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Questão 3 Unicamp 2021 - 1ª fase - 1º dia

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Questão 3

Lírica de Camões

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,

Muda-se o ser, muda-se a confiança:

Todo o mundo é composto de mudança,

Tomando sempre novas qualidades.

 

Continuamente vemos novidades,

Diferentes em tudo da esperança:

Do mal ficam as mágoas na lembrança,

E do bem (se algum houve) as saudades.

 

O tempo cobre o chão de verde manto,

Que já coberto foi de neve fria,

E em mim converte em choro o doce canto.

 

E afora este mudar-se cada dia,

Outra mudança faz de mor espanto,

Que não se muda já como soía*.

(Luís Vaz de Camões)

*soía: terceira pessoa do pretérito imperfeito do indicativo do verbo “soer” (costumar, ser de costume).

(Luís de Camões, 20 sonetos. Campinas: Editora da Unicamp, p.91.)

Indique a afirmação que se aplica ao soneto escrito por Camões.



a)

O poema retoma o tema renascentista da mudança das coisas, que o poeta sente como motivo de esperança e de fé na vida.

b)

A ideia de transformação refere-se às coisas do mundo, mas não afeta o estado de espírito do poeta, em razão de sua crença amorosa.

c)

Tudo sempre se renova, diferentemente das esperanças do poeta, que acolhem suas mágoas e saudades.

d)

Não apenas o estado de espírito do poeta se altera, mas também a experiência que ele tem da própria mudança.

 

 
Resolução

a) Incorreta. A constatação das mudanças provoca sentimentos de pesar e melancolia no eu-lírico, uma vez que elas ocorrem “diferente em tudo da esperança”. Nesse sentido, não há motivos para ter esperança ou fé na vida, uma vez as mudanças ocorrem de modo diverso daquilo que se esperava.

b) Incorreta. Em diversos trechos, o eu-lírico expressa o quanto as mudanças afetam seu estado de espírito, atingindo, inclusive, sua vida amorosa, fazendo- sair de estado de felicidade para uma experiência de tristeza e melancolia: “E em mim converte em choro o doce canto”.

c) Incorreta. O poeta observa que as coisas mudam, não que, necessariamente, se renovam. As esperanças, por sua vez, nunca são contempladas pelas mudanças, que terminam por frustrá-las.

d) Correta. O estado de espírito do eu-lírico diante das mudanças que observa no mundo, na natureza e em si mesmo é de uma certa melancolia, expressa em versos como: “Do mal ficam as mágoas na lembrança” e “E em mim converte em choro o doce canto”. Entretanto, além de expressar o sentimento de pesar diante das mudanças, o eu-lírico manifesta também seu espanto, ao constatar que “não se muda já como soía”, isto é, “a própria mudança muda”, não havendo regularidade nem previsibilidade na sua dinâmica. Tal constatação lhe provoca uma experiência de impotência frente à aleatoriedade das mudanças a que sua vida está sujeita.