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Fuvest 2020 - 2ª fase - dia 2


Questão 1 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Salazarismo Descolonização

  Os efeitos sociais do futebol enquanto elemento de uma dinâmica cultura popular impelira o estado colonial a intervir sobre  este universo. Depois da abolição [...] do indigenato, o desporto servirá para alimentar a propaganda luso‐tropicalista, nomeadamente depois das vitórias do Benfica de Coluna e Eusébio (este só na segunda) na Taça dos Campeões Europeus em  1961 e 1962, mais tarde, com a participação da seleção no Mundial de 1966. 

Nuno Domingos, “Desporto moderno e situações coloniais: o caso do futebol em Lourenço Marques”. In: MELO, V. A. de e outros (orgs.)  Mais que um jogo: o esporte e o continente africano. Rio de Janeiro: Apicuri, 2010.

a) Explique a relação entre Moçambique e Portugal na década de 1960. 

b) Quais as relações da propaganda luso‐tropicalista portuguesa com a imagem da democracia racial no Brasil? 

c) As conquistas do Benfica e o desempenho da seleção portuguesa no Mundial de 1966 fortaleceram a propaganda oficial do governo português? Justifique.



Resolução

a) Moçambique foi incorporado ao Império Português em 1505, como resultado da expansão ultramarina ocorrida a partir do século 15. Após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), com uma Europa enfraquecida, se iniciaram movimentos liderados pelas antigas colônias para conseguirem suas libertações de suas antigas metrópoles. No caso de Portugal, que vivia o regime do Estado Novo (1926-1974), liderado por Oliveira Salazar (1889-1970), havia uma política sistemática de não aceitação das independências de suas colônias. Pressionado pela ONU e pela nova ordem mundial liderada por EUA e URSS, a estratégia portuguesa foi passar a considerar as colônias como parte integrante do Estado Nacional, chamando-as de Territórios ultramarinos. Em 1961 em Angola, com liderança da Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), começou a guerra colonial contra o Estado Português. Em Moçambique o conflito teve início em 1964, sob a liderança da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), que contava com apoio, dentre outros países, da URSS. A repercussão da guerra colonial no mundo português enfraqueceu o predomínio do Estado Novo, fazendo com que o próprio exército se voltasse contra o governo e o derrubasse em 25/4/1974, com a chamada "Revolução dos Cravos". Assim, esse novo governo declarou o cessar fogo e a independência de Moçambique foi concedida em 1975. Logo a seguir, explodiu uma guerra civil entre a Frelimo e guerrilhas rivais, especialmente a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), que se estendeu até 1992.

b) O luso-tropicalismo foi um conceito utilizado pelo Estado Novo português principalmente a partir da década de 1950 para justificar a manutenção de seu Império Colonial. Esse ideal foi baseado nos trabalhos do antropólogo brasileiro Gilberto Freyre (1900-1997), especialmente no que tangia a ideia de que os portugueses teriam como algo inato o destino de levar a civilização a outros povos, uma vez que eles já haviam sido o produto de miscigenações anteriores, que remontavam a Guerra de Reconquista (711-1492) no período medieval. Assim, o povo português se adaptaria facilmente aos chamados trópicos e seriam os colonizadores ideais, uma vez que seriam pacíficos e tolerantes. De uma forma semelhante, as elites brasileiras também assimilaram as teorias de Freyre, tentando acomodar as questões raciais no Brasil. Segundo essa visão, a colonização portuguesa no Brasil teria criado uma "democracia racial" pois os portugueses logo se misturaram com os indígenas e escravos, formando um povo mesclado. Tais teorias serviram para encobrir os efeitos sociais e humanos de 350 anos de escravidão no Brasil, criando uma falsa ideia de que devido as características específicas de nossa colonização portuguesa, não haveria racismo no Brasil.

c) Tanto os títulos conquistados pelo Benfica no início da década de 1960, quanto o melhor desempenho da seleção portuguesa de futebol em uma Copa do Mundo (terceira colocação na Inglaterra em 1966) acabaram por reforçar a política oficial do governo sobre um povo com diversas origens raciais mas unificado pela bandeira portuguesa, uma vez que tanto o time do Benfica, quanto a seleção portuguesa, tinham em jogadores africanos, tais como Eusébio (artilheiro da Copa de 1966) e Coluna, que eram moçambicanos, os seus maiores astros. 

