciente do processo verbal, constituindo, pois, voz reflexiva. Já o sujeito da forma verbal “sulcara” é representado pelo pronome relativo “que”, cujo antecedente é “violenta pancada”. Constitui sujeito agente e, portanto, voz ativa.

c) Incorreta. O sujeito da forma verbal “maculara” está explícito em “um verme” e exerce papel ativo no processo verbal, configurando voz ativa.

d) Incorreta. O sujeito da forma verbal “volvia” está elíptico e possui papel agente no processo verbal, constituindo voz ativa.

e) Correta. O sujeito da forma verbal “enterrarem-se” é o termo “os mortos”, o qual exerce papel paciente no processo verbal e constitui, portanto, voz passiva sintética. O sujeito da forma verbal “fora percebido” está oculto na frase, pois refere-se a “um soldado” e, de forma semelhante ao caso anterior, exerce papel paciente do processo verbal, constituindo, pois, voz passiva analítica.

Questão 16 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

textos literários

Leia a narrativa “O leão, o burro e o rato”, de Millôr Fernandes

Um leão, um burro e um rato voltaram, afinal, da caçada que haviam empreendido juntos1 e colocaram numa clareira tudo que tinham caçado: dois veados, algumas perdizes, três tatus, uma paca e muita caça menor. O leão sentou-se num tronco e, com voz tonitruante que procurava inutilmente suavizar, berrou:

— Bem, agora que terminamos um magnífico dia de trabalho, descansemos aqui, camaradas, para a justa partilha do nosso esforço conjunto. Compadre burro, por favor, você, que é o mais sábio de nós três, com licença do compadre rato, você, compadre burro, vai fazer a partilha desta caça em três partes absolutamente iguais. Vamos, compadre rato, até o rio, beber um pouco de água, deixando nosso grande amigo burro em paz para deliberar.

Os dois se afastaram, foram até o rio, beberam água² e ficaram um tempo. Voltaram e verificaram que o burro tinha feito um trabalho extremamente meticuloso, dividindo a caça em três partes absolutamente iguais. Assim que viu os dois voltando, o burro perguntou ao leão:

— Pronto, compadre leão, aí está: que acha da partilha?

O leão não disse uma palavra. Deu uma violenta patada na nuca do burro, prostrando-o no chão, morto.

Sorrindo, o leão voltou-se para o rato e disse:

— Compadre rato, lamento muito, mas tenho a impressão de que concorda em que não podíamos suportar a presença de tamanha inaptidão e burrice. Desculpe eu ter perdido a paciência, mas não havia outra coisa a fazer. Há muito que eu não suportava mais o compadre burro. Me faça um favor agora — divida você o bolo da caça, incluindo, por favor, o corpo do compadre burro. Vou até o rio, novamente, deixando-lhe calma para uma deliberação sensata.

Mal o leão se afastou, o rato não teve a menor dúvida. Dividiu o monte de caça em dois: de um lado, toda a caça, inclusive o corpo do burro. Do outro, apenas um ratinho cinza morto por acaso. O leão ainda não tinha chegado ao rio, quando o rato o chamou:

— Compadre leão, está pronta a partilha!

O leão, vendo a caça dividida de maneira tão justa, não pôde deixar de cumprimentar o rato:

— Maravilhoso, meu caro compadre, maravilhoso! Como você chegou tão depressa a uma partilha tão certa?

E o rato respondeu:

— Muito simples. Estabeleci uma relação matemática entre seu tamanho e o meu — é claro que você precisa comer muito mais. Tracei uma comparação entre a sua força e a minha — é claro que você precisa de muito maior volume de alimentação do que eu. Comparei, ponderadamente, sua posição na floresta com a minha — e, evidentemente, a partilha só podia ser esta. Além do que, sou um intelectual, sou todo espírito!

— Inacreditável, inacreditável! Que compreensão! Que argúcia! — exclamou o leão, realmente admirado. — Olha, juro que nunca tinha notado, em você, essa cultura. Como você escondeu isso o tempo todo, e quem lhe ensinou tanta sabedoria?

— Na verdade, leão, eu nunca soube nada. Se me perdoa um elogio fúnebre, se não se ofende, acabei de aprender tudo agora mesmo, com o burro morto.

Moral: Só um burro tenta ficar com a parte do leão.

