Logo UNICAMP

Questão 0 Unicamp 2022 - 2ª fase - dia 1 - Português, Inglês e Redação

Carregar prova completa Compartilhe essa resolução

Redação

Gêneros de Texto

REDAÇÃO PROPOSTA 1

Você tem 15 anos e tem conta em redes sociais desde os 13 anos. Há seis meses, contudo, seu número de seguidores quintuplicou e alcançou a marca de quase um milhão. Desde que se tornou um/a digital influencer, vários parentes e amigos passaram a alertar seus pais sobre os perigos de sua superexposição na internet, enfatizando a importância de eles (seus responsáveis legais) acompanharem todas as postagens e todos os comentários recebidos nas suas redes. Seus pais foram até mesmo aconselhados por alguns amigos a fecharem as contas que você mantinha, sob a alegação de que a atividade poderia configurar um tipo de trabalho infantil (isto é, uma atividade que envolve crianças com idade inferior a 16 anos). Outros não viram problema com a sua fama e até perguntaram se seus pais já tinham se informado sobre como “monetizar” os seus perfis.

Após refletir sobre essas opiniões divergentes, você decide escrever, em um de seus perfis, um extenso post (“textão”) a respeito. No seu texto, você a) narra a sua trajetória até se tornar digital influencer e b) relata suas impressões acerca dessa experiência, assumindo um posicionamento sobre o fato de crianças e adolescentes atuarem como digital influencers.

Para escrever seu post, leve em conta a coletânea de textos a seguir:

1. Cyberbullying é o bullying realizado por meio das tecnologias digitais. Pode ocorrer nas mídias sociais, plataformas de mensagens, plataformas de jogos e celulares. É o comportamento repetido, com intuito de assustar, enfurecer ou envergonhar aqueles que são vítimas. (Disponível em https://www.unicef.org/brazil/cyberbullying-o-que-eh-e-como-para-lo. Acessado em 13/09/2021.)

2. Apesar de a maior parte das plataformas exigir idade mínima de 13 anos para a criação de um perfil, não há um controle rígido, o que faz com que o acesso de crianças e adolescentes às redes sociais seja livre. E é justamente por isso que o papel das famílias e das escolas é crucial para protegê-los e conscientizá-los dos riscos da superexposição. A premissa de que as novas gerações “nascem sabendo” lidar com a tecnologia é totalmente enganosa e mascara a fragilidade delas perante os inúmeros riscos e perigos que as mídias sociais escondem. Os jovens precisam de controle parental, acompanhado de diálogo, para desenvolverem uma relação saudável com as redes. Controlar o uso não significa proibi-lo, mesmo porque o universo digital é parte fundante da cultura e sociabilidades juvenis contemporâneas. Entre os conteúdos deliberadamente nocivos e os construtivos, há uma gama imensa de riscos implicados, como os próprios comentários de estranhos – diversas plataformas, inclusive, já permitem que o usuário não receba mensagens de desconhecidos. (Adaptado de Mariana Mandelli, Morte de adolescente reacende debate sobre exposição digital. 05/08/2021. Disponível em https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2021/08/morte-de-adolescente-reacende-debate-sobre-exposicao-digital.shtml. Acessado em 13/09/2021.)

  3.

 

A. C.

Celebridade brasileira do YouTube que ficou conhecida por seu canal “Vida de Amy”, onde posta desafios, vídeos de brinquedos e vlogs, a adolescente A. C. ganhou mais de 550.000 inscritos e ainda foi reconhecida como a primeira YouTuber surda oralizada do Brasil.

Antes da Fama

Aos três meses, ela começou a ser treinada por fonoaudiólogos, e aprendeu a falar e escrever em português.

Curiosidades

Em julho de 2014, ela postou o vídeo “Novos presentes para minha boneca Reborn”, que teve mais de 4 milhões de visualizações logo depois de postado. (Texto adaptado. Imagem editada. Disponível em https://pt.famous birthdays.com/people/amanda-carvalho.html. Acessado em 20/11/2021.)

4. A ampliação do acesso de crianças e adolescentes a celulares, tablets e outras telas portáteis criou uma nova modalidade de trabalho infantil: os youtubers mirins. Nessa atividade, crianças e adolescentes gravam vídeos periodicamente em seus canais no YouTube e são remunerados por fabricantes de produtos para os quais fazem propagandas, ou são remunerados pela própria rede social, quando há anúncios inseridos ao longo do vídeo. A atividade é prejudicial tanto para a criança ou adolescente que mantém o canal, quanto para o público infantojuvenil que o assiste. A advogada do Programa Criança e Consumo do Instituto Alana, Livia Cattaruzzi, lista o consumismo e o materialismo, a diminuição de brincadeiras criativas, a obesidade infantil, a erotização precoce, a violência e a segregação de gênero como algumas consequências da exposição à publicidade infantil. (Adaptado de Cristina Sena, Matéria originalmente publicada no site do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI). Disponível em https://livredetrabalhoinfantil.org.br/noticias/reportagens/youtubers-mirins-forum-nacional-discute-nova-modalidade-detrabalho-infantil/. Acessado em 11/09/2021.)

