Depois de 20 anos na escola
Não é difícil aprender
Todas as manhas do seu jogo sujo
Não é assim que tem que ser
Vamos fazer nosso dever de casa
E aí então vocês vão ver
Suas crianças derrubando reis
Fazer comédia no cinema com as suas leis
Somos os filhos da revolução
Somos burgueses sem religião
Somos o futuro da nação
Geração Coca‐Cola.
Dado Villa‐Lobos e Renato Russo, Geração Coca‐Cola, 1984.
Esses versos
a) |
remetem ao período da Campanha das Diretas Já e apresentam esperanças em relação à implantação de um regime democrático no Brasil. |
b) |
revelam a indignação e rebeldia da juventude com os rumos da chamada Nova República, especialmente contra o Colégio Eleitoral e o bipartidarismo. |
c) |
propõem um repúdio por parte da juventude brasileira em relação às questões políticas e comportamentais durante a transição democrática. |
d) |
oferecem uma visão positiva acerca do período militar no Brasil e demonstram ceticismo com respeito à transição democrática. |
e) |
reforçam a capacidade de mobilização e reivindicação da juventude pela liberdade de expressão e criação de novas universidades públicas. |
A música “Geração Coca-Cola”, de autoria de Dado Villa-Lobos e Renato Russo, foi escrita durante os anos finais da Ditadura Militar, num contexto marcado pela forte influência americana no país, seja no modelo educacional, cultural e de consumo.
A letra da música evidencia uma oposição entre “nós” - o grupo de jovens nascidos e criados durante a Ditadura, com uma forte influência da cultura americana, a dita a “geração coca-cola” - e “vocês”, os partidários do regime militar. Em diversos versos da letra fica evidente uma postura reativa desses jovens, tais como ”Vamos cuspir de volta o lixo em cima de vocês” e “Vamos fazer nosso dever de casa / E aí então, vocês vão ver”.
Nesse sentido, a música pode ser interpretada como uma crítica ao peso da influência estrangeira no Brasil, o descontentamento com o regime político e a revolta desses jovens, que buscam a construção de novas práticas culturais, novos discursos e novas ideologias.
Considerando esses aspectos – a oposição entre a “geração coca-cola” e os partidários da Ditadura - podemos afirmar que a letra apresenta uma perspectiva de mudanças para o futuro, observadas, por exemplo, no verso “Somos o futuro da nação”. Essa visão é reforçada também pelo verso “Depois de 20 anos na escola / Não é difícil aprender / Todas as manhas do seu jogo sujo / Não é assim que tem que ser”, referindo-se aos 20 anos da Ditadura Militar (iniciada em 1964) e afirmando que a partir daquele momento “vamos fazer nosso dever de casa / E aí então vocês vão ver / suas crianças derrubando reis”, em alusão à juventude que reverteria o quadro político, sendo que a derrubada dos reis pode ser entendida como o fim do regime. Dessa forma, a letra pode ser inserida no contexto das Diretas Já, no entanto, é impreciso afirmar que indica especificamente a esperança em relação à implantação da democracia, mas sim uma reação a um sistema em que cresceram e consideraram falido. Além disso, embora tenha sido gravada em 1984, a composição da letra é de 1978, o que torna ainda mais impreciso e anacrônico associar seu sentido diretamente ao período da Campanha das Diretas Já e às “esperanças em relação a implantação de um regime democrático no Brasil”, conforme mencionado na alternativa A.
Já a alternativa C pode ser lida de forma ambígua, dependendo da interpretação de quais seriam as "questões políticas" mencionadas na alternativa. Se adotarmos o pressuposto de que "questões políticas” é um sinônimo do regime político vigente (Ditadura Militar) a alternativa pode ser considerada correta. No entanto, se “questões políticas” se referirem ao sentido mais amplo do termo, nesse caso a alternativa é incorreta, pois, conforme indica a letra, a juventude está disposta a "fazer o dever de casa" e reverter a situação, pois as crianças, “o futuro da nação” vão "derrubar os reis". Desse modo, não há um repúdio em relação às questões políticas como um todo, mas sim ao governo especificamente.
Assim, consideramos que não há uma resposta possível para a questão, pois os versos não sugerem precisamente “esperanças” conforme apontado pela alternativa A e, pois, para validar a alternativa C é preciso adotar um pressuposto não oferecido pela questão (o sentido de “questões políticas”).
Sobre as demais alternativas:
b) Incorreta. É cronologicamente inviável afirmar que os versos revelam a indignação dos jovens contra os rumos da chamada Nova República, tendo em vista que esta só teve início em 1985. O início da nova República foi marcado pela eleição de Tancredo Neves por um Colégio Eleitoral composto por congressistas e delegados das assembleias estaduais. Vale ressaltar que no contexto de composição dos versos o retorno do pluripartidarismo já havia ocorrido, pois o bipartidarismo foi suspenso em 1979.
d) Incorreta. Os versos não oferecem uma visão positiva sobre a Ditadura Militar, mas sim um descontentamento com os últimos 20 anos do país (idade da Ditadura Militar em 1984) como pode ser observado em "Depois de 20 anos na escola / Não é difícil aprender / Todas as manhas do seu jogo sujo / Não é assim que tem que ser". Além disso, a visão diante da transição democrática é marcada pelo otimismo na atuação dos jovens, considerados "o futuro da nação".
e) Incorreta. Não é possível identificar nos versos nenhuma menção à liberdade de expressão ou à criação de universidades públicas.