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Questão 4 Fuvest 2020 - 2ª fase - dia 2

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Questão 4

Processo de Independência do Brasil
A semente da integração nacional seria, pois, lançada pela nova Corte como um prolongamento da administração e da estrutura colonial, um ato de vontade de portugueses adventícios, cimentada pela dependência e colaboração dos nativos e forjada pela pressão dos ingleses que queriam desfrutar do comércio sem ter de administrar. A insegurança social cimentaria a união das classes dominantes nativas com a “vontade de ser brasileiros” dos portugueses imigrados que vieram fundar um novo Império nos trópicos. A luta entre as facções locais levaria fatalmente à procura de um apoio mais sólido no poder central. Os conflitos inerentes à sociedade não se identificam com a ruptura política com a Mãe Pátria, e continuam como antes, relegados para a posteridade.
Maria Odila Leite da Silva Dias, A interiorização da metrópole e outros estudos. São Paulo: Alameda, 2005.
 
a) Caracterize o período histórico de que trata o texto.
b) Descreva os projetos dos principais grupos políticos do período.
c) Explique a frase: “Os conflitos inerentes à sociedade não se identificam com a ruptura política com a Mãe Pátria, e continuam como antes, relegados para a posteridade”.


Resolução

a) O período histórico abordado no texto é o Período Joanino (1808-1821) e o processo de independência do Brasil (1821-1822). Esse período abrange os anos finais do Brasil colônia e foi iniciado em 1808 com a transferência da corte portuguesa para o Brasil, motivada pela expansão napoleônica na Europa. A sede da corte de D. João VI foi instalada no Rio de Janeiro e inaugurou um período de profundas transformações no Brasil, com destaque para o decreto de Abertura dos portos às Nações amigas em 1808, que representou a ruptura da exclusividade comercial com Portugal (ocupado pelos franceses nesse contexto). Outros feitos do período joanino foram: criação do Jardim Botânico, criação da Imprensa Régia, criação da Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro, criação da Escola Superior de Matemática, Escola Médico-cirúrgica, Escola de Comércio e Administração e, em 1815, a elevação do Brasil à categoria de Reino Unido de Portugal e Algarves. Nesse período, as relações com a Inglaterra foram marcadas pela assinatura dos Tratados de 1810, também conhecidos como Tratados de Aliança e Amizade de Comércio e Navegação. Esses tratados previam benefícios diversos para os ingleses no Brasil, dentre eles, garantindo taxação privilegiada para os produtos britânicos, de modo que incidiam em 15% de impostos para produtos ingleses, 16% para produtos portugueses e 24% para os demais países. Por fim, a Revolução Liberal do Porto, ocorrida em Portugal em 1820, exigia o retorno do rei ao reino e a volta do Brasil à condição de colônia portuguesa, ou seja, o fim da autonomia conquistada durante a permanência da corte. Após o retorno de D. João VI, conforme solicitado pelos revolucionários, D. Pedro permaneceu no Brasil e, diante da exigência das cortes portuguesas de seu retorno imediato, consolidou a Independência do Brasil. Desse modo, foi fundado um novo pacto social e político, criando um Estado independente com o direito de cidadania estendido aos proprietários. 

b) No contexto da Independência do Brasil, os dois principais grupos políticos do período eram conhecidos como Partido português e o Partido brasileiro. O primeiro agrupamento era marcado pela contrariedade à separação política do Brasil com Portugal, além de terem expectativas na manutenção de seus privilégios devido à proximidade da figura de Dom Pedro I, que, além de tudo continuava herdeiro direto da coroa portuguesa. Seus membros eram majoritariamente comerciantes portugueses no Brasil e parte dos militares. Por sua vez, o Partido brasileiro era fundamentalmente favorável à ruptura do Brasil para com sua metrópole, especialmente após as posturas tomadas nas Cortes de Lisboa no que se refere à relação de privilégios comerciais imposta entre Portugal e Brasil. Mesmo com as divergências internas (entre "conservadores" e "liberais"), o partido reunia profissionais liberais e membros da aristocracia brasileira, e foram responsáveis por articulação de eventos como o abaixo-assinado solicitando a permânencia de Dom Pedro I no Brasil e a organização de um novo Estado na antiga área colonial portuguesa.

c) Considerando a argumentação da autora no trecho mencionado, é possível interpretar a frase “Os conflitos inerentes à sociedade não se identificam com a ruptura política com a Mãe Pátria, e continuam como antes, relegados para a posteridade” com uma alusão à união oportuna de entre "as classes dominantes nativas" com a “vontade de ser brasileiros dos portugueses imigrados". Nesse sentido, a autora defende que existiu uma elite luso-brasileira em fins do século XVIII que atuava em favor da criação de um "novo império nos trópicos". As divergência entre esses grupos foram relegadas para a posterioridade, pois foram suprimidas no contexto anterior à independência, reaparecendo posteriormente no Império. As divergências entre os diversos segmentos sociais retornaram no momento em que os princípios gerais, partilhados por todos, começaram a tomar feições mais objetivas de leis. Já no Primeiro Reinado (1822-1831), intensificaram-se às disputas entre o Partido Brasileiro e o Partido Português, enquanto na Regência (1831-1840) os projetos dos liberais moderados, liberais exaltados e restauradores estavam em disputa e, por fim, no Segundo Reinado (1840-1889) opõe-se a proposta do Partido Liberal a do Partido Conservador. 

Outra intepretação possível para a frase é considerar que os conflitos inerentes à sociedade que se mantiveram mesmo com a ruptura política relacionam-se com a permanência de características socioeconômicas da Colônia, como a escravidão. Nesse aspecto, considerando a tensão social e racial inerente à uma sociedade escravista, podemos afirmar que estes podem ser mencionados como parte dos "conflitos inerentes à sociedade" que foram "relegados para a posterioridade", mesmo diante da "ruptura política com a Mãe Pátria