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Fuvest 2022 - 2ª fase - dia 2


Questão 1 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Idade Moderna União Ibérica

Analise a imagem:

El Greco, Alegoria da Santa Aliança (Sonho de Filipe II), 1579. El Escorial, Espanha. Óleo sobre tela. PUPPI, Lionello. El Grecco. Florença: Sadea Editore, 1977, prancha 8.

A partir da pintura de El Greco:

a) Identifique um aspecto religioso característico do império espanhol ao final do século XVI.
b) Identifique e explique um aspecto social característico do império espanhol ao final do século XVI.
c) Explique o papel da religião na formulação das justificativas para a colonização da América.



Resolução

a) No final do século XVI o Império Espanhol, governado pela casa dos Habsburgo, era um dos mais poderosos do mundo, uma vez que aquela família detinha os tronos, além da Espanha, de Portugal (União Ibérica, entre 1580 e 1640), Sacro Império Romano Germânico e controlavam regiões tais como os Países Baixos. No aspecto religioso, o século XVI foi marcado pelo processo da Reforma Protestante, a partir de Martinho Lutero e suas 95 teses (1517). Tal fato desencadeou uma reação católica, principalmente a partir do Concílio de Trento (1545-1563). Nesse sentido, a aliança do papa com os governantes espanhóis seria um ponto fundamental para o reforço do catolicismo dentro dos domínios do Império Espanhol. no caso aqui se trata de Filipe II (1554-1598), A tela de El Greco (1541-1614) apresentada pela questão  foi encomendada pelo monarca espanhol Filipe II (1554-1598) e apresenta uma alegoria sobre a aliança do poder político com o poder religioso.

b) A sociedade do Império Espanhol no século XVI era estamental, ou seja, estava dividida em três estamentos. Os dois principais, que eram o Clero e a Nobreza, controlavam o terceiro estamento, formado pelo povo em geral. O controle exercido pelo Clero e pela Nobreza se fazia pelo absolutimo do rei, baseado no direito divino. Dessa forma, aqueles que não se submetessem a essa situação poderiam ser inclusive condenados pela Inquisição, instituição que exerceu forte poder sobre aquela sociedade durente muitos anos. Também podemos afirmar que existia uma sociedade colonial do Império Espanhol, que era controlada pelos chapetones, enviados pelo rei para ocuparem os principais cargos administrativos nas colônias, além dos criollos, que eram os descendentes de espanhois que nasceram na América e formavam a elite econômica daquelas regiões. Cabia aos indígenas, submetidos muitas vezes a trabalhos compulsórios, tais como a mita e a encomienda, e aos escravos, os postos menos favorecidos daquela sociedade.

c) A religião exerceu importante papel para a justificativa da conquista e colonização da América por parte dos europeus. A expansão europeia dos séculos XV e XVI foi norteada por interesses mercantis, mas também pelo desejo de difusão da fé cristã. Dessa forma, a chegada do clero até o novo continente fazia parte do projeto colonial espanhol e a conversão dos indígenas à religião do dominador foi um aspecto fundamental para a consolidação da conquista. Foi inclusive praticado o conceito de "guerra justa", uma vez que a guerra e a eliminação dos indígenas que não aceitassem a conversão ao cristianismo seria assim justificada.

Questão 2 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Independência dos Estados Unidos

“A busca da felicidade” é ainda mais familiar aos americanos do que “devemos cultivar nosso jardim” o é para os franceses. É a frase mais memorável da Declaração de Independência americana, o clímax retórico da enunciação de Thomas Jefferson dos direitos naturais e da teoria revolucionária: “Consideramos como verdades evidentes que todos os homens são criados iguais, que a todos o Criador dotou de certos direitos inalienáveis, entre os quais estão a vida, a liberdade e a busca da felicidade”. O que Jefferson entendia por “busca da felicidade”? (...). Frequentemente, os analistas do discurso político estabelecem um significado mostrando o que não é dito, tanto quanto o que é dito. “Vida, liberdade e propriedade” foi a fórmula-padrão nos debates políticos do mundo de língua inglesa durante os séculos XVII e XVIII. (...) Se a “busca da felicidade” deve ser vista como um recurso de retórica, seu significado deve fundar-se, pelo menos em parte, numa comparação implícita com o direito de propriedade.