¹A conjugação de esforços tão heterogêneos na destruição do meio ambiente é coisa muito comum.

²Enquanto estavam bebendo água, o leão reparou que o rato estava sujando a água que ele bebia. Mas isso já é outra fábula.

(100 fábulas fabulosas, 2012.)


A narrativa de Millôr Fernandes afasta-se do modelo tradicional da fábula na medida em que emprega um tom



a)

moralizante.

b)

fantástico.

c)

lacônico.

d)

ambíguo.

e)

paródico.

Resolução

a) Incorreta. A narrativa de fato apresenta um tom moralizante, ainda que ele seja apresentado de forma um pouco irônica. No entanto, isso não faz com que o texto se afaste do modelo tradicional da fábula, dado que esse gênero sempre apresenta, justamente, um ensinamento moral.

b) Incorreta. O fantástico, na literatura, está relacionado a elementos que quebrem a lógica de verossimilhança comumente aceita e provoquem certo estranhamento, percebido tanto por parte do leitor, quanto por parte de algum personagem que não aceite facilmente a lógica empregada de associação de elementos que não se explicam. Nesse sentido. pode-se afirmar que não há nenhum elemento que indique a adoção de um tom fantástico ao longo da narrativa. Obs.: Deve-se estar atento também para não confundir fantástico com elementos fantasiosos como a personificação de personagens não humanos, o que constitui efeito expressivo e não categorização fantástica.

c) Incorreta. A narrativa apresenta uma linguagem clara e precisa, assim como as fábulas tradicionais, no entanto, isso não é suficiente para caracterizar o tom adotado pelo autor como lacônico, ou seja, sucinto, breve.

d) Incorreta. O único trecho que poderia ser considerado ambíguo ao longo da narrativa seria a "Moral" que ela apresenta, em que o termo "burro" pode ser lido de duas maneiras diferentes. Isso, no entanto, não afasta a narrativa dos modelos tradicionais da fábula. 

e) Correta. O autor emprega um tom paródico ao construir uma narrativa com estrutura similar à de uma fábula, mas com um desfecho que ironiza os comportamentos descritos ao longo do texto. Isso faz com que essa narrativa se distancie do modelo tradicional de fábula, pois, nesse gênero, em geral, não há comportamentos apresentados de forma irônica.

Questão 17 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Paráfrases Interpretação de Textos

Leia a narrativa “O leão, o burro e o rato”, de Millôr Fernandes

Um leão, um burro e um rato voltaram, afinal, da caçada que haviam empreendido juntos1 e colocaram numa clareira tudo que tinham caçado: dois veados, algumas perdizes, três tatus, uma paca e muita caça menor. O leão sentou-se num tronco e, com voz tonitruante que procurava inutilmente suavizar, berrou:

— Bem, agora que terminamos um magnífico dia de trabalho, descansemos aqui, camaradas, para a justa partilha do nosso esforço conjunto. Compadre burro, por favor, você, que é o mais sábio de nós três, com licença do compadre rato, você, compadre burro, vai fazer a partilha desta caça em três partes absolutamente iguais. Vamos, compadre rato, até o rio, beber um pouco de água, deixando nosso grande amigo burro em paz para deliberar.

Os dois se afastaram, foram até o rio, beberam água² e ficaram um tempo. Voltaram e verificaram que o burro tinha feito um trabalho extremamente meticuloso, dividindo a caça em três partes absolutamente iguais. Assim que viu os dois voltando, o burro perguntou ao leão:

— Pronto, compadre leão, aí está: que acha da partilha?

O leão não disse uma palavra. Deu uma violenta patada na nuca do burro, prostrando-o no chão, morto.

Sorrindo, o leão voltou-se para o rato e disse:

— Compadre rato, lamento muito, mas tenho a impressão de que concorda em que não podíamos suportar a presença de tamanha inaptidão e burrice. Desculpe eu ter perdido a paciência, mas não havia outra coisa a fazer. Há muito que eu não suportava mais o compadre burro. Me faça um favor agora — divida você o bolo da caça, incluindo, por favor, o corpo do compadre burro. Vou até o rio, novamente, deixando-lhe calma para uma deliberação sensata.

Mal o leão se afastou, o rato não teve a menor dúvida. Dividiu o monte de caça em dois: de um lado, toda a caça, inclusive o corpo do burro. Do outro, apenas um ratinho cinza morto por acaso. O leão ainda não tinha chegado ao rio, quando o rato o chamou:

— Compadre leão, está pronta a partilha!

