O Tabuleiro de Xadrez Persa
Segundo o modo como ouvi pela primeira vez a história, aconteceu na Pérsia antiga. Mas podia ter sido na Índia ou até na China. De qualquer forma, aconteceu há muito tempo. O grão-vizir, o principal conselheiro do rei, tinha inventado um novo jogo. Era jogado com peças móveis sobre um tabuleiro quadrado que consistia em 64 quadrados vermelhos e pretos. A peça mais importante era o rei. A segunda peça mais importante era o grão-vizir – exatamente o que se esperaria de um jogo inventado por um grão-vizir. O objetivo era capturar o rei inimigo e, por isso, o jogo era chamado, em persa, shahmat– shah para rei, mat para morto. Morte ao rei. Em russo, é ainda chamado shakhmat. Expressão que talvez transmita um remanescente sentimento revolucionário. Até em inglês, há um eco desse nome – o lance final é chamado checkmate (xeque-mate). O jogo, claro, é o xadrez. Ao longo do tempo, as peças, seus movimentos, as regras do jogo, tudo evoluiu. Por exemplo, já não existe um grão-vizir – que se metamorfoseou numa rainha, com poderes muito mais terríveis.
A razão de um rei se deliciar com a invenção de um jogo chamado “Morte ao rei” é um mistério. Mas reza a história que ele ficou tão encantado que mandou o grão-vizir determinar sua própria recompensa por ter criado uma invenção tão magnífica. O grão-vizir tinha a resposta na ponta da língua: era um homem modesto, disse ao xá. Desejava apenas uma recompensa simples. Apontando as oito colunas e as oito filas de quadrados no tabuleiro que tinha inventado, pediu que lhe fosse dado um único grão de trigo no primeiro quadrado, o dobro dessa quantia no segundo, o dobro dessa quantia no terceiro e assim por diante, até que cada quadrado tivesse o seu complemento de trigo. Não, protestou o rei, era uma recompensa demasiado modesta para uma invenção tão importante.
Ofereceu joias, dançarinas, palácios. Mas o grão-vizir, com os olhos apropriadamente baixos, recusou todas as ofertas. Só desejava pequenos montes de trigo. Assim, admirando-se secretamente da humildade e comedimento de seu conselheiro, o rei consentiu.
No entanto, quando o mestre do Celeiro Real começou a contar os grãos, o rei se viu diante de uma surpresa desagradável.
O número de grãos começa bem pequeno: 1, 2, 4, 8, 16, 32, 64, 128, 256, 512, 1024... mas quando se chega ao 64o quadrado, o número se torna colossal, esmagador. Na realidade, o número é quase 18,5 quintilhões*. Talvez o grão-vizir estivesse fazendo uma dieta rica em fibras.
Quanto pesam 18,5 quintilhões de grãos de trigo? Se cada grão tivesse o tamanho de um milímetro, todos os grãos juntos pesariam cerca de 75 bilhões de toneladas métricas, o que é muito mais do que poderia ser armazenado nos celeiros do xá. Na verdade, esse número equivale a cerca de 150 anos da produção de trigo mundial no presente. O relato do que aconteceu a seguir não chegou até nós. Se o rei, inadimplente, culpando-se pela falta de atenção nos seus estudos de aritmética, entregou o reino ao vizir, ou se o último experimentou as aflições de um novo jogo chamado vizirmat, não temos o privilégio de saber.
* 1 quintilhão = 1 000 000 000 000 000 000 = 1018. Para se contar esse número a partir de 0 (um número por segundo, dia e noite), seriam necessários 32 bilhões de anos (mais tempo do que a idade do universo).
(Carl Sagan -1934-1996- . Bilhões e bilhões, 2008. Adaptado.)
Por ser um artigo de divulgação científica, o texto apresenta uma linguagem
a) |
técnica e impessoal.
|
b) |
hermética e mal-humorada.
|
c) |
acessível e divertida.
|
d) |
rebuscada e pretensiosa.
|
e) |
e) inteligível e pedante.
|
a) Incorreta. A linguagem técnica, repleta de jargões específicos de suas respectivas áreas, é característica de textos científicos voltados a especialistas no assunto. A impessoalidade também lhe seria uma característica, haja vista o enfoque desses textos, que não recai nos leitores, e sim nos assuntos específicos de que o texto trataria.
b) Incorreta. Considerando “hermética” uma linguagem “fechada”, “tradicional”, não é isso que se observa no texto, dotado de uma linguagem fluida, acessível ao leitor médio. Linguagem mal-humorada também não é uma característica do registro do texto em questão, repleto de “piadinhas”, como a que inicia o segundo parágrafo: “A razão de um rei se deliciar com a invenção de um jogo chamado “Morte ao rei” é um mistério”.
c) Correta. Por se tratar de um texto de divulgação científica, a linguagem acessível lhe é característica, haja vista a necessidade de ser compreensível para leigos, não especialistas no assunto. Além disso, o tom do texto é divertido, fazendo “piadinhas” como a que encerra o último parágrafo: “Se o rei, inadimplente, culpando-se pela falta de atenção nos seus estudos de aritmética, entregou o reino ao vizir, ou se o último experimentou as aflições de um novo jogo chamado vizirmat, não temos o privilégio de saber”.
d) Incorreta. Não temos uma linguagem rebuscada, esmerilhada, repleta de esmero, o que poderia afastar o leitor médio idealizado por textos de divulgação científica. Também não temos uma linguagem pretensiosa, que pretende ser mais do que aquilo que realmente é, sob pena de também promover afastamento do leitor que lhe é característico.
e) Incorreta. Realmente, temos no texto uma linguagem inteligível, aquela que é compreensível e fácil de entender. Não temos, contudo, uma linguagem pedante, que expressaria erudição ou conhecimentos que não lhe seriam reais.