Questão 2 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Sociedade colonial Foucault Antigo Regime

O suplício tem então uma função jurídico‐política. É um cerimonial para reconstituir a soberania lesada por um instante [...]. A execução pública, por rápida e cotidiana que seja, se insere em toda a série dos grandes rituais do poder eclipsado e restaurado (coroação, entrada do rei numa cidade conquistada, submissão dos súditos revoltados). [...] O suplício não restabelecia a justiça; reativava o poder. No século XVII, e ainda no começo do XVIII, ele não era, com  todo o seu teatro de terror, o resíduo ainda não extinto de uma outra época. Suas crueldades, sua ostentação, a violência  corporal, o jogo desmesurado de forcas, o cerimonial cuidadoso, enfim, todo o seu aparato se engrenava no funcionamento  político da penalidade. [...]  Mas nessa cena de terror o papel do povo é ambíguo. Ele é chamado como espectador: é convocado para assistir às  exposições, às confissões públicas; os pelourinhos, as forcas e os cadafalsos são erguidos nas praças públicas ou à beira dos  caminhos; os cadáveres dos supliciados muitas vezes são colocados bem em evidência perto do local de seus crimes. As pessoas  não só têm que saber, mas também ver com seus próprios olhos. Porque é necessário que tenham medo; mas também porque  devem ser testemunhas e garantias da punição, e porque até certo ponto devem tomar parte nela. 

Michel Foucault, Vigiar e Punir. Petrópolis: Vozes, 1983.

a) Identifique uma das práticas punitivas descritas no texto empregadas na sociedade colonial brasileira. 

b) Explique as relações entre a exibição do poder monárquico e as punições judiciais na sociedade do Antigo Regime europeu. 

c) A participação do povo nas execuções conferia a elas um caráter democrático? Justifique.



Resolução

a) O candidato deveria escolher uma prática punitiva dentre as seguintes:

-Pelourinho: uma coluna colocada em local público onde são expostos e punidos os criminosos.

-Forcas: intrumento utilizado para o enforcamento de indivíduos condenados a pena de morte.

-Cadafalso: Patíbulo ou palanque utilizado para execução pública, especialmente por enforcamento ou decapitação.

b) As punições judiciais ocorridas na época do Antigo Regime (séculos 15 a 18), especialmente o enforcamento, pelo fato de serem executadas em locais públicos tinham por objetivo reforçar o poder do Estado e do rei, uma vez que devido ao sofrimento e crueldade desses rituais, seria reforçado o medo ao povo para que não se revoltassem contra esses poderes constituídos. Além disso, o texto destaca que o povo, ao testemunhar essas execuções, torna-se também integrante dessas cerimônias. 

c) De acordo com a leitura do texto, podemos afirmar que a principal função da presença popular em tais cerimônias era o reforço do poder real pelo medo que tais punições gerariam na comunidade, evitando que rebeliões pudessem acontecer. Dessa forma, a presença do povo não sugere um caráter democrático, tendo em vista que essa presença não possuía nenhum tipo de ação efetiva ou de posição deliberativa nessa cerimônia, apenas reforçava a espetacularização do exercício de poder do Monarca. 

Questão 3 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Modernismo (FSH) Mário de Andrade República Oligárquica

Leia o poema e responda ao que se pede.   

Mas a taba cresceu... Tigueras* agressivas, 

Para trás! Agora o asfalto anda em Tabatinguera. 

Mal se esgueira um pajé entre locomotivas 

E o forde assusta os manes** lentos do Anhanguera. 

[...] 

Segue pra forca da Tabatinguera. Lento 

O cortejo acompanha a rubra cadeirinha 

Pro Ipiranga. Será que em tão pequeno assento 

A marquesa botou sua imperial bundinha!... 

Mário de Andrade, “Tabatinguera”, Losango Cáqui (1924). In: Poesias completas v.1. São Paulo: Martins Fontes, 1979. 

* área plantada onde já se fez a colheita. 

** alma dos mortos, restos mortais.

a) Identifique um aspecto mencionado no poema que justifique a expressão “a taba cresceu”. 

b) Destaque um argumento histórico e outro de caráter estético para o emprego de expressões indígenas no poema. 

c) Explique as condições históricas que favoreceram a citação do “asfalto”, das “locomotivas” e do “forde”.



