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Unicamp 2021 - 2ª fase - dia 2


Questão 1 Visualizar questão Compartilhe essa resolução

História da Arte Invasões Holandesas

(Jan Davidsz de Heem. Natureza Morta com Papagaios. The Ringling Museum, fim da década de 1640.)

 

As imagens produzidas por artistas europeus, tal como vemos na pintura do holandês Jan Davidsz de Heem, tiveram um papel importante na construção do conceito de exótico no imaginário da Europa na época moderna.

Naquele contexto, a pintura apresentava itens obtidos quando se exploravam e se colonizavam países em cantos distantes do mundo. A natureza (os elementos que a representam) é, assim, quase um estudo científico e, novamente, uma alusão à abundância obtida graças ao vitorioso comércio holandês.

 

(Adaptado de Rolf Winkes. Natura Morta. Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo, 10: 145-161, 2000. p. 149.)

 

Os colonizadores exerceram diversas operações que levaram à configuração de um novo universo de relações intersubjetivas de dominação entre a Europa e as demais regiões e populações do mundo, às quais estavam sendo atribuídas, no mesmo processo, novas identidades geoculturais.

 

(Adaptado e traduzido de Anibal Quijano. Colonialismo, eurocentrismo y América Latina. In Colonialidad del saber: eurocentrismos e ciencias sociales. Buenos Aires, CLACSO. 2005, p. 209.)

 

a) O exótico é estabelecido a partir de uma relação assimétrica entre universos diferentes. Justifique porque a imagem ao lado apresentaria características “exóticas” e relacione essa adjetivação ao pensamento colonial da época.

b) Apresente uma semelhança e uma diferença entre a experiência colonial holandesa e a portuguesa.

 

 

 



Resolução

a) Um amplo conjunto de representações literárias e iconográficas sobre o Novo Mundo foi produzida desde a chegada dos portugueses na América, ainda no século XVI. No entanto, a partir do século XVII, a pintura dos artistas holandeses inaugurou novos parâmetros de visualidade, já que propõem uma observação mais naturalista do mundo, de acordo com os preceitos da escola flamenga. Neste sentido, a iconografia produzida reforçava a ideia da América enquanto "exótico",  dentro de uma leitura eurocêntrica e que, entre outros aspectos, segundo Rolf Winkes, aludia à abundância do vistoso comércio e do projeto colonial holandês. Nesse sentido, a obra "Natureza Morta com Papagaios" busca ressaltar tal fartura natural, construindo um cenário marcado pela diversidade de frutas e plantas, presença de animais como o papagaio e a lagosta, exposição de vistosos objetos de metais que aludem à exploração destes na América, bem como as conchas em formatos de cornucópias - símbolo de abundância na Antiguidade Clássica. Em suma, o pintor reforça nesta obra não só o lugar do diferente, que aparece no exotismo da composição, mas também representa a posição holandesa enquanto exploradora dessas riquezas tropicais.

b) Podemos citar como diferença entre a experiência colonial holandesa e portuguesa a perspectiva religiosa, já que o Brasil Holandês foi caracterizado por um ambiente inédito de tolerância com outras crenças, em especial com os judeus. Considerando a experiência portuguesa de colonização, podemos afirmar que os judeus jamais tinham alcançado tamanha liberdade religiosa no Brasil Colônia. Essa postura de tolerância tinha relação com o fato de os judeus serem muito ativos comercialmente, de modo que se tornaram importantes intermediários dos negócios coloniais. Por outro lado, na experiência colonial portuguesa, destaca-se as visitas esporádicas do Tribunal do Santo Ofício da Inquisição ao longo do século XVI, nos quais os casos de heresia judaizante representavam a maioria da denúncias investigadas. 
Outra diferença que pode ser mencionada entre esses projetos colonizadores refere-se ao estímulo às artes e ao desenvolvimento das ciências naturais, bastante marcante na administração nassalino e ausente das prioridades portuguesas dos séculos XVI e XVII. Vale destacar que Maurício de Nassau trouxe artistas e cientistas para Recife, como Frans Post e Albert Eckhout. Esses artistas foram convidados pelo administrador para retratar o Nordeste brasileiro, predominando as representações paisagísticas de Post e os registros humanos, da fauna e da flora por Eckhout. 
Em relação às semelhanças entre a experiência colonial holandesa e portuguesa, podemos citar a ênfase na produção açúcareira. Assim como os portugueses, os colonizadores holandeses investiram significativamente na produção de açúcar, realizando leilões de engenhos abandonados (visando sua reativação) e concedendo créditos para os senhores de engenho. Uma segunda semelhança que poderia ser abordada era o uso do trabalho escravo africano. Tanto Portugal como Holanda recorreram ao tráfico negreiro para abastecer a produção de açúcar no Nordeste, sendo que os holandeses chegam mesmo a invadir Angola em 1641, tomando de Portugal um importante porto de exportação de escravos naquele período.