O Tabuleiro de Xadrez Persa
Segundo o modo como ouvi pela primeira vez a história, aconteceu na Pérsia antiga. Mas podia ter sido na Índia ou até na China. De qualquer forma, aconteceu há muito tempo. O grão-vizir, o principal conselheiro do rei, tinha inventado um novo jogo. Era jogado com peças móveis sobre um tabuleiro quadrado que consistia em 64 quadrados vermelhos e pretos. A peça mais importante era o rei. A segunda peça mais importante era o grão-vizir – exatamente o que se esperaria de um jogo inventado por um grão-vizir. O objetivo era capturar o rei inimigo e, por isso, o jogo era chamado, em persa, shahmat– shah para rei, mat para morto. Morte ao rei. Em russo, é ainda chamado shakhmat. Expressão que talvez transmita um remanescente sentimento revolucionário. Até em inglês, há um eco desse nome – o lance final é chamado checkmate (xeque-mate). O jogo, claro, é o xadrez. Ao longo do tempo, as peças, seus movimentos, as regras do jogo, tudo evoluiu. Por exemplo, já não existe um grão-vizir – que se metamorfoseou numa rainha, com poderes muito mais terríveis.
A razão de um rei se deliciar com a invenção de um jogo chamado “Morte ao rei” é um mistério. Mas reza a história que ele ficou tão encantado que mandou o grão-vizir determinar sua própria recompensa por ter criado uma invenção tão magnífica. O grão-vizir tinha a resposta na ponta da língua: era um homem modesto, disse ao xá. Desejava apenas uma recompensa simples. Apontando as oito colunas e as oito filas de quadrados no tabuleiro que tinha inventado, pediu que lhe fosse dado um único grão de trigo no primeiro quadrado, o dobro dessa quantia no segundo, o dobro dessa quantia no terceiro e assim por diante, até que cada quadrado tivesse o seu complemento de trigo. Não, protestou o rei, era uma recompensa demasiado modesta para uma invenção tão importante.
Ofereceu joias, dançarinas, palácios. Mas o grão-vizir, com os olhos apropriadamente baixos, recusou todas as ofertas. Só desejava pequenos montes de trigo. Assim, admirando-se secretamente da humildade e comedimento de seu conselheiro, o rei consentiu.
No entanto, quando o mestre do Celeiro Real começou a contar os grãos, o rei se viu diante de uma surpresa desagradável.
O número de grãos começa bem pequeno: 1, 2, 4, 8, 16, 32, 64, 128, 256, 512, 1024... mas quando se chega ao 64o quadrado, o número se torna colossal, esmagador. Na realidade, o número é quase 18,5 quintilhões*. Talvez o grão-vizir estivesse fazendo uma dieta rica em fibras.
Quanto pesam 18,5 quintilhões de grãos de trigo? Se cada grão tivesse o tamanho de um milímetro, todos os grãos juntos pesariam cerca de 75 bilhões de toneladas métricas, o que é muito mais do que poderia ser armazenado nos celeiros do xá. Na verdade, esse número equivale a cerca de 150 anos da produção de trigo mundial no presente. O relato do que aconteceu a seguir não chegou até nós. Se o rei, inadimplente, culpando-se pela falta de atenção nos seus estudos de aritmética, entregou o reino ao vizir, ou se o último experimentou as aflições de um novo jogo chamado vizirmat, não temos o privilégio de saber.
* 1 quintilhão = 1 000 000 000 000 000 000 = 1018. Para se contar esse número a partir de 0 (um número por segundo, dia e noite), seriam necessários 32 bilhões de anos (mais tempo do que a idade do universo).
(Carl Sagan -1934-1996- . Bilhões e bilhões, 2008. Adaptado.)
No artigo, o recurso à ironia está bem exemplificado em:
a) |
a) “O relato do que aconteceu a seguir não chegou até nós.” (4º parágrafo) |
b) |
b) “Quanto pesam 18,5 quintilhões de grãos de trigo?” (4º parágrafo) |
c) |
c) “Ao longo do tempo, as peças, seus movimentos, as regras do jogo, tudo evoluiu.” (1º parágrafo) |
d) |
d) “Segundo o modo como ouvi pela primeira vez a história, aconteceu na Pérsia antiga.” (1º parágrafo) |
e) |
“Talvez o grão-vizir estivesse fazendo uma dieta rica em fibras.” (3º parágrafo) |
Ironia é uma figura de linguagem que se caracteriza por expressar o contrário do que realmente se pretende. Tal fenômeno pode ser observado na alternativa E, em que se lê “Talvez o grão-vizir estivesse fazendo uma dieta rica em fibras.” O contexto nos indica que a intenção do grão-vizir, ao solicitar ao rei um grão de trigo no primeiro quadrado do tabuleiro, dobrando-se sucessivamente tal quantia até que se chegasse ao último quadrado, não era o de uma dieta rica em fibras, como ironicamente sugeriu o autor do texto em análise, mas seu enriquecimento às custas do rei. Tal fenômeno da ironia não é observado em nenhuma outra alternativa em análise, todas elas com seus sentidos literais evidentes.
