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Questão 1 Unicamp 2023 - 2ª fase - dia 2

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Questão 1

Evolução Teorias evolutivas Aves Evidências da evolução Mesozoico Paleozoico Tectônica de placas

Retirado ilegalmente do Brasil em 1995, o fóssil do dinossauro Ubirajara jubatus, descoberto na Bacia do Araripe – na divisa dos estados do Ceará, Piauí e Pernambuco –, será repatriado da Alemanha. O fóssil – datado do período Cretáceo – serviu de base para a descrição da espécie, que viveu entre 110 e 115 milhões de anos atrás, tornando-se o dinossauro mais antigo da Bacia do Araripe.

(Adaptado de https://www.cnnbrasil.com.br/tecnologia/museu-alemao-tera-de-devolver-fossil-de-dinossauro-levado-ilegalmente-do-brasil/. Acesso em 8/8/2022.)


(Representação do dinossauro Ubirajara jubatus, Fonte: https://pt.wikipedia.org/ wiki/Ubirajara_jubatus. Acesso em 8/8/2022.)

 

a) O Ubirajara jubatus é um dinossauro que se destacava por seus adornos com elaboradas estruturas tegumentares. A espécie possuía monofilamentos delgados (uma forma rudimentar de penas) associados à base do pescoço – que aumentavam em comprimento ao longo da região dorsal – bem como prolongamentos semelhantes a fitas que presumivelmente emergiam dos ombros. Cite e explique uma possível importância dessas estruturas que possa ser associada ao sucesso evolutivo da espécie.

b) A história da Bacia do Araripe começa durante a fragmentação do supercontinente Gondwana. A Bacia do Araripe representa um dos principais afloramentos que permite o estudo dos fósseis do Cretáceo. Defina a deriva continental. Explique como fósseis encontrados na Bacia do Araripe podem auxiliar na comprovação da existência do supercontinente Gondwana.



Resolução

a) As penas são estruturas de origem epidérmica (anexo epidérmico), constituídas pela proteína beta-queratina e que se originam a partir de folículos inseridos na derme (tecido conjuntivo localizado abaixo da epiderme) da pele. As penas provavelmente evoluíram em um grupo de dinossauros bípedes e carnívoros conhecido como Theropoda (terópodes). Esse mesmo grupo deu origem, no período Jurássico, às aves, as quais, portanto, herdaram as penas dos seus ancestrais não-avianos. Existem evidências de que as penas poderiam ter surgido no ancestral comum de todos os dinossauros, ou até mesmo no ancestral dos arcossauros (grupo que inclui os crocodilos e os pterossauros, répteis voadores aparentados aos dinossauros).

As penas rudimentares, não ramificadas, presentes no Ubirajara jubatus provavelmente são estruturas que foram selecionadas ao longo da evolução devido ao seu papel de isolante térmico. Esse papel continua sendo desempenhado pelas plúmulas das aves atuais, as quais apresentam um arranjo de barbas e bárbulas especializado em proteger o animal contra a perda de calor, sendo penas especialmente importantes para os indivíduos juvenis (Figura 1), que substituem as plúmulas por rêmiges e rectrizes durante o desenvolvimento.

 

Figura 1: filhotes de cisne (Irlanda), nos quais se pode notar as plúmulas, penas especializadas em limitar a perda de calor.

 

A presença de penas nos dinossauros do clado dos terópodes reforça a hipótese de que as espécies desse grupo eram endotérmicas, ou seja, apresentavam a capacidade de gerar calor por meio do metabolismo, de modo a atingir e manter uma temperatura ótima ao funcionamento das células (homeotermia). As aves e mamíferos, animais endotérmicos atuais, possuem estruturas de isolamento térmico (penas e pelos, respectivamente) especializados, as quais auxiliam na manutenção da temperatura por limitar a perda de calor para o meio externo. As penas e os pelos realizam essa função por meio da manutenção de uma fina camada de ar quente próxima à pele, a qual impede as trocas de calor com o ambiente por convecção e limita as trocas por condução, uma vez que gases não são bons condutores de calor.

A endotermia conferiu aos terópodes, aves e mamíferos a capacidade de se manterem ativos durante o dia e a noite, bem como em ambientes quentes ou frios, permitindo a ocupação de novas áreas e aumentando a eficiência desses animais para a obtenção de alimento, para a fuga de predadores e para o encontro de parceiros.