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Benim Período Joanino

Em 10 de outubro de 1810, Adandozan (1797-1818), rei do Daomé, no atual Benim, enviou uma carta para o Brasil endereçada a Dom João, príncipe regente, acompanhada de uma lista de presentes contendo objetos de prestígio cujo uso era privilégio real. Uma parte dos artefatos descritos na carta integrava o acervo do Museu Nacional, que foi destruído em um grande incêndio no ano de 2018. Entre os objetos que Adandozan usou para presentear Dom João, destacavam-se o trono do rei daomeano (imagem ao lado), cetros, bengalas, bolsa, sandália e abanos.

(Adaptado de SOARES, Mariza de Carvalho. Trocando galanterias: a diplomacia do comércio de escravos, Brasil-Daomé, 1810-1812.Afro-Ásia,Salvador,n. 49,p. 229-271.)

Com base no excerto e na imagem:

a) cite e explique uma das funções assumidas pelos objetos no âmbito da diplomacia estabelecida entre Brasil e África no começo do século XIX;

b) descreva o impacto da destruição destes objetos no incêndio do Museu Nacional para o Brasil e para o Benim.

 



Resolução

a) Os presentes e as cartas enviadas pelo rei Adandozan buscavam reafirmar a aliança entre o Reino de Daomé e o Reino de Portugal, amizade estabelecida desde o século XVIII e reafirmada ao longo de anos de parceria dinástica e comercial. No caso dos objetos retratados na imagem, eles são símbolos máximos da autoridade monárquica de Daomé, como o trono, o cetro e as sandálias, todos de uso exclusivo do próprio Rei. Ao optar pelo envio de símbolos máximos do poder monárquico em Daomé para Dom João VI, buscava-se consolidar e celebrar a amizade e proximidade entre dois reinos considerados irmãos, unidos tanto pela histórica compartilhada, pela fé Cristã, pelos laços dinásticos de amizade e comércio entre os reinos.

b) Tais objetos consistem em símbolos máximos da relação histórica, política e diplomática entre Portugal, Brasil e o reino de Daomé nos séculos XVIII e XIX. Sua exposição revelava tanto elementos próprios da cultura material de Daomé (como sua indumentária, a materialização de seus símbolos de poder, suas tradições, etc), como também desnudavam elementos da diplomacia existente entre Portugal e Reinos Africanos no período. Neste ponto, tal exposição propiciava um questionamento ao senso comum histórico brasileiro acerca dos Reinos Africanos, frequentemente reduzidas a "tribos bárbaras" desestruturadas, sem agência própria e a povos facilmente dominados pelos Europeus. Em outras palavras, a exposição de tais peças compartilhadas entre Portugal e Daomé favorecia uma nova leitura sobre a História da África e de suas relações com as estruturas de poder portuguesa e brasileira. Portanto, sua perda no incêndio de 2018 representou nada menos que a destruição de um conjunto de documentos históricos únicos sobre a diplomacia e proximidade político-cultural existente entre Brasil e Benin, bem como a perda de elementos que favoreciam o questionamento do senso comum e do desconhecimento brasileiro sobre a história africana.