O Tabuleiro de Xadrez Persa
Segundo o modo como ouvi pela primeira vez a história, aconteceu na Pérsia antiga. Mas podia ter sido na Índia ou até na China. De qualquer forma, aconteceu há muito tempo. O grão-vizir, o principal conselheiro do rei, tinha inventado um novo jogo. Era jogado com peças móveis sobre um tabuleiro quadrado que consistia em 64 quadrados vermelhos e pretos. A peça mais importante era o rei. A segunda peça mais importante era o grão-vizir – exatamente o que se esperaria de um jogo inventado por um grão-vizir. O objetivo era capturar o rei inimigo e, por isso, o jogo era chamado, em persa, shahmat– shah para rei, mat para morto. Morte ao rei. Em russo, é ainda chamado shakhmat. Expressão que talvez transmita um remanescente sentimento revolucionário. Até em inglês, há um eco desse nome – o lance final é chamado checkmate (xeque-mate). O jogo, claro, é o xadrez. Ao longo do tempo, as peças, seus movimentos, as regras do jogo, tudo evoluiu. Por exemplo, já não existe um grão-vizir – que se metamorfoseou numa rainha, com poderes muito mais terríveis.
A razão de um rei se deliciar com a invenção de um jogo chamado “Morte ao rei” é um mistério. Mas reza a história que ele ficou tão encantado que mandou o grão-vizir determinar sua própria recompensa por ter criado uma invenção tão magnífica. O grão-vizir tinha a resposta na ponta da língua: era um homem modesto, disse ao xá. Desejava apenas uma recompensa simples. Apontando as oito colunas e as oito filas de quadrados no tabuleiro que tinha inventado, pediu que lhe fosse dado um único grão de trigo no primeiro quadrado, o dobro dessa quantia no segundo, o dobro dessa quantia no terceiro e assim por diante, até que cada quadrado tivesse o seu complemento de trigo. Não, protestou o rei, era uma recompensa demasiado modesta para uma invenção tão importante.
Ofereceu joias, dançarinas, palácios. Mas o grão-vizir, com os olhos apropriadamente baixos, recusou todas as ofertas. Só desejava pequenos montes de trigo. Assim, admirando-se secretamente da humildade e comedimento de seu conselheiro, o rei consentiu.
No entanto, quando o mestre do Celeiro Real começou a contar os grãos, o rei se viu diante de uma surpresa desagradável.
O número de grãos começa bem pequeno: 1, 2, 4, 8, 16, 32, 64, 128, 256, 512, 1024... mas quando se chega ao 64o quadrado, o número se torna colossal, esmagador. Na realidade, o número é quase 18,5 quintilhões*. Talvez o grão-vizir estivesse fazendo uma dieta rica em fibras.
Quanto pesam 18,5 quintilhões de grãos de trigo? Se cada grão tivesse o tamanho de um milímetro, todos os grãos juntos pesariam cerca de 75 bilhões de toneladas métricas, o que é muito mais do que poderia ser armazenado nos celeiros do xá. Na verdade, esse número equivale a cerca de 150 anos da produção de trigo mundial no presente. O relato do que aconteceu a seguir não chegou até nós. Se o rei, inadimplente, culpando-se pela falta de atenção nos seus estudos de aritmética, entregou o reino ao vizir, ou se o último experimentou as aflições de um novo jogo chamado vizirmat, não temos o privilégio de saber.
* 1 quintilhão = 1 000 000 000 000 000 000 = 1018. Para se contar esse número a partir de 0 (um número por segundo, dia e noite), seriam necessários 32 bilhões de anos (mais tempo do que a idade do universo).
(Carl Sagan -1934-1996- . Bilhões e bilhões, 2008. Adaptado.)
O trecho “era um homem modesto, disse ao xá” (2º parágrafo) foi construído em discurso indireto. Ao se adaptar tal trecho para o discurso direto, o verbo “era” assume a seguinte forma:
a) |
a) serei. |
b) |
b) fui. |
c) |
c) seria. |
d) |
d) fosse. |
e) |
e) sou. |
Discurso direto é a reprodução literal da fala de alguém ou de personagens. Discurso indireto é a reprodução, por parte de um narrador, da fala de alguém ou de personagens. Para a transposição do discurso direto para o indireto, considera-se que verbos no presente devem ser transpostos para o pretérito imperfeito do indicativo. Como a questão solicita o inverso, ou seja, a transposição do discurso indireto para o discurso direto, basta fazer o contrário. Assim: “era [pretérito imperfeito do indicativo] um homem modesto, disse ao xá” > [eu disse ao xá] “sou [presente do indicativo] um homem modesto”.
O Tabuleiro de Xadrez Persa
Segundo o modo como ouvi pela primeira vez a história, aconteceu na Pérsia antiga. Mas podia ter sido na Índia ou até na China. De qualquer forma, aconteceu há muito tempo. O grão-vizir, o principal conselheiro do rei, tinha inventado um novo jogo. Era jogado com peças móveis sobre um tabuleiro quadrado que consistia em 64 quadrados vermelhos e pretos. A peça mais importante era o rei. A segunda peça mais importante era o grão-vizir – exatamente o que se esperaria de um jogo inventado por um grão-vizir. O objetivo era capturar o rei inimigo e, por isso, o jogo era chamado, em persa, shahmat– shah para rei, mat para morto. Morte ao rei. Em russo, é ainda chamado shakhmat. Expressão que talvez transmita um remanescente sentimento revolucionário. Até em inglês, há um eco desse nome – o lance final é chamado checkmate (xeque-mate). O jogo, claro, é o xadrez. Ao longo do tempo, as peças, seus movimentos, as regras do jogo, tudo evoluiu. Por exemplo, já não existe um grão-vizir – que se metamorfoseou numa rainha, com poderes muito mais terríveis.
