No Brasil, um exemplo de história que precisa ser narrada é a dos movimentos em defesa dos direitos que hoje reconhecemos como movimentos LGBTQIA+. Tais movimentos eclodiram como um ato de resistência em plena ditadura civil-militar, marcada pela repressão e por ideais conservadores. Naquele contexto, a busca por visibilidade passou a ser compreendida como um dos elementos fundamentais para a conquista da cidadania. Entre outras coisas, os ativistas defendiam que os direitos políticos, sociais e civis tornam-se socialmente legítimos para os cidadãos quando envolvem o direito aos meios de comunicação e à livre expressão.
(Baseado em Vinicius Ferreira e Igor Sacramento, Editorial: Movimento LGBT no Brasil: violências, memórias e lutas. Reciis – Rev Eletron Comun Inf Inov Saúde. 2019 abr.-jun.13(2): p. 234-239.)
A partir da leitura do texto, assinale a alternativa correta acerca da historicidade dos movimentos políticos identitários e suas estratégias políticas de ação.
a) |
Esses movimentos eclodiram na segunda metade do século XX, foram perseguidos e silenciados pela ditadura militar e retornaram à cena pública após a instauração de um regime democrático. |
b) |
Por sua capacidade de obter alcance social, desde a década de 1970, as mídias são ferramentas para a construção de uma cidadania plena, sendo a busca por visibilidade, portanto, uma das estratégias de ação do movimento LGBTQIA+. |
c) |
O Brasil do século XX construiu-se como uma democracia racial, o que garantiu aos movimentos políticos e identitários nacionais o acesso aos direitos civis, políticos e sociais, esvaziando as agendas dos militantes LGBTQIA+. |
d) |
Na atualidade, a onda de crimes de homofobia e transfobia estimulam o movimento LGBTQIA+ a rever a pauta da visibilidade dos sujeitos, tornando a militância mais discreta e voltada para o espaço privado da ação dos indivíduos. |
O exercício traz um tema clássico da sociologia: movimentos sociais. Reconhecidos pelas ciências humanas como importantes instrumentos de luta no avanço e consolidação dos direitos civis, políticos e sociais, na construção da cidadania e da democracia, os movimentos sociais são grupos articulados que, por meio de ações coletivas, buscam visibilidade social abrindo diálogos com a sociedade civil e, na medida do possível (a depender dos sistemas de governo dos locais que atuam), com a burocracia estatal. Surgiram no século XIX, na Europa, por meio da atuação da classe trabalhadora, no contexto das reivindicações de cunho empregatício. No século XX, também ganha espaço nos Estados Unidos, na América Latina e no restante do mundo, ampliando, inclusive, seu escopo de ação. Daí podermos falar em movimentos sociais protagonizados por mulheres, negros, ambientalistas ou, como é o caso da questão, movimento sociais LGBTQIA+. Considerando tais informações, temos:
a) Incorreta. Embora o avanço da internet e a chegada das redes sociais tenham dado maior visibilidade às lutas dos movimentos sociais LGBTQIA+, não podemos afirmar que tais grupos tenham sido silenciados pela Ditadura Militar brasileira e só tenham "retornado à cena pública" depois da redemocratização. Na esteira da contracultura do final da década de 60, movimentos sociais, ao redor de boa parte do globo, inclusive no Brasil, reivindicavam liberdades sexuais, respeito às diferenças e igualdade de todos, indistintamente. Essas lutas continuaram, a despeito das arbitrariedades de governos autoritários.
b) Correta. As mídias são, sim, ferramentas para a construção de uma cidadania plena, na medida em que são instrumentos para a garantia e efetivação de determinadas liberdades individuais e coletivas, tais como a liberdade de expressão e os direitos aos meios de comunicação, como afirma o texto. São, além disso, importantes mecanismos de visibilidade, dado seu alcance social, conforme apontado pela alternativa. Aliás, justamente por isso, não apenas os movimentos LGBTQIA+ buscam tais recursos. A visibilidade das mídias, já há muito, é fundamental para qualquer movimento social, para qualquer luta cidadã e democrática.
c) Incorreta. A alternativa faz uma afirmação que, embora seja parcialmente aceita pelo senso comum, não tem nenhuma validade do ponto de vista das Ciências Sociais: "O Brasil do século XX construiu-se como uma democracia racial". A ideia de que, no Brasil, o racismo não foi estrutural, fundamental para o entendimento da formação de nosso povo, não encontra legitimidade na atual Sociologia. É também incorreto afirmar que a suposta democracia racial brasileira teria esvaziado a agenda LGBTQIA+, como se os movimentos sociais com esse enfoque não mais tivessem pautas de lutas.
d) Incorreta. Os movimentos sociais LGBTQIA+, diferentemente do que afirma a alternativa, buscam cada vez mais dar visibilidade às pautas que objetivam (as pautas de direitos civis, sobretudo), buscando, para tanto, abrir diálogos nas mais variadas instâncias, para conversar, inclusive, sobre as dores que seus integrantes sofrem quando, por conta dos preconceitos, são ofendidos em sua dignidade ou têm sua cidadania "diminuída", seja nas agressões homofóbicas ou nos outros meios de violência. Há de se falar. "Não ao silêncio" é um dos imperativos desses grupos, assim como a ideia de que "o privado é político".