As penas rudimentares ainda podem ter desempenhado outros dois papéis importantes para o U. jubatus: camuflagem, ou seja, a capacidade do animal em se assemelhar (no que se refere a cores e texturas) ao ambiente onde vive, de modo a não ser reconhecido por seus predadores; e atração de parceiros sexuais, devido à presença de cores chamativas, que permitissem o reconhecimento mútuo de fêmeas e machos, bem como a transmissão de um sinal confiável que indicasse a qualidade genética do macho.

Os prolongamentos semelhantes a fitas que emergiam dos ombros do U. jubatus parecem ter tido um papel importante para a atração de parceiros sexuais, um tipo de seleção sexual conhecido como seleção intersexual (escolha pela fêmea). Os adornos como os prolongamentos presentes no U. jubatus existem em diversas espécies de animais atuais, vertebrados e invertebrados, e permitem que o macho (de forma geral) possa ser reconhecido pelas fêmeas, as quais ainda podem escolher o macho com quem irão acasalar tomando como base as características de tais estruturas, como cor, forma, número e tamanho (Figuras 2 e 3). De acordo com o modelo dos bons genes, machos que possuem alelos que lhes conferem maior valor adaptativo (fitness), ou seja, machos que são mais capazes de sobreviver e se reproduzir, em geral, possuem adornos elaborados, informação esta que pode ser facilmente acessada pelas fêmeas durante os rituais de cortejo.

 

Figura 2: macho de ave do paraíso, com destaque para os filamentos da cauda, usados como display sexual.

 

Figura 3: macho de ave do paraíso (Parotia lawesii), om destaque para os filamentos da cabeça, usados como display sexual.

 

Os prolongamentos presentes no corpo do U. jubatus também poderiam apresentar outra função relevante para o sucesso adaptativo do animal: proteção contra predadores. Estruturas formadas por queratina podem apresentar dureza suficiente para serem usadas como "armas", como acontece atualmente com ouriços, equidnas (Figura 4), antílopes, caprinos e bovinos, cujos cornos, além da função de proteção, também podem ser utilizados pelos machos em disputas territoriais.

 

Figura 4: as equidnas, mamíferos monotremados, possuem pelos transformados em espinhos, que elas utilizam como defesa contra predadores.

 

b) A deriva continental é uma teoria formulada por Alfred Wegener, publicada em 1912 ("A Origem dos Continentes e Oceanos") e baseada em diversos argumentos que propõe que: os continentes não estão parados, e sim em constante movimento; há cerca de 250 milhões de anos, todos os continentes estiveram unidos em um único superbloco, chamado de Pangeia.

Um dos argumentos é morfológico, já que o litoral do Brasil e da costa ocidental da África possuem enorme semelhança, como um encaixe, além de haver também a concomitância de rochas de mesma idade, principalmente de sequências sedimentares, semelhantes no litoral do Brasil e da África.
Outro argumento são os estudos de fósseis de espécies filogeneticamente próximas que podem ser encontrados na África e no Brasil, e também em outras áreas do planeta. Mesmo que separadas por milhares de quilômetros, essas espécies aparentadas divergiram a partir de um ancestral comum e dessa maneira conclui-se que tiveram algum tipo de ligação territorial no passado. Outras evidências incluem o encontro de material glacial em áreas onde hoje há climas quentes, ou de reservas de carvão provenientes de florestas em áreas glaciais como a Antártida.

A Pangeia começa a se separar no fim da era Paleozoica, marcando o começo da era Mesozoica, há cerca de 180 milhões de anos. Essa separação resulta em dois blocos continentais: a Laurásia ao Norte e o Gondwana ao sul, sendo que esse último supercontinente é onde se encontra o atual território da América do Sul, África, Antártica e Índia. A separação entre África e Brasil efetivou-se no fim da era Mesozoica, no período Cretáceo, que marca o fim desta era e o começo da era Cenozoica (65 milhões de anos), quando o Oceano Atlântico já está inteiro formado, separando os territórios da América do Sul e África, continuando em seu processo de abertura, aumentando a sua distância cada vez mais entre os continentes. Dessa maneira, os fósseis encontrados na Bacia do Araripe auxiliam nos estudos que comprovam o movimento de separação entre os territórios e a evolução diferenciada em cada continente.


Figura 5: extraída de ​​​​​​ https://www.significados.com.br/pangeia/. Acesso em 12 de dezembro de 2022.