A razão de um rei se deliciar com a invenção de um jogo chamado “Morte ao rei” é um mistério. Mas reza a história que ele ficou tão encantado que mandou o grão-vizir determinar sua própria recompensa por ter criado uma invenção tão magnífica. O grão-vizir tinha a resposta na ponta da língua: era um homem modesto, disse ao xá. Desejava apenas uma recompensa simples. Apontando as oito colunas e as oito filas de quadrados no tabuleiro que tinha inventado, pediu que lhe fosse dado um único grão de trigo no primeiro quadrado, o dobro dessa quantia no segundo, o dobro dessa quantia no terceiro e assim por diante, até que cada quadrado tivesse o seu complemento de trigo. Não, protestou o rei, era uma recompensa demasiado modesta para uma invenção tão importante.
Ofereceu joias, dançarinas, palácios. Mas o grão-vizir, com os olhos apropriadamente baixos, recusou todas as ofertas. Só desejava pequenos montes de trigo. Assim, admirando-se secretamente da humildade e comedimento de seu conselheiro, o rei consentiu.
No entanto, quando o mestre do Celeiro Real começou a contar os grãos, o rei se viu diante de uma surpresa desagradável.
O número de grãos começa bem pequeno: 1, 2, 4, 8, 16, 32, 64, 128, 256, 512, 1024... mas quando se chega ao 64o quadrado, o número se torna colossal, esmagador. Na realidade, o número é quase 18,5 quintilhões*. Talvez o grão-vizir estivesse fazendo uma dieta rica em fibras.
Quanto pesam 18,5 quintilhões de grãos de trigo? Se cada grão tivesse o tamanho de um milímetro, todos os grãos juntos pesariam cerca de 75 bilhões de toneladas métricas, o que é muito mais do que poderia ser armazenado nos celeiros do xá. Na verdade, esse número equivale a cerca de 150 anos da produção de trigo mundial no presente. O relato do que aconteceu a seguir não chegou até nós. Se o rei, inadimplente, culpando-se pela falta de atenção nos seus estudos de aritmética, entregou o reino ao vizir, ou se o último experimentou as aflições de um novo jogo chamado vizirmat, não temos o privilégio de saber.
* 1 quintilhão = 1 000 000 000 000 000 000 = 1018. Para se contar esse número a partir de 0 (um número por segundo, dia e noite), seriam necessários 32 bilhões de anos (mais tempo do que a idade do universo).
(Carl Sagan -1934-1996- . Bilhões e bilhões, 2008. Adaptado.)
Assinale a alternativa cujo excerto se afasta da lógica exposta pela fábula do tabuleiro de xadrez persa.
a) |
a) “No presente, o tempo de duplicação da população mundial é de cerca de quarenta anos. A cada quarenta anos haverá o dobro de seres humanos. Como o clérigo inglês Thomas Malthus apontou em 1798, uma população que cresce exponencialmente – Malthus a descreveu como uma progressão geométrica – vai superar qualquer aumento concebível de alimentos.” |
b) |
b) “No momento, em muitos países o número de pessoas com sintomas de aids está crescendo exponencialmente. O tempo de duplicação é mais ou menos de um ano. Isto é, a cada ano há duas vezes mais casos de aids do que havia no ano anterior. Essa doença já nos cobrou um tributo desastroso em mortes.” |
c) |
c) “Vamos considerar primeiro o simples caso de uma bactéria que se reproduz dividindo-se em duas. Depois de certo tempo, cada uma das duas bactérias filhas também se divide. Desde que exista bastante alimento e não haja nenhum veneno no ambiente, a colônia de bactérias vai crescer exponencialmente.” |
d) |
d) “A população da Terra na época de Jesus consistia talvez em 250 milhões de pessoas. Existem 93 milhões de milhas (150 milhões de quilômetros) da Terra até o Sol. Aproximadamente 40 milhões de pessoas foram mortas na Primeira Guerra Mundial; 60 milhões na Segunda Guerra Mundial. Há 31,7 milhões de segundos num ano (como é bastante fácil verificar).” |
e) |
“Atualmente, há cerca de 6 bilhões de humanos. Em quarenta anos, se o tempo de duplicação continuar constante, haverá 12 bilhões; em oitenta anos, 24 bilhões; em cento e vinte anos, 48 bilhões... Mas poucos acreditam que a Terra possa suportar tanta gente.” |
A lógica exposta pela fábula do tabuleiro de xadrez persa parte de uma progressão geométrica, uma sequência em que cada termo é seu antecessor multiplicado por uma constante não nula chamada de razão. No caso do tabuleiro persa, essa constante é 2; desse modo, a cada termo que se sucede, temos o dobro do número de grãos obtido anteriormente. Note que, para a última casa, o grão-vizir terá recebido aproximadamente 1018 grãos de trigo, quantidade vultosa considerando-se apenas a última casa. Somando-se todas as outras casas, a quantidade é inimaginavelmente maior (18 quintilhões de trigo).
a) Incorreta. A lógica é semelhante à da fábula: a teoria malthuasiana defende um crescimento exponencial da população, em progressão geométrica, até que seja inconciliável o número populacional com o aumento possível da produção de alimentos.
b) Incorreta. A lógica é semelhante à da fábula: o crescimento de casos de aids duplica a cada ano, exemplo novamente de progressão geométrica.
c) Incorreta. A lógica é semelhante à da fábula: as bactérias se dividem em duas, que se dividem em duas e assim sucessivamente, denotando também um crescimento exponencial, em progressão geométrica.
d) Correta. O texto não tem uma lógica muito evidente. Começa com uma referência à população da Terra na época de Jesus, parte para a distância da Terra ao Sol, passa pelas quantidades de pessoas mortas nas duas guerras mundiais e termina falando dos milhões de segundos em um ano.
e) Incorreta. A lógica é semelhante à da fábula: a cada quarenta anos, a população cresce em dobro, crescendo exponencialmente, em progressão geométrica.
