Largo em sentir, em respirar sucinto,
Peno, e calo, tão fino, e tão atento,
Que fazendo disfarce do tormento
Mostro que o não padeço, e sei que o sinto.
O mal, que fora encubro, ou que desminto,
Dentro no coração é que o sustento:
Com que, para penar é sentimento,
Para não se entender, é labirinto.
Ninguém sufoca a voz nos seus retiros;
Da tempestade é o estrondo efeito:
Lá tem ecos a terra, o mar suspiros.
Mas oh do meu segredo alto conceito!
Pois não me chegam a vir à boca os tiros
Dos combates que vão dentro no peito.
Gregório de Matos e Guerra
No soneto, o eu lírico:
a) |
expressa um conflito que confirma a imagem pública do poeta, conhecido pelo epíteto de “o Boca do Inferno”. |
b) |
opta por sufocar a própria voz como estratégia apaziguadora de suas perturbações de foro íntimo. |
c) |
explora a censura que o autor sofreu em sua época, ao ser impedido de dar expressão aos seus sentimentos. |
d) |
estabelece, nos tercetos, um contraponto semântico entre as metáforas da natureza e da guerra. |
e) |
revela-se como um ser atormentado, ao mesmo tempo que omite a natureza de seu sofrimento. |
a) Incorreta. O epíteto de "Boca do Inferno" deve-se aos poemas satíricos e eróticos produzidos por Gregório de Matos. Nesse caso, trata-se de um soneto lírico reflexivo.
b) Incorreta. O sufocamento da voz do eu lírico não é capaz de apaziguar as suas perturbações íntimas, apenas impede que sejam exteriorizadas, como verificamos nos versos "O mal, que fora encubro, ou que desminto, / Dentro no coração é que o sustento:".
c) Incorreta. O poema não faz menção à censura sofrida por Gregório de Matos; as desavenças que o poeta enfrentou foram devido à sua poesia satírica, não por conta de poemas líricos.
d) Incorreta. Tanto a natureza quanto a guerra são apresentadas, nos tercetos, como ruidosas: a tempestade provoca estrondo que ecoa na terra e faz o mar suspirar; da mesma forma, a guerra é marcada pelos tiros dos combates. O contraponto se estabelece entre esses ruídos (da natureza e da guerra) e o sofrimento interno do eu-lírico, uma vez que ele não expressa seus sentimentos em queixas e lamentos.
e) Correta. Ao longo do soneto, o eu lírico revela-se atormentado por meio de expressões como "peno" (sofro), "tormento", "O mal [...] dentro do coração é que o sustento" e "combates que vão dentro do peito". No entanto, não revela, em seus versos, a natureza desse sofrimento; ou seja, não sabemos por que ele está atormentado.