Resolução

a) A "taba cresceu" (do tupi, "aldeia") aparece no texto de Mário de Andrade como uma menção ao forte crescimento e modernização de São Paulo no contexto dos anos de 1920. É possível identificar esse crescimento com outros trechos do texto, como o "Mal se esgueira um pajé entre as locomotivas", relacionando-o ao acelerado ritmo das ferrovias de São Paulo, bem como à grande quantidade de usuários desses então modernos meios de transporte. Outra relação possível é o trecho "Tigueras agressivas, para trás! Agora o asfalto anda em Tabatinguera", apresentando a superação de uma vida rural, de produção agrícola em detrimento do desenvolvimento da cidade e das vias asfaltadas. 

b) Do ponto de vista histórico, o uso de expressões indígenas está associada tanto a um caráter nacionalista do contexto, interessado em discutir a identidade e a cultura tipicamente brasileiras, como também dialoga com as teorias raciais e eugenistas difundidas nos meios científicos e intelectuais do período. Sobre o primeiro aspecto, os anos de 1920 foram influenciados pela tese da formação do Brasil através da miscigenação, elemento considerado fundamental para a identidade cultural brasileira. Por sua vez, esse raciocínio endossa as teorias raciais da ciência na época, que previam a existência de raças humanas claramente definidas e com características próprias, sendo a miscigenação e a presença do indígena uma característica singular da cultura nacional.

Do ponto de vista estético, o movimento dos modernistas tinha como projeto uma reconstrução da arte brasileira, realizando a assimilação crítica das artes vanguardistas europeias em diálogo com elementos da cultura nacional. Para tal, o índio e o negro eram tidos elementos primordiais da cultura brasileira, sendo que o uso de sua cultura e língua representava um elemento estético da identificação do caráter nacional. Portanto, o índio e sua cultura figuraram frequentemente nas obras modernistas pela busca de um teor primitivista, a exemplo do texto em questão e do sentido geral da Antropofagia presente no “Manifesto Antropofágico”.

c) As condições históricas que dialogam com a citação do "asfalto", "locomotiva" e do "forde" são aquelas vinculadas ao intenso processo de urbanização, modernização e crescimento da cidade de São Paulo durante as primeiras décadas do século XX. Este contexto foi marcado pelo desenvolvimento urbano da capital paulista, que despontava como um das mais importantes cidades do país, recebendo grandes levas de imigrantes e sendo o centro econômico da cafeicultura brasileira. Tal desenvolvimento não passou incólume pelos artistas e intelectuais daquele contexto, animados com o que identificavam como a modernização do Brasil. Assim, inovações tecnológicas como os meios de transporte cada vez mais velozes, a maquinaria cada vez mais robusta e surpreendente e mesmo o desenvolvimento urbano e sua pioneira verticalização eram retratados e elogiados por intelectuais deste período. Nesse sentido, o elogio à modernização e sua associação com o desenvolvimento urbano de São Paulo aparecem como elementos de um Brasil que se transformava, mas que também mantinha uma relação com seu passado primordial, representado pelo elemento indígena no país.

Questão 4 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Processo de Independência do Brasil
A semente da integração nacional seria, pois, lançada pela nova Corte como um prolongamento da administração e da estrutura colonial, um ato de vontade de portugueses adventícios, cimentada pela dependência e colaboração dos nativos e forjada pela pressão dos ingleses que queriam desfrutar do comércio sem ter de administrar. A insegurança social cimentaria a união das classes dominantes nativas com a “vontade de ser brasileiros” dos portugueses imigrados que vieram fundar um novo Império nos trópicos. A luta entre as facções locais levaria fatalmente à procura de um apoio mais sólido no poder central. Os conflitos inerentes à sociedade não se identificam com a ruptura política com a Mãe Pátria, e continuam como antes, relegados para a posteridade.
Maria Odila Leite da Silva Dias, A interiorização da metrópole e outros estudos. São Paulo: Alameda, 2005.
 
a) Caracterize o período histórico de que trata o texto.
b) Descreva os projetos dos principais grupos políticos do período.
c) Explique a frase: “Os conflitos inerentes à sociedade não se identificam com a ruptura política com a Mãe Pátria, e continuam como antes, relegados para a posteridade”.