O leão, vendo a caça dividida de maneira tão justa, não pôde deixar de cumprimentar o rato:

— Maravilhoso, meu caro compadre, maravilhoso! Como você chegou tão depressa a uma partilha tão certa?

E o rato respondeu:

— Muito simples. Estabeleci uma relação matemática entre seu tamanho e o meu — é claro que você precisa comer muito mais. Tracei uma comparação entre a sua força e a minha — é claro que você precisa de muito maior volume de alimentação do que eu. Comparei, ponderadamente, sua posição na floresta com a minha — e, evidentemente, a partilha só podia ser esta. Além do que, sou um intelectual, sou todo espírito!

— Inacreditável, inacreditável! Que compreensão! Que argúcia! — exclamou o leão, realmente admirado. — Olha, juro que nunca tinha notado, em você, essa cultura. Como você escondeu isso o tempo todo, e quem lhe ensinou tanta sabedoria?

— Na verdade, leão, eu nunca soube nada. Se me perdoa um elogio fúnebre, se não se ofende, acabei de aprender tudo agora mesmo, com o burro morto.

Moral: Só um burro tenta ficar com a parte do leão.

¹A conjugação de esforços tão heterogêneos na destruição do meio ambiente é coisa muito comum.

²Enquanto estavam bebendo água, o leão reparou que o rato estava sujando a água que ele bebia. Mas isso já é outra fábula.

(100 fábulas fabulosas, 2012.)


Uma moral para a narrativa de Millôr Fernandes em conformidade com uma fábula tradicional seria:



a)

Para quem morrer está posto, é melhor a morte com reputação.

b)

Alguns seres humanos, por causa das próprias espertezas, sem perceber se lançam em direção às desgraças.

c)

Alguns homens fazem por mal o que por bem não querem aceitar.

d)

Para os homens, os infortúnios do próximo se tornam um apelo à ponderação.

e)

Os  homens  sensatos  não  desdenham  nem  mesmo  as  coisas modestas.

Resolução

a) Incorreta. O rato não busca uma morte com reputação ou honradez e não a tem como certa. Ao contrário, através de sua observação perspicaz do risco que corria, ele abnega-se de parte da caça de forma subserviente, logo, não zelosa de reputação, justamente para manter-se vivo.

b) Incorreta. A esperteza do rato não o leva à desgraça, ao contrário, posto numa situação de tensão e medo pela vida, ele observa o resultado do comportamento do burro e age na direção oposta para livrar-se da morte, o que não o coloca numa desgraça.

c) Incorreta. Não há ações feitas por mal pelos personagens, nem ao menos ações que eles foram colocados a aceitar por bem. De mesmo modo, as inversões desses lados (aceitar algo de forma contrariada depois de ter sido sugerido que aceitasse por bem) não lhes são postas.

d) Correta. O rato observa o infortúnio do burro – o próximo – e constata, quando é colocado na mesma situação, que lhe caberia uma ação e posicionamento mais comedido e ponderado para que pudesse manter sua vida.

e) Incorreta. O rato não optou por ter uma alimentação mais modesta e, portanto, ser visto como sensato. Foi necessário que ele tomasse a atitude de abdicar do fruto de sua caça para que não perdesse a vida.

Questão 18 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Subordinação

Leia a narrativa “O leão, o burro e o rato”, de Millôr Fernandes

Um leão, um burro e um rato voltaram, afinal, da caçada que haviam empreendido juntos1 e colocaram numa clareira tudo que tinham caçado: dois veados, algumas perdizes, três tatus, uma paca e muita caça menor. O leão sentou-se num tronco e, com voz tonitruante que procurava inutilmente suavizar, berrou:

— Bem, agora que terminamos um magnífico dia de trabalho, descansemos aqui, camaradas, para a justa partilha do nosso esforço conjunto. Compadre burro, por favor, você, que é o mais sábio de nós três, com licença do compadre rato, você, compadre burro, vai fazer a partilha desta caça em três partes absolutamente iguais. Vamos, compadre rato, até o rio, beber um pouco de água, deixando nosso grande amigo burro em paz para deliberar.