DARNTON, Robert. Os dentes falsos de George Washington: um guia não convencional para o século XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 112-113.

a) Indique um dos direitos naturais do Homem evocados por Thomas Jefferson na Declaração de Independência americana.
b) Qual é a relação estabelecida pelo texto entre “busca da felicidade” e “direito de propriedade”?
c) É possível afirmar que a Declaração de Independência dos Estados Unidos contém uma teoria revolucionária? Justifique.



Resolução

a) A Declaração de Independência dos Estados Unidos, datada de 4 de julho de 1776, foi a formalização da intenção dos colonos britânicos da América do Norte em conquistarem autonomia frente ao Império Britânico. A redação do documento coube a Thomas Jefferson (1743-1826), que foi muito influenciado pelo filósofo inglês John Locke (1632-1704). Locke considerava que os homens detinham certos "direitos naturais", ou seja, que já existiam antes da fundação da sociedade, tais como a "vida", a "liberdade" e a "propriedade" e que se algum governo atentasse contra eles, seria direito dos prejudicados derrubar esse governo e estabelecer outro. Assim, como está presente no texto, os direitos naturais evocados por Thomas Jefferson são: "vida", "liberdade" e "busca da felicidade".

b) Segundo o texto, não existe uma definição clara por parte de Thomas Jefferson em relação ao que realmente seria a "felicidade". Nesse sentido, seria necessário entender o contexto das afirmações do autor para chegarmos a uma resposta, bem como a tradição política que o antecedeu e os autores com os quais ele compartilhava suas ideias. Assim, a leitura da Declaração de Independência e dos comentários e análises feitas a ele pode nos fazer entender que a verdadeira felicidade estaria em garantir para si a obtenção dos direitos naturais, especialmente a propriedade. Esse entendimento pode aparecer ao se fazer uma comparação com o que era dito nos debates políticos dos séculos XVII e XVIII: a fórmula recorrente era "vida, liberdade e propriedade". Dessa forma, por associação, podemos notar uma comparação entre "propriedade" e "busca da felicidade", o que também é consonante com a perspectiva estadunidense de direito à propriedade: a ideia de felicidade e realização pessoal está intrinsicamente ligada ao direito de possuir uma propriedade a partir do esforço pessoal, e construir sua vida e sua autonomia individual tendo como bases esses princípios.

c) A Declaração de Independência dos Estados Unidos é fortemente influenciada pelos ideais do filósofo John Locke, considerado um dos fundadores da teoria liberal. O liberalismo foi uma doutrina considerada revolucionária ao longo dos séculos XVIII e XIX, uma vez que ela influenciou processos muito importantes desse período, tais como a Independência dos Estados Unidos (1776) e a Revolução Francesa (1789). Devemos ressaltar que o processo histórico desencadeado pelo documento em questão, embora não questionasse questões como a escravidão, levou à definitiva separação das treze colônias britânicas na América e à promulgação de uma Constituição, cujo governo estabelecido era uma república federativa presidencialista, baseada nos ideais liberais, fato que influencoiu decisivamente para a ocorrência de outras independências nas Américas e para a eclosão da própria Revolução Francesa em 1789, fatos que justificam ter o documento um teor revolucionário.

Questão 3 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

República Oligárquica

O material publicitário apareceu em 1935 nas páginas do Almanaque Fontoura, distribuído gratuitamente nas farmácias e que reunia curiosidades e informações. A partir da leitura da propaganda, responda:

a) Qual o tema da propaganda?
b) Quem é o Jeca Tatu e que categoria social ele representa?
c) Aponte duas razões do emprego do personagem Jeca Tatu na propaganda.



