Leia alguns trechos do “Prefácio Interessantíssimo” de Pauliceia Desvairada, de Mário de Andrade, obra considerada marco do Modernismo brasileiro e publicada originalmente em julho de 1922.
Leitor:
Está fundado o Desvairismo.
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Este prefácio, apesar de interessante, inútil.
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Quando sinto a impulsão lírica escrevo sem pensar tudo o que meu inconsciente me grita. Penso depois: não só para corrigir, como para justificar o que escrevi. Daí a razão deste Prefácio Interessantíssimo.
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E desculpe-me por estar tão atrasado dos movimentos artísticos atuais. Sou passadista, confesso. Ninguém pode se libertar duma só vez das teorias-avós que bebeu; e o autor deste livro seria hipócrita se pretendesse representar orientação moderna que ainda não compreende bem.
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Não sou futurista (de Marinetti). Disse e repito-o. Tenho pontos de contato com o futurismo. Oswald de Andrade, chamando-me de futurista, errou. A culpa é minha. Sabia da existência do artigo e deixei que saísse. Tal foi o escândalo, que desejei a morte do mundo. Era vaidoso. Quis sair da obscuridade. Hoje tenho orgulho. Não me pesaria reentrar na obscuridade. Pensei que se discutiriam minhas ideias (que nem são minhas): discutiram minhas intenções.
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Um pouco de teoria?
Acredito que o lirismo, nascido no subconsciente, acrisolado num pensamento claro ou confuso, cria frases que são versos inteiros, sem prejuízo de medir tantas sílabas, com acentuação determinada.
(Mário de Andrade. Poesias completas, 2013.)
Mário de Andrade recorre à metalinguagem no seguinte trecho:
a) |
“Está fundado o Desvairismo.” |
b) |
“Não me pesaria reentrar na obscuridade.” |
c) |
“Este prefácio, apesar de interessante, inútil.” |
d) |
“Sabia da existência do artigo e deixei que saísse.” |
e) |
“Quis sair da obscuridade.” |
a) Incorreta. No trecho, Mário de Andrade, ironicamente, cria um neologismo para se referenciar aos movimentos de vanguarda criados em seu entorno, porém, nessa construção, não se volta para o exame do próprio código usado em seu texto, seja tal código a língua portuguesa escrita, seja o gênero prefácio – que escreve – e seus padrões formais.
b) Incorreta. No trecho, Mário de Andrade faz referência a si mesmo e sua reentrada na obscuridade, mas não faz referências à estrutura do gênero usado na escrita do texto ou à língua usada para escrevê-lo.
c) Correta. O texto da questão é um prefácio e, no trecho, Mário de Andrade, referencia-o, analisando-o em sua qualidade e utilidade. Ou seja, usa um prefácio para explicar sobre o próprio prefácio. Como a metalinguagem constitui a função da linguagem cuja característica é exatamente o uso dos códigos – da língua ou de aspectos e formatos de gêneros – para explicarem os próprios códigos, pode-se afirmar que ela ocorre nesse trecho.
d) Incorreta. Na frase, Mário de Andrade faz referência a um artigo lançado por Oswald de Andrade. Tal apontamento pode provocar distração por se tratar de uma referência a outro texto, contudo essa característica se constitui numa intertextualidade, e não em metalinguagem.
e) Incorreta. Como na alternativa ‘b’, no trecho, Mário de Andrade faz referência a si mesmo e sobre o fato de ter querido sair da obscuridade, mas não faz referências à estrutura do gênero usado na escrita do texto ou à língua usada para escrevê-lo.