REDAÇÃO PROPOSTA 2

Você é um/a jovem que está cursando o seu segundo ano de graduação em Geografia, na Unicamp. Entusiasmado/a com a possibilidade de estrear na pesquisa acadêmica, você submeteu seu projeto de Iniciação Científica (IC) para uma agência brasileira de fomento à pesquisa. Após análise da comissão avaliadora, seu projeto de pesquisa foi aprovado por mérito, mas não obteve o financiamento desejado. Motivo: o corte de verbas no orçamento destinado à ciência e à pesquisa no Brasil em 2021.

Você, que tem se mostrado um/a universitário/a brilhante, com um currículo invejável, sente-se indignado/a com a impossibilidade de desenvolver sua pesquisa científica sem o necessário investimento. Decide, então, se unir a outros jovens pesquisadores brasileiros que vivenciaram a mesma experiência frustrante para escrever um manifesto, de autoria coletiva, a ser lido na reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Nesse texto, vocês a) apontam o corte de verbas destinadas à ciência e à pesquisa no Brasil, b) denunciam os consequentes prejuízos desses cortes e c) convocam a comunidade científica para o repúdio a essa política de sucateamento da ciência e da pesquisa em curso no Brasil atual.

Iniciação Científica (IC) é uma modalidade de pesquisa acadêmica desenvolvida por alunos de graduação nas universidades brasileiras em diversas áreas do conhecimento. Os alunos desenvolvem seu projeto de pesquisa (coletivo ou individual), acompanhados por um professor orientador, que pode estar ligado ou não a um laboratório de pesquisa ou a algum centro de pesquisa financiador (por exemplo: CAPES, CNPq, PIBIC, FAPESP etc.). Desde 2016, o valor da bolsa de iniciação científica varia de R$ 400 a R$ 700 mensais aproximadamente, a depender da agência de fomento. (Adaptado de https://pt.m.wikipedia.org. Acessado em 25/10/2021.)

Para escrever seu manifesto, leve em conta a coletânea de textos a seguir:

1. A bióloga Thabata Cavalcanti dos Santos, 27 anos, faz mestrado na Universidade Federal do Ceará (UFC). Ela ingressou no curso em 2021, ciente das dificuldades que iria encontrar em tempos da pandemia da Covid-19, mas não achou que seria tão difícil a ponto de pensar em desistir. A estudante sabe que sua trajetória profissional é fruto de anos de investimento de recursos públicos. Foi aluna da escola pública e entrou na universidade por meio da lei de cotas. “Sempre agarrei as oportunidades com todas as minhas forças. Mas vejo que o que demorou anos e anos para o país construir, na área de ciências, está sendo destruído na canetada por um Governo”, afirma. Sem incentivo financeiro para pesquisa, ela não consegue vislumbrar um futuro. Relatos como o de Thabata Santos são comuns hoje na área de ciências do Brasil. “Hoje formamos profissionais para trabalhar no exterior”, lamenta Denise Freire, pró-reitora de pós-graduação e pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Freire lembra que são necessários anos de investimentos públicos em educação básica, saúde, universidade, mestrado e doutorado. E no momento em que o profissional está pronto para começar a dar retorno ao país, ele precisa sair de sua área de atuação em busca de oportunidades. “Temos fuga de cérebro para trabalhos precarizados. Estamos entregando de mão beijada um patrimônio nacional.” (Adaptado de Regiane Oliveira, Pesquisadores se formam para trabalhar no exterior sob desmonte da ciência nacional. 08/11/2021. Disponível em https://brasil.elpais.com/brasil/2021-11-08/pesquisadores-se-formam-para-trabalhar-no-exterior-sob-desmonte-da-ciencia-nacional.html?utm_medium=Social &utm_source=Twitter&ssm=TW_BR_CM#Echo box=1636379412. Acessado em 21/11/2021.)

2. 

(Adaptado de Herton Escobar, Orçamento 2021 condena ciência brasileira a “estado vegetativo”. 29/01/2020. Disponível em https://jornal.usp.br/universidade/politicas-cientificas/orcamento2021-coloca-ciencia-brasileira-em-estado-vegetativo/. Acessado em 25/11/2021.)

