Para responder às questões de 12 a 16, leia o trecho do romance Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa.
Sei que estou contando errado, pelos altos. Desemendo. Mas não é por disfarçar, não pense. De grave, na lei do comum, disse ao senhor quase tudo. Não crio receio. O senhor é homem de pensar o dos outros como sendo o seu, não é criatura de pôr denúncia. E meus feitos já revogaram, prescrição dita. Tenho meu respeito firmado. Agora, sou anta empoçada, ninguém me caça. Da vida pouco me resta — só o deo-gratias; e o troco. Bobeia. Na feira de São João Branco, um homem andava falando: — “A pátria não pode nada com a velhice...” Discordo. A pátria é dos velhos, mais. Era um homem maluco, os dedos cheios de anéis velhos sem valor, as pedras retiradas — ele dizia: aqueles todos anéis davam até choque elétrico... Não. Eu estou contando assim, porque é o meu jeito de contar. Guerras e batalhas? Isso é como jogo de baralho, verte, reverte. Os revoltosos depois passaram por aqui, soldados de Prestes, vinham de Goiás, reclamavam posse de todos os animais de sela. Sei que deram fogo, na barra do Urucuia, em São Romão, aonde aportou um vapor do Governo, cheio de tropas da Bahia. Muitos anos adiante, um roceiro vai lavrar um pau, encontra balas cravadas. O que vale, são outras coisas. A lembrança da vida da gente se guarda em trechos diversos, cada um com seu signo e sentimento, uns com os outros acho que nem não misturam. Contar seguido, alinhavado, só mesmo sendo as coisas de rasa importância. De cada vivimento que eu real tive, de alegria forte ou pesar, cada vez daquela hoje vejo que eu era como se fosse diferente pessoa. Sucedido desgovernado. Assim eu acho, assim é que eu conto. [...] Tem horas antigas que ficaram muito mais perto da gente do que outras, de recente data. O senhor mesmo sabe.
(Grande sertão: veredas, 2015.)
O evento histórico mencionado no texto está relacionado
a) |
à Revolta da Chibata. |
b) |
à Revolta da Armada. |
c) |
ao Cangaço. |
d) |
ao Abolicionismo. |
e) |
ao Tenentismo. |
a) Incorreta. A Revolta da Chibata aconteceu em 1910 na cidade do Rio de Janeiro. Havia na marinha um código de conduta interno que poderia condenar os marinheiros a receberem castigos corporais. Grande parte dos marujos era composta por ex-escravos, uma vez que a abolição tinha ocorrido poucos anos antes (1888). Assim, a possibilidade de ex-escravos ou pessoas negras estarem sendo chicoteadas no Brasil depois da lei Àurea, levou aos marinheiros organizarem um motim, liderados por João Cândido. O fragmento de texto apresentado pela questão não contempla esse contexto.
b) Incorreta. A Segunda Revolta da Armada aconteceu entre 1892 e 1894 na cidade do Rio de Janeiro, quando da época do governo de Floriano Peixoto (1891-1894). Alguns oficiais da marinha brasileira, inconformados com o governo de Floriano Peixoto, decidiram se amotinar e tentar derrubá-lo. O fragmento de texto apresentado pela questão não menciona esse período.
c) Incorreta. O cangaço foi um fenômeno social ocorrido na região nordeste do Brasil nas primeiras décadas do século 20. Devido a questões de miséria e abandono se formavam grupos nômades armados, que liderados por figuras carismáticas, tais como Lampião (1898-1938), praticavam toda sorte de crimes pela região. Não há nenhuma questão abordada pelo fragmento de texto oferecido pela questão que possa caracterizar tal fenômeno histórico.
d) Incorreta. O abolicionismo foi uma campanha popular e notadamente urbana que ocorreu no Brasil do Segundo Reinado (1840-1889), especialmente a partir de 1870. Tal empreendimento visava pressionar o parlamento brasileiro para que fosse aprovada uma lei que abolisse a escravidão no Brasil. Finalmente, a lei Áurea de 13/5/1888 efetivou esse desejo popular. O fragmento de texto oferecido pela questão não menciona essas questões.
e) Correta. O fragmento de texto oferecido pela questão cita a figura de "Prestes", no caso Luís Carlos Prestes (1898-1990), que era um capitão do exército brasileiro radicado no Rio Grande do Sul. Na década de 1920, diante da máquina eleitoral fraudulenta das grandes oligarquias rurais, surgiu no exército brasileiro o movimento tenentista, que desejava realizar uma revolução armada para derrubar essa velha ordem. Uma das ações mais famosas dos tenentistas foi a chamada Coluna Prestes/Miguel Costa (1924-1927), que, embora tenha fracassado, marchou pelo país em busca de derrubar o governo de Artur Bernardes (1922-1926).