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Questão 49 Unicamp 2022 - 1ª fase

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Questão 49

Crise do Século XIV

Giacomo Borlone de Buschis, O triunfo da morte a reunião dos três vivos e dos três mortos. Parte superior de afresco na cidade de Clusone (Itália), século XV

Na Europa medieval cristã, prevalecia a ideia de que a morte era a transição para uma vida espiritual plena. Os ritos fúnebres buscavam assegurar uma passagem organizada para esse outro plano e evita-se mostrar o processo de decomposição dos corpos. A chegada da peste negra rompeu com essa concepção. De acordo com a historiadora Juliana Schmitt, a doença deixava marcas no corpo, as pessoas morriam de repente, algumas em locais públicos. A ideia apaziguadora da morte, na concepção cristã, foi substituída pela ideia de morte caótica, causada pela peste. As imagens cotidianas relacionadas ao surto da doença passaram a ser reapresentadas no campo das imagens e na literatura, no que hoje se conhece como “estética macabra”. O que caracteriza as obras macabras é a ênfase dada aos processos de decomposição do corpo. A estética é anterior ao período medieval, mas foi impulsionada pela peste negra.

(Adaptado de Christina Queiroz, Pandemia como alegoria. Revista Pesquisa Fapesp. Edição 294. ago. 2020.)

Com base na imagem e no excerto, assinale a alternativa correta:



a)

A peste negra, enfrentada pela Europa do século XIV, afetou as representações da morte nas artes visuais, propondo reflexões sobre o potencial das ciências modernas para a resolução da peste à época.

b)

A estética do macabro, criada na Idade Média, é acionada pelas artes visuais como elemento valorizador da vida, gerando a negação dos contextos sanitários marcados pela peste e pela morte.

c)

A estética do macabro declinou no período medieval, ficando restrita a um ambiente religioso, católico e temente ao juízo final, como apresenta a obra através das figuras dos reis e das autoridades religiosas.

d)

A peste negra tornou-se uma referência presente na estética do macabro, que faz alusão a caveiras e cadáveres entre os vivos, compondo um ambiente festivo e aterrador.

Resolução

a) Incorreta. Não é válido afirmar que a Peste Negra promoveu à época “reflexões sobre o potencial das ciências modernas”. A abordagem científica e empírica dos meios de curar se consolidou posteriormente na Europa Ocidental, em especial após o século XVII. No contexto medieval, o desconhecimento sobre as causas e os tratamentos da doença resultou numa difusa incompreensão dos eventos em curso, o que permitiu a ascensão de meios não-científicos para combater a peste, como os recursos religiosos, a fuga das cidades, o emprego terapêutico de sangue de animais nas feridas, entre outros.

b) Incorreta. Conforme o texto base sugere, a “estética do macabro” é “anterior ao período medieval”, ganhando maior ênfase e difusão no contexto da Peste Negra. Também é incorreto aferir que a tal estética buscava a “negação dos contextos sanitários” vinculados à Peste, pois ela se caracterizava sobretudo pela ênfase na representação da morte e na decomposição do corpo.

c) Incorreta. A estética do macabro elevou sua presença na literatura e nas artes visuais do contexto da Peste Negra, contrariando o suposto declínio sugerido pela alternativa. Tal ênfase decorre do próprio contato direto e frequente com as vítimas da Peste, impactando as leituras e representações culturais sobre a morte e a doença no período.

d) Correta. A Peste Negra impactou consideravelmente os rituais ligados à morte e suas representações nas artes e na literatura, conforme evidenciado pelo excerto da questão. No lugar da ideia de morte vinculada a uma passagem “segura e tranquila”, observa-se a ascensão da “estética do macabro”, que enaltecia a representação da decomposição do corpo, a atuação dos vermes sobre os cadáveres e a interação entre mortos e vivos. Tal ressignificação da representação visual da morte é compreendida como uma forma de reelaborar pela arte o caos instalado a partir da difusão da Peste, com imagens que aliavam, ao mesmo tempo, cenas curiosamente festivas e sinistras. Por exemplo, é comum na "estética do macabro" a representação de danças entre mortos e vivos, ou mesmo a ilustração de cenas nas quais cadáveres e caveiras aprecem portando instrumentos musicais ou objetos do cotidiano humano, conforme qual a própria pintura "O Triunfo da Morte" exemplifica.