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Questão 37 Unesp 2022 - 1ª fase - dia 2

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Questão 37

Doutrinas Sociais do Século XIX Anarquismo

Se eu tivesse que responder à seguinte pergunta: O que é a escravatura? e respondesse sem hesitar: É o assassínio, o meu pensamento ficaria perfeitamente expresso. Não precisarei de fazer um grande discurso para mostrar que o poder de privar o homem do pensamento, da vontade e da personalidade, é um poder de vida e morte e que fazer de um homem escravo equivale a assassiná-lo. Por que, então, a essa outra pergunta: O que é a propriedade? não posso responder simplesmente: É o roubo, ficando com a certeza de que me entendem, embora esta segunda proposição não seja mais que a primeira, transformada?

(Pierre Joseph Proudhon. O que é a propriedade?, 1975.)

O texto, escrito em 1840, expressa uma posição



a)

anarquista, de crítica ao direito de propriedade e de defesa do valor supremo da liberdade.

b)

comunista, de crítica à burguesia e de defesa da revolução social como forma de construir um Estado proletário.

c)

liberal, de defesa do direito de propriedade e de crítica às desigualdades sociais.

d)

positivista, de crítica à falta de ordem social e de defesa de ações voltadas ao progresso.

e)

marxista, de defesa da eliminação da propriedade privada e de crítica ao regime de trabalho assalariado.

Resolução

O texto citado é de autoria de Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865), pensador central tanto para o chamado socialismo utópico quanto para o desenvolvimento das ideias anarquistas ao longo do século XIX. O autor francês, por meio de obras como O Que é a Propriedade? (1840), da qual o excerto escolhido para a questão faz parte, realiza uma defesa apaixonada da liberdade, propondo um pensamento social que o colocou em choque tanto com as autoridades europeias de sua época quanto com pensadores contemporâneos, como os propositores do socialismo científico, que criticaram o seu pensamento como sendo utópico e romântico. Porém, algumas de suas ideias seriam retomadas pelas correntes anarquistas e por pensadores como Mikhail Bakunin (1814-1876) e Piotr Kropotkin (1842-1921). 

a) Correta. Embora as ideias anarquistas ganhem corpo após a atividade de Proudhon, seus escritos e seu ativismo foram fundamentais para a formação dessa corrente de pensamento, que se contrapõe a toda forma de autoridade - como o Estado - e advoga pela ação direta e pela liberdade, questionando noções tradicionais da sociedade burguesa europeia, como a propriedade. No trecho citado, Proudhon levanta uma questão que seria trabalhada intensamente pelos anarquistas, que é a crítica da propriedade. Para o pensador francês, a propriedade é uma fonte de injustiça e sua posse concentrada em poucas mãos significaria retirar de um número expressivo de pessoas o direito à terra, ao trabalho e, em última instância, à própria liberdade individual. Dessa forma, Proudhon realiza uma comparação com a escravidão, dizendo que escravizar um homem equivale a assassiná-lo, já que esse indivíduo perderia a autonomia e a dignidade humana, seria uma criatura sem liberdade. Porém, o autor realiza também uma provocação à sociedade de sua época, afirmando que, ao se referenciar à escravidão como assassinato, ele poderia ser perfeitamente compreendido, mas que, ao usar a mesma lógica argumentativa transportada ao assunto da propriedade, precisaria se explicar com muito mais detalhes, já que o direito à propriedade representa algo tão arraigado na sociedade europeia após a Idade Moderna que o indivíduo europeu teria dificuldade em engendrar uma crítica a esse conceito.  

b) Incorreta. O pensamento de Proudhon entra em desacordo com os comunistas - ou socialistas científicos - por conta de sua crítica a uma atividade centralizadora, como o Estado e a organização partidária. Dessa forma, para o autor, a revolução proletária também seria uma solução autoritária da qual desconfiava, bem como da formação de um Estado proletário como caminho de transição para a sociedade sem classes proposto pelo pensamento comunista.

c) Incorreta. O pensamento liberal parte de uma defesa do direito à propriedade e pode apresentar críticas a desigualdade social, porém, não liga a existência da propriedade com a desigualdade social, que é o que defende o pensamento proudhoniano.

d) Incorreta. Proudhon não interpretava a sociedade da mesma forma linear própria dos positivistas, que argumentavam em favor de um progresso constante da sociedade. Para o autor francês, o necessário era uma ruptura com muitas das estruturas existentes no contexto em que vivia, e não apenas um reordenamento social em torno de uma noção de ordem - algo que ele poderia julgar autoritário - que poderia, de forma etapista, levar a um alavancamento do progresso.

e) Incorreta. Apesar de Proudhon ter tido inicialmente uma relação amistosa com Karl Marx, o pensador alemão tornou-se um grande crítico de suas ideias, notadamente a partir do livro Miséria da Filosofia (1847), que responde diretamente à obra de Proudhon intitulada Sistema de Contradições Econômicas ou Filosofia da Miséria (1846). Marx e os que compartilhavam de suas ideias julgavam o pensamento prodhoniano utópico e pouco voltado para as mudanças revolucionárias no contexto do capital e do trabalho e na estrutura política como um todo. Dessa forma, há um afastamento entre Prodhon e os marxistas. Ambos criticam a propriedade, mas os marxistas propõem a sua superação com um argumento revolucionário que Proudhon julga tendendo ao autoritarismo. A mesma falta de acordo encontra-se nas possibilidades de modificação do sistema de trabalho. O fato de o trabalho ser assalariado não é um problema em si; o que se identifica como necessário de mudança, principalmente para o pensamento marxista, é a existência da mais-valia, ou seja, de tempo de trabalho não pago, fazendo com que o trabalhador receba um valor equivalente a menos do que efetivamente produziu.