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Questão 5 Unesp 2022 - 1ª fase - dia 2

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Questão 5

textos literários conotação

Para responder às questões de 02 a 08, leia o trecho do drama Macário, de Álvares de Azevedo.

MACÁRIO (chega à janela): Ó mulher da casa! olá! ó de casa!

UMA VOZ (de fora): Senhor!

MACÁRIO: Desate a mala de meu burro e tragam-ma aqui...

A VOZ: O burro?

MACÁRIO: A mala, burro!

A VOZ: A mala com o burro?

MACÁRIO: Amarra a mala nas tuas costas e amarra o burro na cerca.

A VOZ: O senhor é o moço que chegou primeiro?

MACÁRIO: Sim. Mas vai ver o burro.

A VOZ: Um moço que parece estudante?

MACÁRIO: Sim. Mas anda com a mala.

A VOZ: Mas como hei de ir buscar a mala? Quer que vá a pé?

MACÁRIO: Esse diabo é doido! Vai a pé, ou monta numa vassoura como tua mãe!

A VOZ: Descanse, moço. O burro há de aparecer. Quando madrugar iremos procurar.

OUTRA VOZ: Havia de ir pelo caminho do Nhô Quito. Eu conheço o burro...

MACÁRIO: E minha mala?

A VOZ: Não vê? Está chovendo a potes!...

MACÁRIO (fecha a janela): Malditos! (atira com uma cadeira no chão)

O DESCONHECIDO: Que tendes, companheiro?

MACÁRIO: Não vedes? O burro fugiu...

O DESCONHECIDO: Não será quebrando cadeiras que o chamareis...

MACÁRIO: Porém a raiva... [...]

O DESCONHECIDO: A mala não pareceu-me muito cheia. Senti alguma coisa sacolejar dentro. Alguma garrafa de vinho?

MACÁRIO: Não! não! mil vezes não! Não concebeis, uma perda imensa, irreparável... era o meu cachimbo...

O DESCONHECIDO: Fumais?

MACÁRIO: Perguntai de que serve o tinteiro sem tinta, a viola sem cordas, o copo sem vinho, a noite sem mulher – não me pergunteis se fumo!

O DESCONHECIDO (dá-lhe um cachimbo): Eis aí um cachimbo primoroso. [...]

MACÁRIO: E vós?

O DESCONHECIDO: Não vos importeis comigo. (tira outro cachimbo e fuma)

MACÁRIO: Sois um perfeito companheiro de viagem. Vosso nome?

O DESCONHECIDO: Perguntei-vos o vosso?

MACÁRIO: O caso é que é preciso que eu pergunte primeiro. Pois eu sou um estudante. Vadio ou estudioso, talentoso ou estúpido, pouco importa. Duas palavras só: amo o fumo e odeio o Direito Romano. Amo as mulheres e odeio o romantismo.

O DESCONHECIDO: Tocai! Sois um digno rapaz. (apertam a mão)

MACÁRIO: Gosto mais de uma garrafa de vinho que de um poema, mais de um beijo que do soneto mais harmonioso. Quanto ao canto dos passarinhos, ao luar sonolento, às noites límpidas, acho isso sumamente insípido. Os passarinhos sabem só uma cantiga. O luar é sempre o mesmo. Esse mundo é monótono a fazer morrer de sono.

O DESCONHECIDO: E a poesia?

MACÁRIO: Enquanto era a moeda de ouro que corria só pela mão do rico, ia muito bem. Hoje trocou-se em moeda de cobre; não há mendigo, nem caixeiro de taverna que não tenha esse vintém azinhavrado¹. Entendeis-me?

O DESCONHECIDO: Entendo. A poesia, de popular tornou-se vulgar e comum. Antigamente faziam-na para o povo; hoje o povo fá-la... para ninguém...

(Álvares de Azevedo. Macário/Noite na taverna, 2002.)

1azinhavrado: coberto de azinhavre (camada de cor verde que se forma na superfície dos objetos de cobre ou latão, resultante da corrosão destes quando expostos ao ar úmido)


Observa-se expressão empregada em sentido figurado na seguinte fala:



a)

“MACÁRIO: Não vedes? O burro fugiu…”

b)

“A VOZ: Não vê? Está chovendo a potes!…”

c)

“A VOZ: Descanse, moço. O burro há de aparecer. Quando madrugar iremos procurar.”

d)

“O DESCONHECIDO: Não será quebrando cadeiras que o chamareis…”

e)

“A VOZ: Mas como hei de ir buscar a mala? Quer que vá a pé?

Resolução

a) Incorreta. A expressão “o burro fugiu”, na fala apontada, é literal, o animal havia realmente escapado, por isso não pode ser lida como tendo um sentido figurado.

b) Correta. A expressão “chovendo a potes” está empregada em sentido figurado, uma vez que deve ser compreendida como “chovendo muito/intensamente”.

c) Incorreta. Não há na fala destacada nenhuma expressão que possa ser lida em sentido figurado.

d) Incorreta. Quando o personagem diz “quebrando cadeiras”, ele está fazendo uma referência ao que havia, de fato, acontecido: Macário havia atirado uma cadeira ao chão depois de notar que seu burro havia fugido. Portanto, essa fala não pode ser compreendida em seu sentido figurado.

e) Incorreta. A expressão “buscar a mala” é empregada em seu sentido literal, assim como “vá (ir) a pé”, que, embora seja uma expressão bastante comum no cotidiano e pudesse ser lida como uma expressão idiomática, deve ser compreendida, nesse contexto, literalmente e não figurativamente.