O Tabuleiro de Xadrez Persa
Segundo o modo como ouvi pela primeira vez a história, aconteceu na Pérsia antiga. Mas podia ter sido na Índia ou até na China. De qualquer forma, aconteceu há muito tempo. O grão-vizir, o principal conselheiro do rei, tinha inventado um novo jogo. Era jogado com peças móveis sobre um tabuleiro quadrado que consistia em 64 quadrados vermelhos e pretos. A peça mais importante era o rei. A segunda peça mais importante era o grão-vizir – exatamente o que se esperaria de um jogo inventado por um grão-vizir. O objetivo era capturar o rei inimigo e, por isso, o jogo era chamado, em persa, shahmat– shah para rei, mat para morto. Morte ao rei. Em russo, é ainda chamado shakhmat. Expressão que talvez transmita um remanescente sentimento revolucionário. Até em inglês, há um eco desse nome – o lance final é chamado checkmate (xeque-mate). O jogo, claro, é o xadrez. Ao longo do tempo, as peças, seus movimentos, as regras do jogo, tudo evoluiu. Por exemplo, já não existe um grão-vizir – que se metamorfoseou numa rainha, com poderes muito mais terríveis.
A razão de um rei se deliciar com a invenção de um jogo chamado “Morte ao rei” é um mistério. Mas reza a história que ele ficou tão encantado que mandou o grão-vizir determinar sua própria recompensa por ter criado uma invenção tão magnífica. O grão-vizir tinha a resposta na ponta da língua: era um homem modesto, disse ao xá. Desejava apenas uma recompensa simples. Apontando as oito colunas e as oito filas de quadrados no tabuleiro que tinha inventado, pediu que lhe fosse dado um único grão de trigo no primeiro quadrado, o dobro dessa quantia no segundo, o dobro dessa quantia no terceiro e assim por diante, até que cada quadrado tivesse o seu complemento de trigo. Não, protestou o rei, era uma recompensa demasiado modesta para uma invenção tão importante.
Ofereceu joias, dançarinas, palácios. Mas o grão-vizir, com os olhos apropriadamente baixos, recusou todas as ofertas. Só desejava pequenos montes de trigo. Assim, admirando-se secretamente da humildade e comedimento de seu conselheiro, o rei consentiu.
No entanto, quando o mestre do Celeiro Real começou a contar os grãos, o rei se viu diante de uma surpresa desagradável.
O número de grãos começa bem pequeno: 1, 2, 4, 8, 16, 32, 64, 128, 256, 512, 1024... mas quando se chega ao 64o quadrado, o número se torna colossal, esmagador. Na realidade, o número é quase 18,5 quintilhões*. Talvez o grão-vizir estivesse fazendo uma dieta rica em fibras.
Quanto pesam 18,5 quintilhões de grãos de trigo? Se cada grão tivesse o tamanho de um milímetro, todos os grãos juntos pesariam cerca de 75 bilhões de toneladas métricas, o que é muito mais do que poderia ser armazenado nos celeiros do xá. Na verdade, esse número equivale a cerca de 150 anos da produção de trigo mundial no presente. O relato do que aconteceu a seguir não chegou até nós. Se o rei, inadimplente, culpando-se pela falta de atenção nos seus estudos de aritmética, entregou o reino ao vizir, ou se o último experimentou as aflições de um novo jogo chamado vizirmat, não temos o privilégio de saber.
* 1 quintilhão = 1 000 000 000 000 000 000 = 1018. Para se contar esse número a partir de 0 (um número por segundo, dia e noite), seriam necessários 32 bilhões de anos (mais tempo do que a idade do universo).
(Carl Sagan -1934-1996- . Bilhões e bilhões, 2008. Adaptado.)
O eufemismo (do grego euphemismós, que significava “emprego de uma palavra favorável no lugar de uma de mau augúrio”, vocábulo formado de eu, “bem” + femi, “dizer, falar”, designando, pois, “o ato de falar de uma maneira agradável”) é a figura de retórica em que há uma diminuição da intensidade semântica, com a utilização de uma expressão atenuada para dizer alguma coisa desagradável.
(José Luiz Fiorin. Figuras de retórica, 2014. Adaptado.)
Verifica-se a ocorrência desse recurso no seguinte trecho:
a) |
a) “se o último experimentou as aflições de um novo jogo chamado vizirmat” (4o parágrafo). |
b) |
b) “O número de grãos começa bem pequeno” (3o parágrafo). |
c) |
c) “pediu que lhe fosse dado um único grão de trigo no primeiro quadrado” (2o parágrafo). |
d) |
d) “De qualquer forma, aconteceu há muito tempo” (1o parágrafo). |
e) |
“admirando-se secretamente da humildade e comedimento de seu conselheiro” (2o parágrafo). |
O enunciado já esclarece o que é a figura de linguagem denominada eufemismo: a utilização de uma expressão atenuada para referir-se a algo desagradável. Na alternativa A, a referência à possível morte do grão-vizir é atenuada pela possibilidade de existência de um jogo chamado vizirmat, em referência à expressão em persa shahmat, que significa “morte ao rei” e denominava o nome do jogo persa. Vizirmat, portanto, seria a morte do grão-vizir, representada eufemisticamente no trecho “se o último experimentou as aflições de um novo jogo chamado vizirmat, não temos o privilégio de saber.” Ou seja, se ele morreu, foi assassinado, não temos o privilégio de saber. Nas outras alternativas, temos sentidos literais.
