Leia o poema “Pneumotórax”, do poeta Manuel Bandeira (1886-1968).
Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.
Mandou chamar o médico:
— Diga trinta e três.
— Trinta e três… trinta e três… trinta e três…
— Respire.
-----------------------------------------------------------------
— O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o
[pulmão direito infiltrado.
— Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
— Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
(Manuel Bandeira. Estrela da vida inteira, 1993.)
No poema, o poeta aborda,
a) |
em tom satírico, recorrendo à crítica social, vários sintomas da varíola, uma doença bacteriana erradicada no Brasil na década de 1980, graças às campanhas de vacinação, mas que reaparece em 2022 no país. |
b) |
em tom melancólico, recorrendo a coloquialismos, vários sintomas da tuberculose, uma doença bacteriana erradicada no Brasil desde a década de 1980, graças às campanhas de vacinação. |
c) |
em tom engajado, recorrendo ao sarcasmo, vários sintomas da varíola, uma doença de etiologia viral, cujo tratamento visa atenuar os sintomas, e que se previne com vacinação. |
d) |
em tom jocoso, recorrendo à autoironia, vários sintomas da tuberculose, uma doença bacteriana tratável com antibióticos e que se previne com vacinação. |
e) |
em tom fatalista, recorrendo ao humor ácido, vários sintomas da tuberculose, uma doença de etiologia viral, cujo tratamento visa atenuar os sintomas, e que se previne com vacinação. |
O poema aborda, de forma irônica e jocosa, os sintomas típicos da tuberculose, como as escavações nos pulmões, que são áreas onde ocorre a destruição do parênquima pulmonar, com a consequente perda de área de trocas gasosas; a tosse contínua, com sangue (hemoptise); edema pulmonar, além de outros sintomas inespecíficos, como febre e dispneia (sensação de falta de ar).
A doença em questão é causada por uma bactéria, Mycobacterium tuberculosis, popularmente conhecida coma bacilo de Koch. É uma doença para a qual existe vacina e tratamento medicamentoso, inclusive com antibióticos fornecidos gratuitamente pelo SUS. A vacina foi desenvolvida com o vírus vivo vaccínia, que é semelhante ao vírus da varíola, e confere imunidade contra este.
Atualmente, a varíola dos macacos vem causando infecções em humanos, inclusive com algumas mortes. Já existe vacina também para esta virose, e discute-se se as pessoas que já foram vacinadas contra varíola (como nos casos de algumas pessoas nascidas antes da década de 1970) seriam ou não imunes à infecção pela varíola dos macacos.
a) Incorreta. Não ocorre sátira no poema, mas autoironia, posto que o eu lírico, diante da fatalista resposta do médico, toma uma decisão inusitada: tocar um tango argentino. Ademais, a varíola tem como sintomas feridas na pele e mucosas, além de muitos sintomas inespecíficos, como febre e dores no corpo. Trata-se de uma doença viral que está erradicada no mundo todo desde o final do século passado.
b) Incorreta. Embora a situação descrita aponte para a morte iminente do eu lírico, não há a presença de melancolia no poema. A tuberculose nunca foi erradicada no Brasil, apesar de o número de casos ter diminuído significativamente após o advento dos antibióticos. De fato, a vacina tem importante papel nesta redução.
c) Incorreta. Não há, no poema, a presença de engajamento. Não somente, a varíola foi erradicada no mundo todo, e a vacinação foi grande aliada neste sentido. No entanto, os sintomas descritos no poema não condizem com varíola, e sim com tuberculose.
d) Correta. Publicado em 1930, o poema “Pneumotórax”, de Manuel Bandeira, apresenta um breve diálogo. Ao procurar um médico por problemas pulmonares, o eu lírico recebe tratamento superficial do profissional, que apenas lhe pede para repetir algumas palavras. Após uma pausa – marcada graficamente na estrutura do poema –, o médico aponta um diagnóstico (“O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado") sem, no entanto, oferecer qualquer tratamento ou solução para a enfermidade. Em seguida, o eu lírico sugere uma hipótese de tratamento, questionando o médico sobre a possibilidade de realização de um pneumotórax (emergência médica causada pela presença de ar entre as membranas que envolvem os pulmões, a qual pode ser solucionada por meio da remoção do excesso de ar). Mesmo diante de tal sugestão, o médico responde objetivamente “Não”. O eu lírico, embora esteja em um contexto tenso de pulsão de morte, lança mão do humor e da autoironia, afirmando que “A única coisa a fazer é tocar um tango argentino”. A partir dessa constatação, por meio de uma quebra de expectativa, o doente satiriza sua impossibilidade de cura e vislumbra um melhor aproveitamento da vida. Além disso, considere o comentário acima.
e) Incorreta. O eu lírico, ao deparar-se com a impossibilidade de cura, constata que “A única coisa a fazer é tocar um tango argentino”. Assim, não há tom fatalismo, mas resignação. Ademais, a tuberculose é causada por uma bactéria, e não por vírus. O tratamento promove a cura, além de atenuar sintomas.