Resolução

a) O período histórico abordado no texto é o Período Joanino (1808-1821) e o processo de independência do Brasil (1821-1822). Esse período abrange os anos finais do Brasil colônia e foi iniciado em 1808 com a transferência da corte portuguesa para o Brasil, motivada pela expansão napoleônica na Europa. A sede da corte de D. João VI foi instalada no Rio de Janeiro e inaugurou um período de profundas transformações no Brasil, com destaque para o decreto de Abertura dos portos às Nações amigas em 1808, que representou a ruptura da exclusividade comercial com Portugal (ocupado pelos franceses nesse contexto). Outros feitos do período joanino foram: criação do Jardim Botânico, criação da Imprensa Régia, criação da Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro, criação da Escola Superior de Matemática, Escola Médico-cirúrgica, Escola de Comércio e Administração e, em 1815, a elevação do Brasil à categoria de Reino Unido de Portugal e Algarves. Nesse período, as relações com a Inglaterra foram marcadas pela assinatura dos Tratados de 1810, também conhecidos como Tratados de Aliança e Amizade de Comércio e Navegação. Esses tratados previam benefícios diversos para os ingleses no Brasil, dentre eles, garantindo taxação privilegiada para os produtos britânicos, de modo que incidiam em 15% de impostos para produtos ingleses, 16% para produtos portugueses e 24% para os demais países. Por fim, a Revolução Liberal do Porto, ocorrida em Portugal em 1820, exigia o retorno do rei ao reino e a volta do Brasil à condição de colônia portuguesa, ou seja, o fim da autonomia conquistada durante a permanência da corte. Após o retorno de D. João VI, conforme solicitado pelos revolucionários, D. Pedro permaneceu no Brasil e, diante da exigência das cortes portuguesas de seu retorno imediato, consolidou a Independência do Brasil. Desse modo, foi fundado um novo pacto social e político, criando um Estado independente com o direito de cidadania estendido aos proprietários. 

b) No contexto da Independência do Brasil, os dois principais grupos políticos do período eram conhecidos como Partido português e o Partido brasileiro. O primeiro agrupamento era marcado pela contrariedade à separação política do Brasil com Portugal, além de terem expectativas na manutenção de seus privilégios devido à proximidade da figura de Dom Pedro I, que, além de tudo continuava herdeiro direto da coroa portuguesa. Seus membros eram majoritariamente comerciantes portugueses no Brasil e parte dos militares. Por sua vez, o Partido brasileiro era fundamentalmente favorável à ruptura do Brasil para com sua metrópole, especialmente após as posturas tomadas nas Cortes de Lisboa no que se refere à relação de privilégios comerciais imposta entre Portugal e Brasil. Mesmo com as divergências internas (entre "conservadores" e "liberais"), o partido reunia profissionais liberais e membros da aristocracia brasileira, e foram responsáveis por articulação de eventos como o abaixo-assinado solicitando a permânencia de Dom Pedro I no Brasil e a organização de um novo Estado na antiga área colonial portuguesa.

c) Considerando a argumentação da autora no trecho mencionado, é possível interpretar a frase “Os conflitos inerentes à sociedade não se identificam com a ruptura política com a Mãe Pátria, e continuam como antes, relegados para a posteridade” com uma alusão à união oportuna de entre "as classes dominantes nativas" com a “vontade de ser brasileiros dos portugueses imigrados". Nesse sentido, a autora defende que existiu uma elite luso-brasileira em fins do século XVIII que atuava em favor da criação de um "novo império nos trópicos". As divergência entre esses grupos foram relegadas para a posterioridade, pois foram suprimidas no contexto anterior à independência, reaparecendo posteriormente no Império. As divergências entre os diversos segmentos sociais retornaram no momento em que os princípios gerais, partilhados por todos, começaram a tomar feições mais objetivas de leis. Já no Primeiro Reinado (1822-1831), intensificaram-se às disputas entre o Partido Brasileiro e o Partido Português, enquanto na Regência (1831-1840) os projetos dos liberais moderados, liberais exaltados e restauradores estavam em disputa e, por fim, no Segundo Reinado (1840-1889) opõe-se a proposta do Partido Liberal a do Partido Conservador. 

Outra intepretação possível para a frase é considerar que os conflitos inerentes à sociedade que se mantiveram mesmo com a ruptura política relacionam-se com a permanência de características socioeconômicas da Colônia, como a escravidão. Nesse aspecto, considerando a tensão social e racial inerente à uma sociedade escravista, podemos afirmar que estes podem ser mencionados como parte dos "conflitos inerentes à sociedade" que foram "relegados para a posterioridade", mesmo diante da "ruptura política com a Mãe Pátria

 

Questão 5 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

América Espanhola Administração da América Espanhola

Observe a imagem e leia o texto.