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Propagação de Calor Trocas de Calor sem Mudança de Fase

Quando colocada em um recipiente, a água sofre evaporação a partir da sua superfície, tendo como resistência física à evaporação a pressão sobre essa superfície. Se a pressão do vapor de água atinge o valor da pressão que age sobre sua superfície, a evaporação tende à formação de bolhas (ebulição). Nessa situação, a temperatura da água permanece constante até a evaporação total.

a) O cozimento de alimentos é, de uma forma simplificada, uma coleção de processos (reações) químicos. Neste contexto, cite a principal vantagem do uso de uma panela de pressão e explique, do ponto de vista científico, a mudança que seu uso promove em relação a um cozimento em panela comum.

b) Em uma panela de pressão foi colocado determinado volume de água. Considere os três seguintes processos, realizados separadamente, para ferver a água, até a evaporação completa:

    1. Deixar a panela aberta, sem tampa; ligar o fogo e aquecer a água.

    2. Fechar a panela apenas apoiando a tampa na sua parte superior; ligar o fogo e aquecer a água.

    3. Fechar a panela encaixando a tampa conforme recomendado pelo fabricante; ligar o fogo e aquecer a água.

O gráfico abaixo contém três curvas de temperatura da água, θ, em função do tempo. Correlacione os processos 1, 2 e 3 acima com as correspondentes curvas A, B ou C no gráfico. Justifique sua resposta. Desconsidere a contribuição da massa da tampa da panela.



Resolução

a) A panela de pressão é um recipiente que, quando aquecido e fechado adequadamente, permite que a pressão de seu interior seja significativamente maior do que a pressão atmosférica. Com a temperatura de ebulição é definida como a temperatura na qual a pressão de vapor do líquido é igual à pressão atmosférica. Sendo assim, a maior pressão no inteirior da panela de pressão faz com que a temperatura de ebulição da água (e, portanto, a temperatura máxima do sistema) seja maior em relação à panela aberta, afinal, é necessário aquecê-la ainda mais para que sua pressão de vapor se iguale à do recipiente pressurizado.

Como a ebulição da água dentro da panela de pressão ocorre em uma temperatura superior à da ebulição à pressão ambiente, os alimentos são cozidos mais rapidamente, já que as reações químicas que os transformam acontecerão com maior velocidade. Isso de deve ao fato de que a elevação da temperatura aumenta a frequência de colisões e a porcentagem de moléculas com energia de ativação suficiente para reagir, permitindo assim, maior taxa de colisões efetivas (que são aquelas que levam ao produto), portanto, maior velocidade na cocção dos alimentos.

b) Vamos analisar os 3 processos:

1. Com a panela destampada a troca de calor entre o líquido e o meio via mecanismo de convecção é facilitada. O ar mais quente no interior da panela, incluindo o vapor de água, é menos denso do que o ar mais frio ao seu redor e por isso sobe e sai, levando consigo parte do calor do sistema. Dos casos apresentados, este é o processo em que há mais perda de calor da panela para o ambiente, resultando em um aquecimento mais lento, tal como indicado pela curva C.

2. Com a tampa apoiada sobre a panela o processo de convecção é dificultado e as trocas de calor são minimizadas em comparação com o processo 1, minimizando o tempo de aquecimento do sistema, tal como indicado pela curva B.

3. Com a tampa adequadamente fechada, o processo de convecção e de perdas de vapor de água durante o aquecimento são reduzidos em comparação com os processos 1 e 2. Isso minimiza significativamente as trocas de calor entre a panela e o ambiente, permitindo um aquecimento ainda mais rápido. Além disso, com a panela fechada, a temperatura de cocção é maior, tal como justificado no item anterior, e este processo é indicado pela curva A.

Desse modo, temos a seguinte tabela, relacionando as curvas do gráfico e os processos:

Curva

Processo

A

3

B

2

C

1

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Função Afim Calorimetria

Estudos mostram que a taxa de desmatamento nos principais biomas brasileiros tem aumentado significativamente desde 2015, causando a fragmentação da paisagem e tornando esses biomas altamente propensos a incêndios. Apesar dos processos químicos envolvidos na combustão da madeira ocorrerem de forma similar nos diferentes biomas, as diferenças na vegetação fazem com que as queimadas tenham características e consequências distintas em cada bioma.