Os dois se afastaram, foram até o rio, beberam água² e ficaram um tempo. Voltaram e verificaram que o burro tinha feito um trabalho extremamente meticuloso, dividindo a caça em três partes absolutamente iguais. Assim que viu os dois voltando, o burro perguntou ao leão:

— Pronto, compadre leão, aí está: que acha da partilha?

O leão não disse uma palavra. Deu uma violenta patada na nuca do burro, prostrando-o no chão, morto.

Sorrindo, o leão voltou-se para o rato e disse:

— Compadre rato, lamento muito, mas tenho a impressão de que concorda em que não podíamos suportar a presença de tamanha inaptidão e burrice. Desculpe eu ter perdido a paciência, mas não havia outra coisa a fazer. Há muito que eu não suportava mais o compadre burro. Me faça um favor agora — divida você o bolo da caça, incluindo, por favor, o corpo do compadre burro. Vou até o rio, novamente, deixando-lhe calma para uma deliberação sensata.

Mal o leão se afastou, o rato não teve a menor dúvida. Dividiu o monte de caça em dois: de um lado, toda a caça, inclusive o corpo do burro. Do outro, apenas um ratinho cinza morto por acaso. O leão ainda não tinha chegado ao rio, quando o rato o chamou:

— Compadre leão, está pronta a partilha!

O leão, vendo a caça dividida de maneira tão justa, não pôde deixar de cumprimentar o rato:

— Maravilhoso, meu caro compadre, maravilhoso! Como você chegou tão depressa a uma partilha tão certa?

E o rato respondeu:

— Muito simples. Estabeleci uma relação matemática entre seu tamanho e o meu — é claro que você precisa comer muito mais. Tracei uma comparação entre a sua força e a minha — é claro que você precisa de muito maior volume de alimentação do que eu. Comparei, ponderadamente, sua posição na floresta com a minha — e, evidentemente, a partilha só podia ser esta. Além do que, sou um intelectual, sou todo espírito!

— Inacreditável, inacreditável! Que compreensão! Que argúcia! — exclamou o leão, realmente admirado. — Olha, juro que nunca tinha notado, em você, essa cultura. Como você escondeu isso o tempo todo, e quem lhe ensinou tanta sabedoria?

— Na verdade, leão, eu nunca soube nada. Se me perdoa um elogio fúnebre, se não se ofende, acabei de aprender tudo agora mesmo, com o burro morto.

Moral: Só um burro tenta ficar com a parte do leão.

¹A conjugação de esforços tão heterogêneos na destruição do meio ambiente é coisa muito comum.

²Enquanto estavam bebendo água, o leão reparou que o rato estava sujando a água que ele bebia. Mas isso já é outra fábula.

(100 fábulas fabulosas, 2012.)


Mal o leão se afastou, o rato não teve a menor dúvida.” (8º parágrafo)
Em  relação  à  oração  que  a  sucede,  a  oração  sublinhada  expressa ideia de



a)

consequência.

b)

tempo.

c)

concessão.

d)

condição.

e)

causa.

Resolução

A oração "Mal o leão se afastou" expressa a ideia de tempo, uma vez que ela situa no tempo quando ocorreu a ação do rato. Para exemplificar, poderiamos substituir a oração por uma expressão similar sem que houvesse prejuízo de sentido, como "No momento em que o leão se afastava", em que a ideia de tempo fica mais evidente. Logo, nenhuma das ideias apresentadas nas alternativas incorretas poderia ser sustentada pelo enunciado e pelo contexto.

Questão 19 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

O indicativo e o emprego de seus tempos Tempos dos modos indicativo e subjuntivo

Leia a narrativa “O leão, o burro e o rato”, de Millôr Fernandes

Um leão, um burro e um rato voltaram, afinal, da caçada que haviam empreendido juntos1 e colocaram numa clareira tudo que tinham caçado: dois veados, algumas perdizes, três tatus, uma paca e muita caça menor. O leão sentou-se num tronco e, com voz tonitruante que procurava inutilmente suavizar, berrou:

— Bem, agora que terminamos um magnífico dia de trabalho, descansemos aqui, camaradas, para a justa partilha do nosso esforço conjunto. Compadre burro, por favor, você, que é o mais sábio de nós três, com licença do compadre rato, você, compadre burro, vai fazer a partilha desta caça em três partes absolutamente iguais. Vamos, compadre rato, até o rio, beber um pouco de água, deixando nosso grande amigo burro em paz para deliberar.

