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Questão 44 Fuvest 2021 - 1ª fase

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Questão 44

Escravidão

[No Brasil], a transição da predominância indígena para a africana na composição da força de trabalho escrava ocorreu aos poucos ao longo de aproximadamente meio século. Quando os senhores de engenho, individualmente, acumulavam recursos financeiros suficientes, compravam alguns cativos africanos, e iam acrescentando outros à medida que capital e crédito se tornavam disponíveis. Em fins do século XVI, a mão de obra dos engenhos era mista do ponto de vista racial, e a proporção foi mudando crescentemente em favor dos africanos importados e sua prole.

Stuart Schwartz, Segredos internos. São Paulo: Companhia das Letras, 1988, p.68.

Com base na leitura do trecho e em seus conhecimentos, pode-se afirmar corretamente que, no Brasil, 



a)

a implementação da escravidão de origem africana não fez desaparecer a escravidão indígena, pois o emprego de ambas podia variar segundo épocas e regiões específicas.

b)

do ponto de vista senhorial, valia a pena pagar mais caro por escravos africanos porque estes viviam mais do que os escravos indígenas, que eram mais baratos. 

 

c)

 o comércio de escravos africanos foi incompatível com o comércio de indígenas porque eram exercidos por diferentes traficantes, que concorriam entre si.

 

d)

havia créditos disponíveis para a compra de escravos africanos, mas não de escravos indígenas, pois a Igreja estava interessada na manutenção de boas relações com os nativos. 

 

e)

a escravização dos indígenas pelos portguueses foi inviabilizada pelo fato de que os povos nativos americanos eram contrários ao aprisionamento de seres humanos. 

Resolução

a) Correta. Conforme o texto de Stuart Schwartz apresenta, coexistiu no Brasil colonial tanto o trabalho cativo de africanos como de povos ameríndios. No entanto, a incidência de determinado tipo de trabalhador apresentava grandes diferenças entre as regiões coloniais, tendo em vista que as diferenças econômicas existentes e os interesses políticos associados à colonização afetavam o valor, a oferta e a demanda por braços escravos. Dessa forma, regiões economicamente e politicamente mais bem sucedidas - tal qual o nordeste açucareiro - apresentavam mercados mais dinâmicos, atraindo o interesse daqueles envolvidos no tráfico negreiro. Por sua vez, regiões secundárias na lógica colonial buscavam outras formas de obtenção de escravizados, principalmente de ameríndios. Para atender essa demanda interna de cativos, o Bandeirantismo surgiu como uma valiosa fonte de renda para sertanistas e desbravadores, ofício explorado principalmente por colonos da capitania de São Vicente.
b) Incorreta. Embora existisse uma diferença considerável de preço do escravizado indígena para o africano, não é possível afirmar que, do ponto de vista senhorial era mais vantajoso adquirir trabalhadores oriundos da África. A própria diferença de preços entre um cativo indígena para um africano - segundo Perdigão Malheiros, o preço médio do escravo indígena era de 4$000, enquanto que o africano chegava a 100$000 no século XVII - muitas vezes tornava o indígena uma opção mais interessante para o senhor, especialmente num contexto de dificuldade de acúmulo de capitais. A importância e lucratividade do uso do escravo indígena é validada pelo próprio uso recorrente de trabalhadores indígenas, mesmo em regiões abastecidas regularmente pelo Tráfico Atlântico, o que sugere também uma vantagem na aquisição e no emprego de escravos indígenas, independente das taxas de mortalidade.
c) Incorreta. Como o próprio texto-base apresenta, a história colonial brasileira foi marcada pela coexistência de escravizados indígenas e africanos, sem qualquer incompatibilidade no uso desses trabalhadores.
d) Incorreta. Não é possível afirmar que havia créditos disponíveis apenas para a aquisição de escravos africanos. O acesso a capital era um dos grandes desafios dos colonos na América Portuguesa, já que a lógica colonial buscava acumular as riquezas sempre na metrópole. Ainda assim, quando os senhores de engenho acumulavam uma determinada quantia de capitais, seja através de créditos de terceiros ou pela rentabilidade do açúcar, estes empregavam o valor tanto na aquisição de escravizados africanos como indígenas. Vale lembrar que a Igreja Católica apresentava uma oposição à escravização ilegal de indígenas (isto é, adquiridos fora da Guerra Justa), não se opondo abertamente a qualquer tipo de escravização dos nativos.
e) Incorreta. A colocação de que a escravização indígena foi inviabilizada na América Portuguesa está incorreta, já que, em verdade, fora uma mão de obra fundamental para diversas regiões e atividades econômicas durante o período colonial. Vale lembrar que o uso de indígenas escravizados teve uma marcada longevidade no período colonial, existindo desde o século XVI até o século XVIII, quando essa modalidade de trabalho foi formalmente abolida por Marquês de Pombal, no ano de 1758. Por fim, também é incorreto afirmar que os ameríndios eram contrários a qualquer forma de apresamento, tendo em vista a grande diversidade de povos e culturas entre os nativos, ou a própria existência de práticas de captura de inimigos em guerras dentro de determinadas culturas.