Resolução

a) O tema da propaganda em questão é a existência de um remédio para uma doença chamada "amarelão". A leitura do material nos leva a uma crítica a respeito de uma visão da sociedade brasileira presente começo do século XX. Essa visão foi cristalizada na famosa personagem do escritor Monteiro Lobato (1882-1948), chamado Jeca Tatu, e corresponde a uma noção de que os chamados caipiras, agricultores que viviam no interior, seriam preguiçosos e não gostariam de trabalhar. O Jeca Tatu, na visão inicial de Lobato, seria o símbolo do camponês letárgico e pouco ativo, que passa os dias acocorado sem buscar soluções para suas difíceis condições de vida. O que a propaganda traz como questão nova é que os agricultores, simbolizados pelo Jeca Tatu, na verdade, estariam acometidos pela referida doença. A personagem, seguindo na esteira dessa leitura, foi utilizada em campanhas relativas à saúde pública, bem como na propaganda de medicamentos.

b) O Jeca Tatu é uma personagem consagrada no livro Urupês, de Monteiro Lobato, publicado em 1918. Retratado como preguiçoso, representaria o homem do campo, especialmente o caipira do interior do estado de São Paulo. Essa imagem do pequeno agricultor surge como uma crítica ferrenha de Lobato a essa categoria social, diferente da dele, que era ligado a grandes proprietários de terra da região de Taubaté, Vale do Paraíba, região pródiga no plantio de café.

c) A figura do Jeca Tatu simbolizava o atraso de nossa sociedade. Porém, a utlização do remédio ilustrava como a ciência, caso empregada corretamente, poderia nos levar à superação de nossos males, gerados pela falta de investimentos nos setores de infraestrutura tais como a moradia e o saneamento básico, e como isso poderia nos levar a um ciclo de progresso social e melhoria da civilização em nosso país. Ao mesmo tempo, poderíamos mostrar como na verdade o povo brasileiro não seria preguiçoso, mas na verdade trabalhador, fato que ajudaria a superar os preconceitos sociais até então vigentes. O fato da propaganda recorrer a uma personagem famosa pode ser entendido também como forma eficiente de divulgação da propaganda, além de gerar identificação com os leitores de Lobato ou com pessoas próximas aos camponeses nos quais o Jeca Tatu era baseado.

Questão 4 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Brasil Democrático Brasil Colônia Escravidão Raça e racismo (Sociologia)

No dia 22 de agosto de 1988, o Governo Federal fundou a primeira instituição pública voltada para promoção e preservação dos valores culturais, históricos, sociais e econômicos decorrentes da influência negra na formação da sociedade brasileira: a Fundação Cultural Palmares (FCP), entidade vinculada ao Ministério da Cidadania. Ao longo dos anos, a FCP tem trabalhado para promover uma política cultural igualitária e inclusiva, que contribua para a valorização da história e das manifestações culturais e artísticas negras brasileiras como patrimônios nacionais.

“Apresentação”. www.palmares.gov.br

A partir da leitura do excerto e de seus conhecimentos sobre o tema:

a) Justifique o nome da instituição.
b) Identifique o contexto em que a instituição foi criada.
c) Cite duas políticas públicas, hoje vigentes no Brasil, que estejam em sintonia com as orientações dessa instituição mencionadas no texto.



Resolução

a) O nome da instituição abordada pelo texto é Fundação Cultural Palmares, assim intitulada em referência ao Quilombo dos Palmares, forte símbolo da resistência da população negra contra a escravidão, ainda no período colonial. Dessa forma, a justificativa do nome recebido pela instituição está na associação entre um símbolo histórico de resistência e a importância da influência negra na formação da sociedade brasileira, de modo que caberia à Fundação Palmares atuar para preservar e promover esses valores que influenciaram diretamente a formação histórica de nosso país.