Os dois se afastaram, foram até o rio, beberam água² e ficaram um tempo. Voltaram e verificaram que o burro tinha feito um trabalho extremamente meticuloso, dividindo a caça em três partes absolutamente iguais. Assim que viu os dois voltando, o burro perguntou ao leão:

— Pronto, compadre leão, aí está: que acha da partilha?

O leão não disse uma palavra. Deu uma violenta patada na nuca do burro, prostrando-o no chão, morto.

Sorrindo, o leão voltou-se para o rato e disse:

— Compadre rato, lamento muito, mas tenho a impressão de que concorda em que não podíamos suportar a presença de tamanha inaptidão e burrice. Desculpe eu ter perdido a paciência, mas não havia outra coisa a fazer. Há muito que eu não suportava mais o compadre burro. Me faça um favor agora — divida você o bolo da caça, incluindo, por favor, o corpo do compadre burro. Vou até o rio, novamente, deixando-lhe calma para uma deliberação sensata.

Mal o leão se afastou, o rato não teve a menor dúvida. Dividiu o monte de caça em dois: de um lado, toda a caça, inclusive o corpo do burro. Do outro, apenas um ratinho cinza morto por acaso. O leão ainda não tinha chegado ao rio, quando o rato o chamou:

— Compadre leão, está pronta a partilha!

O leão, vendo a caça dividida de maneira tão justa, não pôde deixar de cumprimentar o rato:

— Maravilhoso, meu caro compadre, maravilhoso! Como você chegou tão depressa a uma partilha tão certa?

E o rato respondeu:

— Muito simples. Estabeleci uma relação matemática entre seu tamanho e o meu — é claro que você precisa comer muito mais. Tracei uma comparação entre a sua força e a minha — é claro que você precisa de muito maior volume de alimentação do que eu. Comparei, ponderadamente, sua posição na floresta com a minha — e, evidentemente, a partilha só podia ser esta. Além do que, sou um intelectual, sou todo espírito!

— Inacreditável, inacreditável! Que compreensão! Que argúcia! — exclamou o leão, realmente admirado. — Olha, juro que nunca tinha notado, em você, essa cultura. Como você escondeu isso o tempo todo, e quem lhe ensinou tanta sabedoria?

— Na verdade, leão, eu nunca soube nada. Se me perdoa um elogio fúnebre, se não se ofende, acabei de aprender tudo agora mesmo, com o burro morto.

Moral: Só um burro tenta ficar com a parte do leão.

¹A conjugação de esforços tão heterogêneos na destruição do meio ambiente é coisa muito comum.

²Enquanto estavam bebendo água, o leão reparou que o rato estava sujando a água que ele bebia. Mas isso já é outra fábula.

(100 fábulas fabulosas, 2012.)


    “E o rato respondeu:
    — Muito simples. Estabeleci uma relação matemática entre seu tamanho e o meu — é claro que você precisa comer muito mais.” (12º e 13º parágrafos)
Ao se transpor esse trecho para o discurso indireto, o termo sublinhado assume a seguinte forma:



a)

teria estabelecido.

b)

estabeleceria.

c)

estabelecia.

d)

estabeleceu.

e)

tinha estabelecido.

Resolução

Para a composição do discurso indireto, é necessário que as falas das personagens (o discurso direto) sejam incorporadas ao discurso do narrador como sua enunciação. Essa transposição de discursos geralmente solicita o uso de determinados verbos de elocução e conectivos que possam estabelecer a tecitura textual adequada, assim como a adequação dos tempos verbais.

O enunciado da questão buscava exatamente essa última adequação para que as informações relativas aos tempos verbais se colocassem de forma satisfatória e não provocassem problemas de interpretação.

Nesse sentido, em “E o rato respondeu”, o narrador já se utiliza do pretérito perfeito do indicativo, na forma verbal “respondeu”, situando o narrado num momento anterior à enunciação. Na fala do rato, o mesmo tempo verbal é utilizado na forma verbal “estabeleci”, motivadora da questão. Esses dois usos de tempo puderam coexistir, pois estavam presentes em discursos separados, de modo que é possível ao leitor compreender que o momento da enunciação dado por “respondeu” e a ação nomeada pelo rato em “estabeleci” configuram pretéritos distintos. Em outras palavras, “responder” e “estabelecer” não ocorreram no mesmo pretérito. No instante em que o rato responde, ele já tinha estabelecido num momento anterior.

