O complexo de falar difícil
O que importa realmente é que o(a) detentor(a) do notável saber jurídico saiba quando e como deve fazer uso desse português versão 2.0, até porque não tem necessidade de alguém entrar numa padaria de manhã com aquela cara de sono falando o seguinte: "Por obséquio, Vossa Senhoria teria a hipotética possibilidade de estabelecer com minha pessoa uma relação de compra e venda, mediante as imposições dos códigos Civil e do Consumidor, para que seja possível a obtenção de 10 pãezinhos em temperatura estável para que a relação pecuniária no valor de R$ 5,00 seja plenamente legitima e capaz de saciar minha fome matinal?".
O problema é que temos uma cultura de valorizar quem demonstra ser inteligente ao invés de valorizar quem é. Pela nossa lógica, todo mundo que fala difícil tende a ser mais inteligente do que quem valoriza o simples, e 99,9% das pessoas que estivessem na padaria iriam ficar boquiabertas se alguém fizesse uso das palavras que eu disse acima em plenas 7 da manhã em vez de dizer: "Bom dia! O senhor poderia me vender cinco reais de pão francês?".
Agora entramos na parte interessante: o que realmente é falar difícil? Simplesmente fazer uso de palavras que a maioria não faz ideia do que seja é um ato de falar difícil? Eu penso que não, mas é assim que muita gente age. Falar difícil é fazer uso do simples, mas com coerência e coesão, deixar tudo amarradinho gramaticalmente falando. Falar difícil pode fazer alguém parecer inteligente, mas não por muito tempo. É claro que em alguns momentos não temos como fugir do português rebuscado, do juridiquês propriamente dito, como no caso de documentos jurídicos, entre outros.
ARAÚJO, H. Disponlvel em: www.diariojurista.com. Acesso em: 20 nov. 2021 (adaptado).
Nesse artigo de opinião, ao fazer uso de uma fala rebuscada no exemplo da compra do pão, o autor evidencia a importância de(a)
a) |
se ter um notável saber jurídico. |
b) |
valorização da inteligência do falante. |
c) |
falar difícil para demonstrar inteligência. |
d) |
coesão e da coerência em documentos jurídicos. |
e) |
adequação da linguagem à situação de comunicação. |
a) Incorreta. Para o autor, o saber jurídico tem sua importância limitada a contextos jurídicos, o que não se verifica no exemplo da compra do pão.
b) Incorreta. De acordo com a opinião expressa, de fato, a utilização uma linguagem rebuscada é comumente associada à inteligência do falante. No entanto, segundo o autor, tal hábito é equivocado, uma vez que “o problema é que temos uma cultura de valorizar quem demonstra ser inteligente ao invés de valorizar quem é”.
c) Incorreta. Na concepção do autor, a inteligência de um indivíduo não é medida pelo domínio de uma fala rebuscada, mas, sim, pela capacidade de adequar a variedade linguística utilizada à situação vivenciada.
d) Incorreta. A importância da coesão e da coerência não se resume apenas aos documentos jurídicos, mas a todas as situações, formais ou informais.
e) Correta. De acordo com o autor, deve-se usar uma linguagem rebuscada em ambientes e/ou contextos de fato formais, como no caso de documentos jurídicos. Em contextos informais, como em uma ida à padaria, deve-se adequar a linguagem usada, uma vez que, na concepção do autor, “o que importa realmente é que o(a) detentor(a) do notável saber jurídico saiba quando e como deve fazer uso desse português 2.0”.