a) A vegetação na Amazônia é caracterizada majoritariamente por florestas altas e densas, enquanto o Pantanal é coberto por vegetação predominantemente aberta. Supondo que todos os outros fatores sejam similares nos dois biomas, compare a velocidade de propagação das queimadas na Amazônia e no Pantanal. O tempo para queimar uma mesma área será maior em qual desses dois biomas? Justifique sua resposta.

b) Um dos parâmetros mais importantes para entender o comportamento do fogo é a intensidade da linha de frente do fogo, I, que representa a quantidade de calor liberado por unidade de tempo por unidade de comprimento da frente do fogo. A intensidade pode ser modelada fisicamente como o produto do calor de combustão do combustível, H, pela quantidade do combustível disponível, q (medida em kg/m²), e pela velocidade de propagação do fogo, r (medida em m/s):

I=H·q·r

No gráfico abaixo, os pontos representam a intensidade de diferentes queimadas registradas no Cerrado em função do produto q·r . A reta representa a curva de tendência que melhor ajusta os dados. A partir destas informações, estime o calor de combustão do combustível disponível para queima no Cerrado brasileiro.



Resolução

a) Há dois fatores importantes que devem ser considerados no espalhamento de um incêndio: a taxa com que o calor liberado na combustão é absorvido pelo ambiente e a taxa com que a insolação disponibiliza energia para a manutenção da combustão.

Florestas altas e densas possuem ambiente com maior umidade do que lugares de vegetação predominantemente aberta, uma vez que há maior taxa de evapotranspiração. Como a água é uma substância de alto calor específico, a umidade é capaz de absorver grande quantidade de calor do ambiente sem sofrer consideráveis variações de temperatura, e desta forma funciona como um reservatório de energia garantindo pequena amplitude térmica e temperaturas, em média, menores. Há estudos1 que indicam que florestas possuem temperaturas até 5ºC menores, em média, do que pastagens de vegetação aberta. No caso de incêndios, a umidade dificulta a propagação do fogo, retendo boa parte da energia liberada, além de dificultar a queima do combustível vegetal, mantendo a matéria orgânica úmida e, portanto, menos capaz de absorver a energia que é necessária para iniciar a combustão.

Além disso, em florestas densas ocorre menor insolação da superfície, devido à sombra garantida pelas copas. Este fator contribui para a menor disponibilidade de energia à matéria orgânica combustível, sendo um fator que dificulta a propagação de incêndios. Há estudos2 que indicam que áreas florestais já exploradas pela indústria madeireira e áreas florestais já atingidas por incêndios possuem maior susceptibilidade à proliferação do fogo devido a alterações na estrutura vegetal e maior entrada de iluminação solar.

Em vista do exposto acima, o tempo necessário para queimar uma mesma área é menor no Pantanal, de vegetação predominantemente aberta, onde há maior disponibilidade energética devido à menor umidade e maior disponibilidade de radiação solar.

b) Buscamos uma relação linear entre a intensidade do fogo I e o produto q·r da disponibilidade de combustível pela velocidade de propagação do fogo. Nesta relação linear, o calor de combustão H do combustível é o coeficiente angular:

I=H·q·r.

O coeficiente linear nesta relação é nulo; extrapolando o gráfico apresentado no espaço de respostas vemos que a linha intercepta a origem, como esperado. Observe a figura:

Desta forma, tomando o par de pontos destacados em vermelho na figura abaixo, o coeficiente angular é dado por

H=ΔIΔq·r=800-400 103W/m0,06-0,03 kg/m·s=4000,03·103 W·skg=43·107 Jkg

H1,33·107 Jkg

 

1 RELATÓRIO DE AVALIAÇÃO DE MEIO TERMO DA EFETIVIDADE DO FUNDO AMAZÔNIA: 2008 - 2018 (http://www.fundoamazonia.gov.br/export/sites/default/pt/.galleries/documentos/monitoramento-avaliacao/avaliacoes-externas/FA-Relatorio-Avaliacao-Meio-Termo-Fundo-Amazonia.pdf - Acessado em 09/02/21 às 20h00)

2 Análises de susceptibilidade e impacto de incêndios florestais em uma floresta alagável (igapó) na Amazônia central por meio de lidar terrestre portátil (http://www.dsr.inpe.br/sbsr2015/files/p0240.pdf - Acessado em 09/02/21 às 20h00)