Quilombo é o nome dado às comunidades que reuniam pessoas de origem africana ou descendentes de africanos nascidos no Brasil, sendo que esses indivíduos estavam fugindo da situação de escravidão. O Quilombo dos Palmares existiu entre o final do século XVI e o ano de 1694, quando foi destruído por tropas comandadas pelo bandeirante Domingos Jorge Velho (1641-1705), que tinha apoio das autoridades da capitania de Pernambuco, onde se localizava o quilombo (atualmente, a região da Serra da Barriga, local de estabelecimento do quilombo, encontra-se no estado de Alagoas). Em cerca de um século de existência, o quilombo reuniu milhares de habitantes e representou uma ameaça tanto aos governos locais quanto ao sistema de exploração agrário calcado na mão de obra escrava. Duas lideranças quilombolas são bastante lembradas: Ganga Zumba e Zumbi, o qual muitas vezes é referido como Zumbi dos Palmares. Liderando o quilombo antes de Zumbi, Ganga Zumba chegou a aceitar um acordo de paz com o governo da capitania, o que demonstra a relevância de Palmares como organização política e sua importância na própria sociedade colonial. Esse acordo de paz gerou uma dissensão entre os habitantes do quilombo, principalmente entre o grupo representando por Zumbi, que assumiu a liderança após a morte de Ganga Zumba, que talvez tenha sido envenenado. A fase de Zumbi como líder de Palmares representa os embates finais com as autoridades da capitania e os bandeirantes contratados para destruir a resistência. No ano seguinte ao da destruição de Palmares, Zumbi foi capturado e morto, sendo que o dia de sua execução, 20 de novembro, passou a também simbolizar mais um elemento na sociedade brasileira atual que celebra a influência de africanos e afro-descendentes na formação do país: o Dia da Consciência Negra.

Outro elemento que pode ser levantado é o fato de comunidades quilombolas ainda serem presentes no Brasil, sendo descendentes de ex-escravizados que originalmente ocuparam o território. Dessa forma, trazer o nome de Palmares para uma fundação destinada à promoção da cultura negra também significa um aceno a essas populações ativas no Brasil contemporâneo. 

b) O contexto de criação da Fundação Cultural Palmares, em agosto de 1988, corresponde ao processo de redemocratização do país após os anos da Ditadura Civil-Militar (1964-1985), que culminou com a promulgação da Constituição de 1988, conhecida como Constituição Cidadã, em outubro de 1988, durante o governo de José Sarney (1985-1990). Durante o processo de redemocratização, uma série de questões sociais foram trazidas à tona com os debates fundacionais de nossa nova democracia. Parte expressiva desses debates se refletiu na própria Constituição, que incluiu direitos sociais e estabeleceu elementos como a criminalização do racismo. Além da Constituição, ou seja, do que se promulga como lei, pensou-se também na formação de instituições que pudessem auxiliar na garantia e na promoção desses direitos sociais, considerados como essenciais para a aquisição de uma plena cidadania. Entre essas instituições, podemos mencionar a própria Fundação Palmares, ligada ao Ministério da Cidadania e que, ao atuar na valorização dos elementos ligados à influência negra como pontos essenciais na construção identitária nacional, atua no combate ao racismo, na defesa do legado deixado pela população africana e afrodescendente e na tentativa de estabelecimento de uma política cultural inclusiva.

c) Entre as políticas públicas hoje vigentes no Brasil que estão em consonância com o proposto pelo texto de apresentação da Fundação Palmares, podem ser citadas: políticas de ação afirmativa, como vagas reservadas para indivíduos afrodescendentes em universidades e no serviço público; leis como a 9.394/96 e a 10.639/03, que obrigam o ensino de cultura e história afro-brasileira em escolas de nível fundamental e médio; o estabelecimento do Estatuto da Igualdade Racial, que visa garantir "à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica." (texto do Art. 1º da lei 12.288/2010); editais públicos que proponham eventos voltados para a divulgação da cultura afro-brasileira; incentivo à compra, via PNLD (Programa Nacional do Livro Didático) e utilização nas escolas de livros didáticos, paradidáticos e literários que abordem a cultura afro-brasileira.

