As feridas da discriminação racial se exibem ao mais superficial olhar sobre a realidade social do país. Até 1950, a discriminação em empregos era uma prática corrente, sancionada pelas práticas sociais do país. Em geral, os anúncios de vagas de trabalho eram publicados com a explícita advertência: “não se aceitam pessoas de cor.” Mesmo após a Lei Afonso Arinos, de 1951, proibindo categoricamente a discriminação racial, tudo continuou na mesma. Depois da lei, os anúncios se tornaram mais sofisticados que antes, e passaram a requerer: “pessoas de boa aparência”. Basta substituir “pessoas de boa aparência” por “branco” para se obter a verdadeira significação do eufemismo.
(Adaptado de Abdias do Nascimento, O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado. São Paulo: Perspectiva, 2018, p. 97.)
A partir do excerto, é correto afirmar:
a) |
Apesar da Lei Afonso Arinos de 1951, o racismo que existia há muitos anos no mercado de trabalho brasileiro permaneceu por meio de estratégias camufladas. |
b) |
A Lei Afonso Arinos de 1951 possibilitou a eliminação do racismo no mercado de trabalho do mundo da moda, que exigia a boa aparência das pessoas brancas. |
c) |
Em 1951, o conceito de “pessoas de boa aparência”, ditado pelo mundo da moda e reproduzido nos anúncios de vagas de trabalho, privilegiava o asseio no vestir. |
d) |
O racismo foi eliminado das relações sociais brasileiras somente na década de 1990, com a consolidação do conjunto de leis da democracia racial.
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a) Correta. O texto de Abdias do Nascimento utilizado como base para a questão defende a ideia de que, mesmo após a Lei Afonso Arinos, de 1951, que proíbe a discriminação racial, estratégias para camuflar o racismo na nossa sociedade foram adotadas, fazendo com que a interdição jurídica da discriminação não tivesse efeito prático para a eliminação do racismo. Uma das estratégias para se mascarar o racismo no mercado de trabalho, de acordo com o autor, seria tornar os anúncios de trabalho mais sofisticados, demandando, por exemplo, "pessoas de boa aparência". Como o padrão de beleza e boa aparência, por dinâmicas relacionadas ao racismo, está associado à branquitude, o que na prática o anúncio de emprego estaria dizendo é que só estariam admitindo pessoas brancas.
b) Incorreta. O argumento de Abdias do Nascimento é de que o racismo não foi, de forma alguma, eliminado pela Lei Afonso Arinos, seja no ambiente da moda ou nos demais círculos sociais e de trabalho.
c) Incorreta. O modelo do que se considerava "pessoa de boa aparência", em 1951, possuía uma influência inegável do que era ditado pela moda e poderia ser reproduzido em veículos como os anúncios para vaga de emprego. Porém, o asseio ao vestir era apenas um fator acessório a esse modelo, sendo que o fator privilegiado para sua construção referia-se à etnia, associando a "boa aparência" às pessoas brancas.
d) Incorreta. O racismo não foi eliminado das relações sociais brasileiras nos anos 1990, sendo ainda um traço indelével do Brasil. Não houve, também, algum conjunto de leis relacionadas à democracia racial, conceito que pode ser lido como problemático e promotor de um apagamento das tensões raciais brasileiras.