3. 

(Disponível em https://horadopovo.com.br/manifestantesrepudiam-em-todo-o-pais-os-cortes-na-ciencia-feitos-porbolsonaro/. Acessado em 03/12/2021.)

4.  Nos últimos anos, a ciência brasileira tem sido alvo de repetidos cortes orçamentários. Esses cortes ameaçam projetos científicos e tecnológicos que estão em andamento, como também projetos futuros, o que inclui o financiamento de bolsas de estudo para jovens pesquisadores que estão no início da carreira científica. No Brasil, jovens pesquisadores em programas de mestrado e doutorado ganham, respectivamente, uma bolsa de estudos de R$ 1.500 e R$ 2.200 mensais, e esses valores não são ajustados desde 2013. Com a alta dos preços de produtos e serviços, o poder de compra das bolsas diminuiu em mais de 60%. A maioria dos estudantes depende exclusivamente dessa renda mensal para manter sua alimentação, saúde, moradia, vestimenta e transporte. Em muitos casos, ainda dão suporte no sustento da família. Como jovens pesquisadores brasileiros, nós exigimos suporte financeiro adequado. Se o Brasil não reavaliar imediatamente seu orçamento para ciência e tecnologia, o país corre o risco de perder toda uma geração de cientistas brasileiros. (Adaptado de texto de manifesto coletivo, intitulado Sobrevivendo como um jovem pesquisador no Brasil. Traduzido de Surviving as a young scientist in Brazil. Disponível em https://www.science.org/doi/10.1126/science.abm8160. Acessado em 21/11/2021.)

Você deverá escolher apenas UMA das propostas para desenvolver. Não se esqueça de marcar a proposta escolhida na folha de resposta reservada para a Redação.



Comentários

Proposta 1

Neste ano, a Unicamp apresentou aos alunos a possibilidade de trabalhar com dois gêneros que já haviam sido cobradas em vestibulares anteriores. O universo dos gêneros produzidos na internet - como o post da proposta 1 - já havia aparecido em 2011 e 2012, a partir de propostas de escrita de comentários, e, mais recentemente, em 2019, com uma postagem. Já o manifesto – proposta 2 – foi uma das alternativas do vestibular de 2012.

Tal fato demonstra que os candidatos podem e devem se preparar para a prova estudando os vestibulares anteriores, afinal, considerando-se o efeito surpresa gerado pelas propostas de redação da Unicamp (uma vez que o candidato descobre os gêneros apenas quando a prova se inicia), um candidato que já tenha alguma familiaridade com os gêneros em questão pode se sentir mais confortável e seguro. Contudo, vale ressaltar que decorar características formais ou tentar reproduzir fórmulas de textos outrora bem-sucedidos não é estratégia válida para a produção de nenhuma redação, muito menos no caso da prova de redação da Unicamp, pois cada contexto comunicativo – detalhado pelos enunciados de cada proposta – gera necessidades específicas, que precisam ser atendidas de modo particular.

O post de 2022, por exemplo, coloca o candidato na pele de um(a) adolescente, influenciador digital, que se vê instigado a refletir e a escrever sobre sua própria atividade nas redes sociais. Dado que o enunciador tem um número exorbitante de seguidores, seus pais passam a ser alertados por pessoas próximas sobre os malefícios da superexposição e são aconselhados a tutelarem o jovem em sua utilização da internet; já outros, além de não verem problema na situação, enxergam nela a possibilidade de os pais lucrarem com o conteúdo postado pelo jovem. Diante dessa divisão de posicionamentos, o influenciador decide expor sua própria opinião por meio de um “textão”, conforme explicado pela própria prova, o que já revela a possibilidade de um texto com marcas de informalidade, mas adequado à norma-padrão.

Para expor seu ponto de vista a seus interlocutores, que podem ser seus seguidores e outros eventuais leitores – afinal um texto publicado na internet costuma ter uma circulação muito ampla – o digital influencer precisa contar sua história até o momento em que se torna um influenciador (e para tanto poderia utilizar o texto III, que conta a história do canal “Vida de Amy”, como inspiração), descrever suas impressões com essa atividade e defender uma posição sobre o fato de haver crianças e adolescentes que se tornam influenciadores.