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Brasil República República Velha

À medida que a construção prosseguia, Rondon iniciava a segunda fase do seu projeto: a crucial exploração das terras da bacia amazônica onde hoje está situado o estado de Rondônia, pois a linha telegráfica atravessaria aquelas terras. Essa era a região que incendiava a imaginação de Rondon e seus oficiais, e também a de muitos brasileiros das cidades costeiras. Era o Brasil desconhecido. (...) Na verdade, o projeto do telégrafo parecia dar muito mais satisfação a Rondon pela chance de explorar aquelas terras do que pela construção da linha telegráfica (...) Rondon planejou uma expedição em 1907 para descobrir a nascente do rio Juruena e fazer contato com os indígenas conhecidos como nambikwara.

DIACON, Todd A. Rondon: o marechal da floresta. São Paulo: Companhia das Letras, 2006, p. 32-33

a) Indique qual a importância da expansão da linha telegráfica no Brasil dessa época.
b) Explique o sentido da frase “Era o Brasil desconhecido”.
c) Caracterize a política indigenista desenvolvida por Cândido Rondon para “aquelas terras”.



Resolução

a) A importância da expansão da linha telegráfica se relaciona com a possibilidade de estabelecimento de uma rede de comunicações eficiente em um território tão extenso como o brasileiro. No caso específico da expedição de Cândido Rondon (1865-1958), abordada pelo texto, o projeto consistia em uma linha telegráfica que proporcionasse comunicação entre o Mato Grosso e regiões da bacia amazônica e o Rio de Janeiro, à época capital do Brasil. O telégrafo, aparelho que data de finais do século XVIII, foi utilizado intensamente no século XIX, em países como os Estados Unidos, que estavam passando por um acelerado processo de expansão territorial. No caso brasileiro e da expedição telegráfica de Rondon, a questão não era o de integrar novos territórios que haviam sido anexados ao país, mas sim permitir a comunicação com territórios ainda não explorados, o que significa, de uma certa maneira, garantir a presença do Estado e a possibilidade de comunicação com órgãos oficiais em regiões que ainda não contavam com essa ingerência.

b) A frase pode ser explicada a partir da abordagem que o texto estabelece sobre o sentimento do marechal Cândido Rondon e de pessoas que habitavam regiões mais próximas da costa: um fascínio por regiões do interior ainda não inteiramente exploradas, como trechos da bacia amazônica. Por não inteiramente exploradas pode-se entender localidades que ainda não possuíam presença massiva do Estado, sem vias de transporte e comunicações, habitadas por populações nativas que não necessariamente já haviam tido contato com o "homem branco". Ou seja, essa lógica de Brasil desconhecido - entenda-se desconhecido pelas autoridades oficiais - desperta tanto a curiosidade de exploradores quanto o surgimento de projetos de ocupação, exploração econômica e controle dessas regiões.

