Na indústria farmacêutica, é muito comum o emprego de substâncias de revestimento em medicamentos de uso oral, pois trazem uma série de benefícios como alteração de sabor em medicamentos que tenham gosto ruim, melhoria da assimilação do composto, entre outras ações. Alguns compostos poliméricos à base do polissacarídeo celulose são utilizados para garantir que o fármaco somente seja liberado quando em contato com soluções aquosas cujo pH se encontre próximo da faixa da neutralidade.
BORTOLINI, K et al. Análise de perfil de dissolução de cápsulas gastrorresistentes utilizando polímeros industriais com aplicação em farmácias magistrais. Revista da Unifebe, n. 12. 2013 (adaptado).
Qual é a finalidade do uso desse revestimento à base de celulose?
a) |
Diminuir a absorção do princípio ativo no intestino. |
b) |
Impedir que o fármaco seja solubilizado no intestino. |
c) |
Garantir que o fármaco não seja afetado pelas secreções gástricas. |
d) |
Permitir a liberação do princípio ativo pela ação das amilases salivares. |
e) |
Facilitar a liberação do fármaco pela ação dos sais biliares sobre o revestimento. |
Nos humanos, a digestão de carboidratos ocorre em diferentes etapas, locais e em diferentes condições. Ao entrar em contato com a saliva, durante a mastigação, o alimento glicídico sofre ação da amilase salivar também chamada de ptialina. Esta enzima catalisa a hidrólise do polissacarídeo amido, gerando a maltose, que é um dissacarídeo. A atividade ótima da ptialina ocorre em um pH em torno de 7, que é o pH aproximado da secreção salivar e, portanto, da boca. Ao passar pelo esôfago, a digestão continua, porém, ela é interrompida ao chegar no estômago, já que a secreção de HCl (ácido clorídrico) provoca a queda no pH do microambiente estomacal e reduz drasticamente a atividade enzimática da ptialina. Ao chegar no duodeno (porção inicial do intestino delgado), tanto a maltose quanto o amido ainda não digerido sofrerão digestão por atividade da maltase do suco entérico e amilase pancreática do suco pancreático, respectivamente. Após a digestão, as moléculas de glicose, produtos do processo catalítico, serão absorvidas pelos enterócitos, células que revestem o intestino delgado. Embora tanto o amido quanto a celulose sejam polissacarídeos, a celulose não é digerida pelo sistema digestório humano, pois não dispomos de enzimas (denominadas celulases) capazes de hidrolisar esse tipo de carboidrato, o que explica o emprego funcional da fibra para proteger o princípio ativo de liberação antecipada. Após essas considerações, podemos julgar as alternativas.
a) Incorreta. O revestimento de celulose tem como objetivo evitar que o princípio ativo seja liberado no estômago, já que no pH ácido estomacal, as fibras de celulose se mantêm intactas e protegem o medicamento.
b) Incorreta. O medicamento tem que ser liberado no intestino, solubilizado e absorvido pelos enterócitos intestinais.
c) Correta. Ao passar pelo estômago, o pH ácido em torno de 2, impede a solubilização das fibras de celulose, o que evita a liberação do medicamento nesse local. Ao chegar no intestino, o conteúdo estomacal, vindo de um ambiente ácido, chega em um ambiente tipicamente alcalino, com pH=8, por ação bicarbonato do suco pancreático e da secreção da vesícula biliar. Durante a mudança de pH, ao passar pelo pH=7, as fibras de celulose se solubilizam e permitem a saída do princípio ativo do invólucro e o contato com o epitélio intestinal.
d) Incorreta. As amilases salivares não são capazes de atuar na celulose, além disso essa classe de medicamentos não é do tipo mastigável, mas sim ingerida e deglutida de imediato, chegando ao estômago em poucos instantes.
e) Incorreta. Os sais biliares apresentam atividade emulsificante e atuam nas gorduras, não na celulose.