O Tabuleiro de Xadrez Persa
Segundo o modo como ouvi pela primeira vez a história, aconteceu na Pérsia antiga. Mas podia ter sido na Índia ou até na China. De qualquer forma, aconteceu há muito tempo. O grão-vizir, o principal conselheiro do rei, tinha inventado um novo jogo. Era jogado com peças móveis sobre um tabuleiro quadrado que consistia em 64 quadrados vermelhos e pretos. A peça mais importante era o rei. A segunda peça mais importante era o grão-vizir – exatamente o que se esperaria de um jogo inventado por um grão-vizir. O objetivo era capturar o rei inimigo e, por isso, o jogo era chamado, em persa, shahmat– shah para rei, mat para morto. Morte ao rei. Em russo, é ainda chamado shakhmat. Expressão que talvez transmita um remanescente sentimento revolucionário. Até em inglês, há um eco desse nome – o lance final é chamado checkmate (xeque-mate). O jogo, claro, é o xadrez. Ao longo do tempo, as peças, seus movimentos, as regras do jogo, tudo evoluiu. Por exemplo, já não existe um grão-vizir – que se metamorfoseou numa rainha, com poderes muito mais terríveis.
A razão de um rei se deliciar com a invenção de um jogo chamado “Morte ao rei” é um mistério. Mas reza a história que ele ficou tão encantado que mandou o grão-vizir determinar sua própria recompensa por ter criado uma invenção tão magnífica. O grão-vizir tinha a resposta na ponta da língua: era um homem modesto, disse ao xá. Desejava apenas uma recompensa simples. Apontando as oito colunas e as oito filas de quadrados no tabuleiro que tinha inventado, pediu que lhe fosse dado um único grão de trigo no primeiro quadrado, o dobro dessa quantia no segundo, o dobro dessa quantia no terceiro e assim por diante, até que cada quadrado tivesse o seu complemento de trigo. Não, protestou o rei, era uma recompensa demasiado modesta para uma invenção tão importante.
Ofereceu joias, dançarinas, palácios. Mas o grão-vizir, com os olhos apropriadamente baixos, recusou todas as ofertas. Só desejava pequenos montes de trigo. Assim, admirando-se secretamente da humildade e comedimento de seu conselheiro, o rei consentiu.
No entanto, quando o mestre do Celeiro Real começou a contar os grãos, o rei se viu diante de uma surpresa desagradável.
O número de grãos começa bem pequeno: 1, 2, 4, 8, 16, 32, 64, 128, 256, 512, 1024... mas quando se chega ao 64o quadrado, o número se torna colossal, esmagador. Na realidade, o número é quase 18,5 quintilhões*. Talvez o grão-vizir estivesse fazendo uma dieta rica em fibras.
Quanto pesam 18,5 quintilhões de grãos de trigo? Se cada grão tivesse o tamanho de um milímetro, todos os grãos juntos pesariam cerca de 75 bilhões de toneladas métricas, o que é muito mais do que poderia ser armazenado nos celeiros do xá. Na verdade, esse número equivale a cerca de 150 anos da produção de trigo mundial no presente. O relato do que aconteceu a seguir não chegou até nós. Se o rei, inadimplente, culpando-se pela falta de atenção nos seus estudos de aritmética, entregou o reino ao vizir, ou se o último experimentou as aflições de um novo jogo chamado vizirmat, não temos o privilégio de saber.
* 1 quintilhão = 1 000 000 000 000 000 000 = 1018. Para se contar esse número a partir de 0 (um número por segundo, dia e noite), seriam necessários 32 bilhões de anos (mais tempo do que a idade do universo).
(Carl Sagan -1934-1996- . Bilhões e bilhões, 2008. Adaptado.)
Considerado em seu contexto, o trecho “A razão de um rei se deliciar com a invenção de um jogo chamado ‘Morte ao rei’ é um mistério” (2o parágrafo) sugere que:
a) |
o caráter misterioso das regras do xadrez decorre de sua ligação com a esfera política.
|
b) |
a satisfação do rei com um jogo que visa sua morte é algo difícil de ser explicado.
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c) |
a alusão à morte presente no nome do jogo não foi compreendida pelo rei.
|
d) |
as origens do jogo de xadrez ainda precisam ser esclarecidas.
|
e) |
o próprio rei parecia desconhecer o funcionamento do jogo de xadrez.
|
O trecho “A razão de um rei se deliciar com a invenção de um jogo chamado ‘Morte ao rei’ é um mistério” sugere que é desconhecida a razão de um rei divertir-se com um jogo que propõe sua própria morte. Assim:
a) Incorreta. O mistério não reside nas regras, tampouco há referências à esfera política.
b) Correta. É um mistério o porquê de um rei ficar satisfeito com a existência de um jogo cujo objetivo é sua morte.
c) Incorreta. O rei entendeu que o objetivo do jogo era sua morte, e justamente ele gostar disso é que é um mistério.
d) Incorreta. A origem do jogo é persa, conforme relata o texto.
e) Incorreta. O rei conhecia o jogo de xadrez que visava à sua morte, e o mistério é o porquê de ele ficar satisfeito com isso.
Leia o soneto do poeta Luís Vaz de Camões (1525?-1580):
Sete anos de pastor Jacob servia
Labão, pai de Raquel, serrana bela;
mas não servia ao pai, servia a ela,
e a ela só por prêmio pretendia.
.
Os dias, na esperança de um só dia,
passava, contentando-se com vê-la;
porém o pai, usando de cautela,
em lugar de Raquel lhe dava Lia.
.