c) A política indigenista desenvolvida por Rondon possui como pontos iniciais sua atuação, ainda no final do século XIX, no estabelecimento de uma linha telegráfica entre Goiás e Mato Grosso, por meio da qual conseguiria uma via de comunicação entre a capital e um dos estados de mais difícil acesso à época, que era Mato Grosso. O futuro marechal assume a liderança da construção de linhas telegráficas em 1892, e, por trabalhar em regiões com presença de comunidades indígenas, Rondon precisou criar métodos de atuação que não colocassem seus empreendimentos em rotas de choque com os nativos. O trabalho na linha telegráfica matogrossense encerrou-se em 1906 e, a partir de 1907, Rondon passou a servir ao governo em uma expedição para levar o telégrafo a regiões da bacia amazônica, viagem essa que serviu de motivação para que sua equipe preparasse um estudo sobre a região e partisse, como ressalta o texto, em direção à nascente do Rio Juruena, fazendo contato com os indígenas nambikwara. Na década de 1910, após participar com o ex-presidente estadunidense Theodore Roosevelt de uma viagem pelos rios Paraguai e Amazonas, Rondon continuou o trabalho com o telégrafo, fazendo contato com diversos grupos nativos, mas agora os identificando e com um projeto de integração, o que começa a caracterizar o que podemos chamar de política indigenista. Esse projeto de integração representava uma visão paternalista e unilateral sobre as culturas nativas, apontando para uma cultura única inexistente entre esses povos. Porém, ao longo dos anos, e conforme realizava mais estudos e entrava em contato com diferentes povos, Cândido Rondon foi alterando as diretrizes de sua política indigenista, começando a defender direitos dos nativos, inclusive o de permanecer isolados. Essa fase do pensamento de Rondon ficou bastante expressa em sua atuação diante do Conselho Nacional de Proteção aos Índios, órgão responsável pelo delineamento da política indigenista do país, criado em 1939 e que atuava juntamente com o Serviço de Proteção ao Índio, instituição que também havia tido Rondon como seu presidente. Defendendo a possibilidade de terras demarcadas para os indígenas e uma garantia de proteção contra tentativas de invasão e tomada de seus territórios, Rondon foi também um defensor da criação do Parque Nacional do Xingu, que acabaria sendo a primeira reserva indígena do Brasil, criada no governo de Jânio Quadros, em 1961. A defesa do projeto feita por Rondon data do segundo governo de Getúlio Vargas, que ocorreu entre 1951 e 1954, mas o marechal faleceu em 1958, antes que o Parque Nacional do Xingu tivesse sido criado, com a participação de figuras como os sertanistas irmãos Villas-Bôas e o antropólogo Darcy Ribeiro

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Segundo Reinado Revolta Praieira

No dia 01 de janeiro de 1849 foi divulgado na imprensa pernambucana o “Manifesto ao Mundo”, escrito por Borges da Fonseca, que apresentava as seguintes reivindicações:

Protestamos só largar as armas, quando virmos instalada uma Assembleia Constituinte. Esta Assembleia deve realizar os seguintes princípios: 1. O voto livre e universal do Povo Brasileiro; 2. A plena e absoluta liberdade de comunicar os pensamentos por meio da imprensa; 3. O trabalho como garantia de vida para o cidadão Brasileiro; 4. O comércio a retalho só para os cidadãos brasileiros; 5. A inteira e efetiva independência dos poderes constituídos; 6. A extinção do poder moderador e do direito de agraciar; 7. O elemento federal na nova organização; 8. Completa reforma do poder judicial, em ordem a segurar as garantias dos direitos individuais dos Cidadãos; 9. Extinção da lei do juro convencional; 10. Extinção do atual sistema de recrutamento.

Vamireh Chacon (sel. e intro.). Nunes Machado. Perfis parlamentares. Brasília: Câmara dos Deputados, 1978, p.22.

a) Como ficou conhecido esse movimento na história imperial brasileira?
b) Explique o teor de duas das reivindicações indicadas no Manifesto.
c) Indique dois elementos comuns entre o evento pernambucano e as revoluções europeias de 1848.



Resolução

a) Esse movimento ficou conhecido como Revolta ou Revolução Praieira, e ocorreu em Pernambuco, entre os anos de 1848 e 1850. Tendo um caráter liberal e federalista, contrapôs-se à política imperial da época e inseriu-se na rivalidade entre os dois grandes partidos do império, o Partido Liberal e o Partido Conservador. O nome da revolta se deve à Rua da Praia, sede do jornal Diário Novo, que publicava os manifestos de dissidentes do Partido Liberal, que por sua vez viriam a ser chamados de Partido Praieiro. Os praieiros chegaram ao poder em 1845 e a isso seguiu-se um confronto político feroz com os conservadores, que explodiu em revolta em 1848, em meio a questões sociais sérias, como a carência da população e o desagrado com privilégios concedidos a comerciantes portugueses e ingleses por parte do governo imperial. O conflito terminou com a derrota dos praieiros, mas diversas das reivindicações que circularam durante o movimento foram importantes para o debate político-social brasileiro. Entre as ideias mais marcantes estão as expressas por Borges da Fonseca (1808-1872), autor do texto-base da questão, o "Manifesto ao Mundo".

