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Questão 37 Unesp 2023 - 2ª fase

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Questão 37

Temas da Filosofia

O homem que não tem a menor noção da filosofia caminha pela vida afora preso a preconceitos derivados do senso comum, das crenças habituais da sua época e do seu país, e das convicções que cresceram na sua mente sem a cooperação ou o consentimento deliberado de sua razão. Para tal homem, o mundo tende a tornar-se finito, definido, óbvio. Ao contrário, quando começamos a filosofar, imediatamente nos damos conta de que mesmo as coisas mais vulgares levantam problemas para os quais só podemos dar respostas muito incompletas. A filosofia livra-nos da tirania do hábito.

(Bertrand Russell. Os problemas da filosofia, 1972. Adaptado.)


De acordo com o filósofo Bertrand Russell nesse excerto, o enfrentamento da “tirania do hábito” pela filosofia contribui para



a)

o descarte dos fundamentos da cosmogonia.

b)

o estabelecimento do ceticismo absoluto.

c)

a rejeição dos saberes tradicionais.

d)

a expansão das bases do conhecimento.

e)

a reprodução do discurso científico.

Resolução

Bertrand Russell é conhecido na história da filosofia pelos textos que escreveu para pensar e caracterizar o saber filosófico. O fez de forma brilhante, seja pela assertividade das palavras ou pela capacidade aguçada de contrapor a filosofia às ciências, ou mesmo a outras expressões do conhecimento humano. Por exemplo, em os "Problemas da Filosofia", obra do começo do século XX (mesma obra utilizada no exercício, embora seja de uma edição mais recente), Russell afirma que à filosofia cabe "o resto ", no sentido de dizer que o filósofo se questiona sobre tantos coisas que, exatamente por isso, valoriza mais o questionamento em si do que suas respostas, de tal modo que, quando as alcança, prefere continuar questionando e entrega as soluções que encontrou para outra pessoa, que formula, com tais soluções, área do saber própria, que se torna independente da filosofia. Mas é também nessa obra que afirma, conforme indica o texto, que "filosofar " amplia nossas bases de conhecimento. Nesse sentido: 

a) Incorreta. Ao filósofo não cabe o descarte de qualquer questão, seja ela de ordem cosmogônica ou de qualquer outro tipo. Como foi apontado acima, a atitude questionadora é própria da filosofia e deve se estender a qualquer área, até soluções plausíveis serem encontradas e, assim, se tornarem independentes da filosofia - nesse sentido, "mãe" de todas as ciências. Inclusive, a origem do cosmos foi a primeira área de estudo dessa disciplina, considerando sua história, que começa no Período Arcaico da Grécia Antiga, com Tales de Mileto, um cosmólogo. 
b) Incorreta. O ceticismo pode até ser um ponto de partida para o filósofo. O foi, por exemplo, para René Descartes, no sentido de utilizar certa "descrença" para ter um ponto de partida para a reflexão, ponto de partida seguro porque, justamente, questionado. Não está sendo dito, aqui, que a filosofia se encerra no ceticismo. Muito menos que Descartes foi um cético. Mas, isso sim, que o ceticismo pode ser um "instrumento ", no sentido de ser utilizado para o questionamento geral das coisas e o respectivo alcance do saber. É por esse motivo, inclusive, que esse ceticismo não pode ser "absoluto", como indica o item.
c) Incorreta. A rejeição dos saberes tradicionais não é uma condição necessária para a atitude filosófica. Ou seja, essa rejeição pode ou não acontecer, a depender da análise do contexto. Aliás, pode ser que, em dadas circunstâncias, o saber tradicional até ajude a filosofia, no sentido de ser um ponto de partida para a reflexão, o questionamento, a crítica ou outra característica do saber filosófico. 
d) Correta. Uma das principais consequências do encontro com a filosofia, sem dúvida, é a expansão das bases de conhecimento, no sentido de ampliação de horizontes, entendimento de novas perspectivas, aguçamento de análises e interpretações e afins. Não apenas Russel avaliou a filosofia assim, mas basicamente todos os pensadores da história dessa disciplina. 
e) Incorreta. A filosofia pode, por exemplo, questionar as bases do saber científico, seus argumentos e procedimentos metodológicos. A "filosofia da ciência " é a área da filosofia que se presta à tarefa em questão. Mas, isso é muito diferente do que afirma o item, quando diz "reprodução do discurso científico". Ora, se a filosofia reproduzisse tal discurso, ela seria ciência, não filosofia. O filósofo, então, tem seu discurso próprio, suas perguntas fundamentais, seu jeito de trabalho, seus conceitos e "jargões ".