Quando colocados na mesma enunciação, esses dois pretéritos precisam ser diferenciados e, para isso, utiliza-se o pretérito mais-que-perfeito em sua forma simples ou composta.

Dessa forma, a transposição do discurso direto para o indireto assumiria as possíveis seguintes formas:

“E o rato respondeu que (...) tinha estabelecido uma relação matemática...”

Ou

“E o rato respondeu que (...) estabelecera uma relação matemática...”

a) Incorreta. A forma verbal está no Futuro do Pretérito composto do Indicativo e não atende à clareza de tempos verbais necessária.

b) Incorreta. A forma verbal está no Futuro do Pretérito do Indicativo e não atende à clareza de tempos verbais necessária.

c) Incorreta. A forma verbal está no Pretérito Imperfeito do Indicativo e não atende à clareza de tempos verbais necessária.

d) Incorreta. A forma verbal está no Pretérito Perfeito do Indicativo e não atende à clareza de tempos verbais necessária.

e) Correta. A forma verbal está no Pretérito Mais-que-perfeito Composto do Indicativo e atende à clareza de tempos verbais necessária.

Questão 20 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Arcadismo

A obra Paisagem  italiana  (1805), do pintor alemão Jakob Philipp Hackert (1737-1807), remete, sobretudo, ao ideário do



a)

Realismo.

b)

Romantismo.

c)

Arcadismo.

d)

Barroco.

e)

Naturalismo.

Resolução

No quadro de Hackert, é retratada uma paisagem campestre na qual podem ser observados alguns elementos em destaque, como as árvores portentosas, um monte ao fundo, o qual é acompanhado por um rio que se desloca em curvatura acompanhando o olhar do observador e conferindo-lhe uma noção de imensidão. Da mesma forma, corrobora para essa ênfase à natureza as pequenas figuras de bois e vacas pastando ao fundo em contraste com um mais em destaque à frente, elementos que também remetem ao pastoreio e à atividade campesina. Próximos à árvore presente à direita, encontram-se algumas figuras humanas – acompanhadas de um cachorro –, as quais estão sentadas numa posição que sugere calma, relaxamento e tranquilidade. Suas vestimentas nos apontam para o pertencimento a classes sociais aristocráticas e burguesas em seus momentos de relaxamento e deleite em meio a jogos e conversas abaixo da árvore. Ratifica essa estética o uso de linhas delicadas, de cores claras e de tons pastéis e a ênfase no azul claro misturado ao branco das nuvens em contraste com os tons mais escuros da relva e das copas de árvores, os quais, embora em oposição, não figuram distúrbios ou perturbações. Trata-se, assim, de um elogio às luzes do esclarecimento provocadas pelo período do Iluminismo e o retorno aos períodos Clássicos.

Desse modo, a maior parte dos elementos elencados acima, dentre outros ainda não citados, remete predominantemente ao ideário árcade. O Arcadismo, como movimento estético-literário que refletia a aristocracia em decadência e a alta burguesia em formação, é marcado pelo desejo ao bucólico (como na cena calma descrita), ao simples. Por isso, valorizam o que for próximo à Natureza, ao mundo natural – negando a artificialidade –, principalmente ao que estiver relacionado ao campo, afastado dos grandes centros urbanos e dos processos de industrialização correntes durante o século XVIII, juntamente das inquietações deles advindas.

a) Incorreta. Toda a cena é idealizada e não intenta criar um retrato próximo da realidade dos observadores, de modo a imprimir questionamentos de ordem social.

b) Incorreta. As individualidades estão distanciadas e a natureza retratada não é colocada como opositora aos indivíduos, enfatizando as emoções e sensações de sua presença no mundo. A idealização presente no quadro não se pauta pelas figuras humanas, mas na composição do retrato paisagístico do mundo natural e de sua relação equilibrada junto desses indivíduos.

d) Incorreta. Embora haja algum contrate de luz e sombra, este não é proposto de modo a criar uma perturbação que indique a hesitação do homem da Modernidade, como ocorre no Barroco.

e) Incorreta. Os indivíduos não são retratados de forma realista, com o intuito de tornar o retrato próximo à realidade e fidedigno às características determinantes do ambiente.