b) As reivindicações contidas no manifesto escrito por Borges da Fonseca podem ser explicadas levando-se em conta seu caráter liberal e federalista e considerando sua forte contraposição às práticas políticas do governo imperial e do Partido Conservador, que defendia uma maior centralização do poder. Analisando item por item do manifesto, podemos dizer:

1. Ao reivindicar voto livre e universal, pede-se uma expansão da participação eleitoral, algo impossibilitado pelo voto censitário estabelecido pela Constituição de 1824, ou seja, critica-se o cerceamento da participação política baseada na renda do cidadão;

2. Apesar de, durante o Segundo Reinado, a liberdade de imprensa ser mais presente do que o foi durante os anos de instalação do governo imperial, órgãos críticos ao governo imperial ou ao partido que no momento estivesse no poder poderiam sofrer represálias. Assim, o manifesto pede irrestrita liberdade de expressão e imprensa, sem coerção pelos poderes locais ou pelo governo central;

3. A partir de uma sociedade pernambucana na qual havia alto número de desocupados, pede-se por uma garantia de emprego, ou seja, por uma ação do poder público que estabelecesse uma política pública de expansão do trabalho;

4. Nesse item pede-se a nacionalização do comércio, ou seja, o estabelecimento de exclusividade para brasileiros no comércio a retalho (varejo);

5. A separação real entre os poderes também aparece no manifesto, ou seja, reivindica-se uma estrutura de governo na qual os poderes Executivo, Judiciário e Legislativo tenham real autonomia, sem a possibilidade de interferência, como acontece na Constituição imperial, por conta da existência do Poder Moderador;

6. Em consonância com a reivindicação expressa no item 5, o manifesto também pede a extinção do Poder Moderador, que garantia ao imperador um poder a mais além do Executivo e lhe concedia a capacidade de intervir nos demais poderes. Outra crítica feita é a ao direito de agraciar, ou seja, a atribuição que o Poder Moderador dá ao imperador de alterar sentenças já estabelecidas, anulando ou reduzindo penas;

7. Nesse ponto aparece uma defesa do federalismo, apontando para uma maior autonomia local, ao invés de uma centralização do poder no governo imperial, como era o modelo político defendido pelo Partido Conservador;

8. Seguindo o que foi argumentado nos itens 5 e 6, continua-se na crítica à falta de independência dos poderes. Nesse momento, o manifesto pede uma independência para o Poder Judiciário, o que adviria de uma ampla reforma no sistema judicial brasileiro;

9. A lei do juro convencional diz respeito à possibilidade de os juros sobre um contrato serem livremente estabelecidos pelo credor, o que pode incorrer em taxas abusivas para o devedor. Nesse ponto do texto, o autor critica a lei, que permite estabelecer situações de extrema dependência em relação às dívidas na sociedade pernambucana;

10. Esse ponto do manifesto critica o recrutamento dos cidadãos ao Exército, que permite a dispensa caso fosse apresentado um substituto para o serviço militar, o que acabava sendo viável apenas para cidadãos com mais renda, que chegavam a pagar por um substituto. Dessa forma, a população mais pobre acabava sendo, na prática, orbigatoriamente recrutada.

c) Entre os elementos que aproximam a Revolução Praieira dos diversos movimentos que apareceram na Europa por volta do ano de 1848 - caracterizados como a Primavera dos Povos - podem ser apontados: o caráter liberal; a defesa de ideais ligados à liberdade, seja liberdade política, seja liberdade de expressão e manifestação; a contraposição a projetos centralizadores (e muitas vezes monárquicos) de poder; propostas de expansão da participação política dos cidadãos, como a ampliação do direito a voto; influência do pensamento socialista, notadamente do que seria classificado como socialismo utópico; grande preocupação social, ligada a questões como o acesso ao trabalho e a desigualdade entre as classes; reinvidicações de igualdade jurídica; contraposição às elites econômicas e à concentração econômica.