Vendo o triste pastor que com enganos
lhe fora assi negada a sua pastora,
como se a não tivera merecida,
.
começa de servir outros sete anos,
dizendo: “Mais servira, se não fora
para tão longo amor tão curta a vida”.
(Luís Vaz de Camões. Sonetos, 2001.)
De acordo com a história narrada pelo soneto,
a) |
Labão engana Jacob, entregando-lhe a filha Lia, em vez de Raquel.
|
b) |
Labão aceita ceder Lia a Jacob, se este lhe entregar Raquel.
|
c) |
Labão obriga Jacob a trabalhar mais sete anos para obter o amor de Lia.
|
d) |
Jacob descumpre o acordo feito com Labão, negando-lhe a filha Raquel.
|
e) |
e) Jacob morre antes de completar os sete anos de trabalho, não obtendo o amor de Raquel.
|
a) Correta. Segundo o texto, Labão, pai de Raquel, moça a quem Jacob amava e para cujo pai trabalhava a fim de receber em troca sua amada, engana o pretendente da filha e lhe entrega sua outra filha, Lia, obrigando Jacob a servir-lhe por ainda mais tempo, nutrindo-lhe a esperança de receber seu verdadeiro amor, Raquel.
b) Incorreta. Raquel e Lia são filhas de Labão e o pai cede Lia a Jacob, no lugar de Raquel, a quem o moço realmente amava.
c) Incorreta. A obrigação que Labão impeliu a Jacob foi a de trabalhar mais sete anos para obter o amor de Raquel, sua outra filha.
d) Incorreta. É Labão, pai de Raquel e de Lia, que descumpre o acordo com Jacob, negando-lhe sua filha Raquel e oferecendo-lhe Lia no lugar dela.
e) Incorreta. Jacob não morre, e sim começa a servir Labão por mais sete anos, além dos sete já servidos, na esperança de ter Raquel, filha de Labão.
Leia o soneto do poeta Luís Vaz de Camões (1525?-1580):
Sete anos de pastor Jacob servia
Labão, pai de Raquel, serrana bela;
mas não servia ao pai, servia a ela,
e a ela só por prêmio pretendia.
.
Os dias, na esperança de um só dia,
passava, contentando-se com vê-la;
porém o pai, usando de cautela,
em lugar de Raquel lhe dava Lia.
.
Vendo o triste pastor que com enganos
lhe fora assi negada a sua pastora,
como se a não tivera merecida,
.
começa de servir outros sete anos,
dizendo: “Mais servira, se não fora
para tão longo amor tão curta a vida”.
(Luís Vaz de Camões. Sonetos, 2001.)
Uma das principais figuras exploradas por Camões em sua poesia é a antítese. Neste soneto, tal figura ocorre no verso:
a) |
a) “mas não servia ao pai, servia a ela”
|
b) |
b) “passava, contentando-se com vê-la”
|
c) |
c) “para tão longo amor tão curta a vida”
|
d) |
d) “porém o pai, usando de cautela”
|
e) |
“lhe fora assi negada a sua pastora”
|
Antítese é uma figura de linguagem que aproxima termos ou expressões de sentidos opostos. Tal fenômeno é observado apenas na alternativa C, onde se lê “para tão longo amor tão curta a vida”, em que os adjetivos opostos “longo” e “curta” se aproximam textualmente. Em todas as outras alternativas, não se observa tal fenômeno de aproximação de termos opostos.
Leia o soneto do poeta Luís Vaz de Camões (1525?-1580):
Sete anos de pastor Jacob servia
Labão, pai de Raquel, serrana bela;
mas não servia ao pai, servia a ela,
e a ela só por prêmio pretendia.
.
Os dias, na esperança de um só dia,
passava, contentando-se com vê-la;
porém o pai, usando de cautela,
em lugar de Raquel lhe dava Lia.
.
Vendo o triste pastor que com enganos
lhe fora assi negada a sua pastora,
como se a não tivera merecida,
.
começa de servir outros sete anos,
dizendo: “Mais servira, se não fora
para tão longo amor tão curta a vida”.
(Luís Vaz de Camões. Sonetos, 2001.)
Do ponto de vista formal, o tipo de verso e o esquema de rimas que caracterizam este soneto camoniano são, respectivamente,
a) |
dodecassílabo e ABAB ABAB ABC ABC.
|
b) |
decassílabo e ABAB ABAB CDC DCD.
|
c) |
heptassílabo e ABBA ABBA CDE CDE.
|
d) |
decassílabo e ABBA ABBA CDE CDE.
|
e) |
dodecassílabo e ABBA ABBA CDE CDE.
|
Os versos camonianos são decassílabos, ou seja, compostos por dez sílabas poéticas, haja vista o fato de ser um soneto e pelo que se comprova por meio da escansão de versos aleatórios de cada estrofe:
Primeira estrofe
La / bão / pai / de / Ra / quel / ser / ra / na / be la
Segunda estrofe
Po / rém / o / pai / u / san / do / de / cau / te la
Terceira estrofe
Ven / do o / tris / te / pas / tor / que / com / en / ga nos
Quarta estrofe
Pa / ra / tão / lon / go a / mor / tão / cur / ta a / vi da
Além disso, o esquema de rimas se caracteriza pelas terminações de cada verso, simbolizadas cada uma com uma letra diferente do alfabeto. Assim:
Sete anos de pastor Jacob servia (A)
Labão, pai de Raquel, serrana bela; (B)
mas não servia o pai, servia a ela, (B)
e a ela só por prémio pretendia. (A)
Os dias, na esperança de um só dia, (A)
passava, contentando-se com vê-la; (B)
porém o pai, usando de cautela, (B)
em lugar de Raquel lhe dava Lia. (A)
Vendo o triste pastor que com enganos (C)
lhe fora assi negada a sua pastora, (D)
como se não a tivera merecida, (E)
Começa de servir outros sete anos, (C)
dizendo: Mais servira, se não fora (D)
pera tão longo amor tão curta a vida! (E)
Assim, a alternativa correta é a D.
