Muitos escravos e libertos recorriam aos orixás para resolver diferentes tipos de problema. Aos poucos, a crença nos orixás foi se desenvolvendo e, no século XIX, deu origem ao Candomblé. Essa religião era formada por “irmãos de fé”, pessoas que acreditavam nos orixás e que se reuniam em torno de uma mesma casa ou terreiro. Nesse espaço, que era comandado por uma mãe de santo ou um pai de santo, além de realizar suas cerimônias religiosas, entrar em contato com seus deuses e buscar respostas por meio de jogos de adivinhação (como o jogo de búzios), muitos escravos e libertos conseguiram formar outra família, família essa que muito se assemelhava com as grandes linhagens existentes em diversas localidades africanas.
(Ynaê Lopes dos Santos. História da África e do Brasil afrodescendente, 2017.)
O texto caracteriza o Candomblé como
a) |
uma estratégia de recusa e resistência dos escravizados diante dos esforços de catequização empreendidos pelos jesuítas portugueses. |
b) |
uma tentativa de conciliar características de distintas religiosidades de matriz africana, como o politeísmo e as idolatrias. |
c) |
uma religião derivada de crenças de origem africana, que possibilitou o surgimento de espaços de sociabilidade e solidariedade entre escravizados. |
d) |
uma religião trazida da África e praticada no Brasil pelos escravizados como uma forma de manter contato com as origens e os antepassados. |
e) |
uma religião de matriz islâmica que permitia a unificação dos escravizados procedentes de diversas regiões da África. |
a) Incorreta. A alternativa é incorreta pois associa a formação do Candomblé à resistência dos escravizados diante da atuação dos jesuítas, sendo que esses direcionaram a catequese aos indígenas e não aos africanos escravizados. Os jesuítas eram os membros da Companhia de Jesus que estiveram presentes no Brasil colonial e formaram comunidades conhecidas como missões, nas quais os padres conviviam com os indígenas, ensinavam diversos ofícios e catequizavam-nos. Vale ressaltar também que as missões existiram somente até o século XVIII, enquanto o texto aborda já meados do século XIX, enfatizando que o Candomblé foi formado por “irmãos de fé”, sendo esses escravos e libertos que recorriam aos orixás.
b) Incorreta. O Candomblé não surgiu a paritir de uma tentativa de conciliar distintas religiosidades de matriz africana, mas sim uma manifestação religiosa considerada nova e brasileira. Devido às diversas guerras no território africano, o império Yoruba se desagregou e muitos nagôs (yorubas) foram escravizados e enviados para o Brasil. Nesse novo contexto, a formação do candomblé nagô, no século XIX,é compreendida como a formação de um novo território religioso desses povos e que amalgamou a identidade étnico-religiosa dos mesmos após o processo de diáspora. Além disso, o surgimento de tal religião não foi resultado de um processo utilitarista, conforme sugerido pela alternativa (uma tentativa de conciliar determinados aspectos religiosos), mas sim resultado de uma experiência de povos escravizados e seus descentes no Brasil.
c) Correta. Como já foi mencionado na alternativa anterior, a formação do Candomblé contou com forte influência da tradição nagô, embora a prática religiosa seja considerada nova e brasileira. Diferentemente de outras religiões de matriz africana, como os calundus e os acotudás, o Candomblé se organizava como uma “sociedade”: seus terreiros se consideravam como sociedade, ou seja, como uma organização religiosa que representava uma comunidade (um egbé) dentro de uma comunidade maior (a baiana). Os adeptos do Candomblé se vinculam a determinado espaço territorial (o terreiro) e passam a ter laços sociais a partir dessa vinculação comum. Vale ressaltar que os africanos escravizados passavam pelo processo de dessocialização, ao serem retirados de seu local de origem e terem seus laços efetivos e de convívio social rompidos. Nesse sentido, o processo de restabelecimento desses laços, bem como a integração eram partes cruciais da formação de uma comunidade religiosa. O indivíduo assumia um lugar dentro dessa pequena comunidade, o terreiro do candomblé, formada por afro-descentes e com regras comunitárias. A sociabilidade estabelecida contribuía para a sustentação desse espaço ritual e místico, sendo que a forma original social e religiosa de viver, eram em grande parte originárias da tradição iorubá e foram reelaboradas ao longo do processo histórico brasileiro.
d) Incorreta. O Candomblé não foi uma religião trazida da África, sendo considerada uma religião afro-brasileira. Trata-se de uma religião considerada como algo novo e brasileira, formada a partir de uma comunidade que se inventou e criou tradições, marcadas por uma forte influência étnico-religiosa iorubá. Seu panteão, por exemplo, foi formado a partir de escolhas criativas para uma adaptação a um novo meio, e não simplesmente uma reprodução de uma religião pré-existente.
e) Incorreta. O Candomblé não possui matriz islâmica. Conforme exposto acima, sua principal influência foram os nagôs.