A coletânea oferece uma série de recursos para que tal propósito seja cumprido, pois o candidato, a partir do texto I, teria a possibilidade de discorrer sobre algum caso de cyberbullying que tenha vivenciado ou testemunhado e alertar sobre esse risco. O texto II poderia inspirar uma reflexão e/ou o relato de uma experiência sobre o controle parental, mostrando como isso pode ser necessário para que o jovem seja resguardado dos perigos digitais. O texto IV, por sua vez, oferece subsídios para uma análise sobre os malefícios da monetização do conteúdo produzido por jovens influenciadores que, dentre outras coisas, incentiva o consumismo para os seguidores e para o próprio jovem.

Em resumo, o candidato poderia fazer uma série de paralelos entre os excertos que compõem a coletânea, de modo a contar sua história e, a partir de suas experiências, revelar seu posicionamento sobre o assunto. Uma vez que o enunciador proposto é um jovem influenciador digital com milhões de seguidores, não é de se estranhar que ele defenda que crianças e/ou adolescentes possam ocupar esse espaço, contudo, era necessário demonstrar criticidade em relação aos malefícios individuais e coletivos desse tipo de atividade, além de refletir sobre o papel dos pais, da sociedade e das próprias mídias digitais na diminuição dos impactos negativos que uma exposição precoce à internet pode proporcionar.

Proposta 2

Já a proposta 2 coloca o candidato no papel de um universitário – estudante de geografia – que se vê às voltas com os percalços enfrentados pela ciência brasileira especialmente no último ano, o que o compele à escrita de um manifesto. Vale ressaltar, entretanto, que diferentemente do contexto anterior – quando a enunciação levava em consideração o caso de uma pessoa em específico – nesse novo contexto, a coletividade assume a voz textual, pois o estudante não falará apenas por si mesmo, mas por todos os jovens pesquisadores que enfrentaram situações análogas à enfrentada por ele. Sendo assim, o caráter coletivo do manifesto poderia proporcionar um texto escrito a partir da 1ª pessoa do plural (nós). Ainda em relação à interlocução, há outra diferença entre a proposta 1 e a 2, dado que no primeiro caso, o influenciador escreve a seguidores e leitores genéricos, mas, no segundo, o manifesto deve ser dirigido aos participantes da reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

Em relação ao gênero, o tom de protesto de um manifesto corresponde de forma bastante adequado ao item “c” da proposta, uma vez que, ao redigir a convocatória, o candidato acaba por configurar o que é a função ordinária de um manifesto – congregar pessoas em torno de uma causa. Essa observação é necessária para que o candidato compreenda que a leitura é base para a construção de qualquer gênero cobrado pela prova da Unicamp e que, ainda que ele nunca tivesse tido contato com um manifesto, ao compreender a necessidade comunicativa posta em jogo, ele conseguiria cumprir com o gênero solicitado.

Sobre os demais comandos de prova - assim como na proposta 1 - o vestibulando atento à coletânea encontraria todos os subsídios necessários para desenvolvê-los. O item “a” (“apontam o corte de verbas destinadas à ciência e à pesquisa no Brasil”), por exemplo, é respaldado pelo texto II, que demonstra com riqueza de detalhes, a partir de dados numéricos, o corte de verbas que precisa ser apontado como ponto de partida para a contextualização do desmonte da ciência brasileira. O item “b” (“denunciam os consequentes prejuízos desses cortes”), por sua vez, está embasado pelo texto II, que descreve exatamente as consequências dos cortes, a saber: a fuga de cérebros para o exterior e para trabalhos que não proporcionam o desenvolvimento científico, e a perda de recursos públicos investidos na formação de um pesquisador que, no futuro, provavelmente não terá condições de atuar em sua área. Por fim, retomando o item “c” (“convocam a comunidade científica para o repúdio a essa política de sucateamento da ciência e da pesquisa em curso no Brasil atual”), nota-se que a fotografia reproduzida do periódico “Hora do Povo” pode funcionar como inspiração para a criação do tom de convocação e de repúdio contras as recentes ações do governo federal que ameaçam a pesquisa científica brasileira.

O último excerto – texto IV – merece uma observação especial, pois, diferentemente do que costuma aparecer na coletânea, é trecho de um manifesto, exatamente o gênero solicitado pela prova. Sendo assim, o trecho poderia servir como norte para a produção de um projeto de texto autoral por parte do candidato. Além disso, o manifesto “Sobrevivendo como um jovem pesquisador no Brasil” poderia também ser aproveitado para a produção do item “b”, já que apresenta outra consequência do corte de verbas da ciência brasileira, que é a precarização da vida dos pesquisadores que, a despeito dos desmandos governamentais, seguem o propósito de se dedicarem à ciência brasileira.

Por fim, resta observar que a prova foi bastante coerente e combativa, seguindo o que tem sido feito nos últimos anos pelo vestibular da Unicamp.