Observação: dodecassílbado (alternativas A e E) seria o verso composto por 12 sílabas poéticas; heptassílabo (alternativa C) seria o verso composto por 7 sílabas poéticas.
Leia o seguinte texto do Pe. Antônio Vieira (1608-1697) para responder ao que se pede:
A primeira cousa que me desedifica, peixes, de vós, é que vos comeis uns aos outros. Grande escândalo é este, mas a circunstância o faz ainda maior. Não só vos comeis uns aos outros, senão que os grandes comem os pequenos.
[...] Santo Agostinho, que pregava aos homens, para encarecer a fealdade deste escândalo mostrou-lho nos peixes; e eu, que prego aos peixes, para que vejais quão feio e abominável é, quero que o vejais nos homens. Olhai, peixes, lá do mar para a terra. Não, não: não é isso o que vos digo. Vós virais os olhos para os matos e para o sertão? Para cá, para cá; para a cidade é que haveis de olhar. Cuidais que só os tapuias se comem uns aos outros, muito maior açougue é o de cá, muito mais se comem os brancos. Vedes vós todo aquele bulir, vedes todo aquele andar, vedes aquele concorrer às praças e cruzar as ruas: vedes aquele subir e descer as calçadas, vedes aquele entrar e sair sem quietação nem sossego? Pois tudo aquilo é andarem buscando os homens como hão de comer, e como se hão de comer.
[...]
Diz Deus que comem os homens não só o seu povo, senão declaradamente a sua plebe: Plebem meam, porque a plebe e os plebeus, que são os mais pequenos, os que menos podem, e os que menos avultam na república, estes são os comidos. E não só diz que os comem de qualquer modo, senão que os engolem e os devoram: Qui devorant. Porque os grandes que têm o mando das cidades e das províncias, não se contenta a sua fome de comer os pequenos um por um, poucos a poucos, senão que devoram e engolem os povos inteiros: Qui devorant plebem meam. E de que modo se devoram e comem? Ut cibum panis: não como os outros comeres, senão como pão. A diferença que há entre o pão e os outros comeres é que, para a carne, há dias de carne, e para o peixe, dias de peixe, e para as frutas, diferentes meses no ano; porém o pão é comer de todos os dias, que sempre e continuadamente se come: e isto é o que padecem os pequenos.
São o pão cotidiano dos grandes: e assim como pão se come com tudo, assim com tudo, e em tudo são comidos os miseráveis pequenos, não tendo, nem fazendo ofício em que os não carreguem, em que os não multem, em que os não defraudem, em que os não comam, traguem e devorem: Qui devorant plebem meam, ut cibum panis. Parece-vos bem isto, peixes?
(Antônio Vieira. Essencial, 2011.)
No sermão, Vieira critica
a) |
a) a preguiça desmesurada dos miseráveis. |
b) |
b) a falta de ambição dos miseráveis. |
c) |
c) a ganância excessiva dos poderosos. |
d) |
d) o excesso de humildade dos miseráveis. |
e) |
o excesso de vaidade dos poderosos. |
a) Incorreta. É nesta passagem que a referência aos “miseráveis” aparece claramente: “... e em tudo são comidos os miseráveis pequenos...”. Como se vê, a menção a eles, os plebeus, não tem como função destacar uma suposta postura preguiçosa, mas sim mostrá-los como alvo da ganância da elite.
b) Incorreta. O percurso argumentativo do texto constrói a evidente força da ambição dos poderosos, que engolem os “peixes menores” indiscriminadamente e sem trégua; nada é mencionado a respeito da ambição por parte do próprio povo.
c) Correta. O sermão de padre Vieira estabelece um paralelo entre o comportamento dos peixes e o dos homens: ambos “comem” uns aos outros e, mais importante ainda, “os grandes comem os pequenos”. Certamente o verbo “comer” aplicado à atitude ictíica assume sentido denotativo e, quando referente aos humanos, conotativo, e isso fica evidente principalmente no segundo parágrafo: “Diz Deus que comem os homens não só o seu povo, senão declaradamente a sua plebe: Plebem meam, porque a plebe e os plebeus, que são os mais pequenos [sic], os que menos podem, e os que menos avultam na república, estão são os comidos”. Percebe-se, desta passagem, que o agente de comer não é a plebe, mas os “peixes maiores”, a elite. Em seguida, fica também patente a ganância excessiva dessa classe: “Porque os grandes que têm o mando das cidades e das províncias, não [sic] se contenta a sua fome de comer os pequenos um por um, poucos a poucos, senão que devoram e engolem os povos inteiros”. A comparação, que vem logo em seguida, entre o hábito de se comer pão e o ato de se “comer o povo” é outro elemento que também mostra o excesso dos poderosos, na medida em que destaca a ausência de limites (os miseráveis “são o pão cotidiano dos grandes”).
d) Incorreta. Não há qualquer referência no texto acerca da humildade (presente ou ausente) da plebe.
e) Incorreta. O sentimento de vaidade fundamenta-se no desejo de um indivíduo de que suas qualidades sejam reconhecidas e admiradas por outras pessoas. Ele, portanto, é diferente do tema central do texto, a ambição, na medida em que esta não tem como fim a admiração, mas o sucesso, independentemente do julgamento alheio.