Felipe  Guamán  Poma  de  Ayala,  o  autor  da  imagem,  foi  um  cronista  ameríndio de ascendência incaica que viveu no Peru entre 1534 e 1615. A  imagem faz parte de sua Nueva Corónica y Buen Gobierno, finalizada no  começo do século XVII e endereçada ao rei Felipe III, sendo acompanhada  da seguinte legenda, traduzida do espanhol:  “Pobre dos índios, de seis animais que comem e a que temem os pobres  dos índios deste reino: serpente, corregedor; tigre, espanhóis das cidades;  leão, encomendero; cadela, padre da doutrina; gato, escrivão; rato, cacique  principal. Estes ditos animais que não temem a Deus esfolam aos pobres  índios deste reino, e não há remédio, pobre Jesus Cristo”.

a) Identifique a situação do Peru quando da elaboração da obra. 

b) Descreva as estruturas de poder político e econômico que são comentadas na imagem e no texto que a acompanha. 

c) Analise as tensões no mundo indígena sugeridas por texto e imagem.



Resolução

a) No contexto de elaboração da obra, o Peru era uma área colonial da Espanha, denominada administrativamente como Vice-Reinado do Peru, a partir de 1542, com a capital em Lima. Diferentemente de outras regiões, o Peru era densamente povoada por povos ameríndios na época da chegada dos espanhóis. Desde o início da conquista da civilização Inca por Francisco Pizarro nas primeiras décadas do século XVI, a região passou ainda por um período de instabilidade e contestação dos nativos perante a dominação espanhola, como a resistência liderada por Manco Capac II e, posteriormente, seu herdeiro Tupac Amaru. Ao final do século XVI a administração espanhola se estabilizou, especialmente através de acordo com determinadas lideranças indígenas que atendiam em partes o interesse dos espanhóis, como a cobrança de impostos. Economicamente, a descoberta da Mina de Potosí em meados do século XVI também transformou a economia do vice-reinado, sendo a extração da prata a principal atividade econômica regional. Dentro da lógica mercantilista do período, o Peru era uma região de fundamental importância no Império Espanhol pela riqueza extraída de seus minerais, especialmente a prata.

b) As estruturas de poder político mencionadas na imagem e no texto que acompanham são:

I) Corregedor: Funcionários da administração colonial espanhola com autoridade política e judiciária. Constituíam uma sistematização da presença do Estado nas atividades coloniais americanas. Entre suas competências, destaca-se a obrigação de visitação das áreas de sua jurisdição, fiscalizando as atividades coloniais, estabelecendo relações entre indígenas e encomenderos, e mesmo zelando pela proteção aos nativos. Contudo, as acusações de corrupção e abusos eram frequentes aos designados por este cargo.

II) Encomendero: a encomienda era um sistema existente na América Espanhola e que era caracterizado pela relação entre um encomendero - normalmente um espanhol com terras na América - e um determinado grupo de indígenas. Nesta relação, os encomenderos tinham o direito de coletar impostos destes indígenas - normalmente através do trabalho forçado, já que tais nativos não apresentavam meios de pagar o tributo em espécie - e, em troca, deveriam garantir a cristianização desses nativos. Contudo, o sistema foi severamente criticado principalmente por religiosos do período, que denunciavam os abusos cometidos pelos encomenderos e a falta de observância sobre a proteção e cristianização dos indígenas.

III) Padres e Religiosos: Responsáveis pela cristianização dos indígenas, os religiosos detinham grande influência nas áreas de colonização ibérica na América. Muitas vezes eram associados aos encomederos para executar a devida conversão religiosa dos ameríndios. Contudo, alguns religiosos também se destacaram na denúncia das mazelas as quais os nativos estavam submetidos em sistemas como a encomienda, a exemplo do Frei Bartolomé de Las Casas.

IV) Lideranças Indígenas: As lideranças nativas - também eventualmente chamada de curacas - desempenhavam um importante papel de vínculo entre os novos dominadores espanhóis e as comunidades ameríndias do interior do Vice-Reinado do Peru. Após a definitiva conquista sobre os Incas, os Espanhóis adaptaram e ressignificaram parte da lógica existente entre os Incas e as áreas submetidas a seu domínio, tal qual o sistema de mita. Neste sentido, as lideranças indígenas ligadas à metrópole espanhola eram de fundamental importância para o bom funcionamento da colônia Americana, representando interesses dos espanhóis perante a outros indígenas.

V) Burocracia Administrativa e demais espanhois: mencionada indiretamente através da menção aos escrivães, a burocracia espanhola detinha uma importância político-administrativo nas áreas sob domínio espanhol, estabelecendo uma comunicação entre a Metrópole e as áreas coloniais na América. Tanto tais escrivães como os “espanhóis da cidade” são acusados de conivência com a situação de exploração aplicada às populações nativo-americanas.

c) As tensões sugeridas pelas imagem e pelo texto ocorrem de forma diversa, especialmente na relação entre o mundo ameríndio com os espanhóis, mas também nas relações internas aos ameríndios. No primeiro caso, podemos mencionar a ausência de uma fiscalização eficaz na proteção da população nativa que, apesar do dever dos corregedores em fiscalizar as relações de indígenas e colonos, não apresentavam eficácia contra esses abusos. Outra tensão mencionada é a atuação direta dos encomenderos na exigência excessiva de trabalhos forçados, responsáveis pela morte de grande parcela da população ameríndia. Essas casos eram inclusive denunciados por religiosos e outros funcionários locais, como o próprio Guáman Poma de Ayala ou o Frei Bartolomé de Las Casas. Um terceiro ponto de tensão é a imposição religiosa dos espanhóis, através de uma postura eurocêntrica e unilateral de defesa da fé cristã, num projeto de conversão forçada da população local. Também é possível mencionar uma conivência generalizada por parte dos espanhóis e de sua burocracia perante as sevícias vivenciadas pelos nativos do Peru. Como resultado, essas circunstâncias causaram uma forte queda demográfica da população ameríndia, para além dos esforços de imposição cultural realizada pelos espanhóis contra os locais.

Por fim, a menção às lideranças indígenas também revela uma tensão existente internamente aos ameríndios, com a crítica feita diretamente contra as lideranças associadas aos espanhóis. Essas lideranças também foram responsabilizados por Guáman Poma de Ayala pelo estado de violência no qual os indígenas viviam, sendo associados a “ratos” na imagem, justamente por apresentarem uma postura desonrosa perante sua população e voltada exclusivamente para o atendimento de seus interesses naquele contexto.

Questão 6 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

Oriente Médio no Século XX (História) Geografia

Em 29 de outubro de 1956, uma grave crise política descambou em uma intervenção militar na região do Canal de Suez e da  Península do Sinai (Egito).   

a) Indique a importância dessa região nos quadros da política internacional do período. 

b) Mencione as potências envolvidas diretamente nesse conflito e os seus respectivos interesses. 

c) Explique as tensões associadas à articulação política entre os diversos Estados árabes nesse período.



Resolução

a) O Canal de Suez, inaugurado em 1869, une o Mediterrâneo ao Mar Vermelho, sendo dessa forma uma importante via de transporte para o petróleo do Oriente Médio. A nacionalização do canal por  Nasser, presidente nacionalista do Egito (1954-1970), contrariava os interesses das velhas potências imperialistas como o Reino Unido (que até então o controlava) e França, além de Israel, pois como o Egito era contra a formação daquele país, o fechamento do canal para eles representaria seu isolamento. Ao mesmo tempo, tal questão se inseria no contexto da Guerra Fria (1947-1991), uma vez que essa querela deveria se acomodar aos interesses de EUA e URSS.

b) As potências diretamente envolvidas nessa questão foram o Reino Unido, a França e Israel, que desejavam impedir que o Egito, liderado por Nasser e que tinha apoio indireto da URSS, nacionalizasse o canal de Suez.

c) O período é marcado pelo nacionalismo árabe ou pan-arabismo, num contexto de descolonização. Surgem algumas novas repúblicas, tais como o Egito, que busca protagonismo, especialmente na Conferência de Bandung (1955). Contudo, disputas internas enfraqueceram o projeto pan-arabista, cujo um dos principais elementos aglutinadores era a oposição à formação do Estado de Israel (1948), fato que gerou grande tensão regional. Ao mesmo tempo, o período é marcado pela decadência das antigas potências imperialistas (Inglaterra e França) e pela imposição dos interesses das novas potências (EUA e URSS), especialmente em relação à questão do petróleo. Podemos dizer inclusive que os interesses dessas potências da Guerra Fria foram agravaram as tensões regionais mencionadas anteriormente, enfraquecendo assim a proposta pan-arabista e fomentando antagonismos regionais.