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Questão 1 Fuvest 2025 - 2ª fase - dia 2

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Questão 1

Idade Média Religião (Baixa Idade Média) Cultura (Baixa Idade Média)

As coisas mudaram drasticamente logo que o controle das mulheres sobre a reprodução começou a ser percebido como uma ameaça à estabilidade econômica e social, tal como ocorreu no período subsequente à catástrofe demográfica produzida pela Peste Negra, a praga apocalíptica que, entre 1347 e 1352, destruiu mais de um terço da população europeia. Depois da disseminação da praga, os aspectos sexuais da heresia adquiriram maior importância em sua perseguição. Coincidindo com este processo, que marcou a transição da perseguição à heresia para a caça às bruxas, a figura do herege se tornou, cada vez mais, a de uma mulher, de forma que, no início do século XV, a bruxa se transformou no principal alvo de perseguição aos hereges.

FEDERICI, Silvia. Calibã e a bruxa. Mulheres, corpo e acumulação primitiva. São Paulo: Ed. Elefante, 2017. p.85-86 (Adaptado).

Considerando o texto, responda:

a) O que fez com que as mulheres se tornassem os principais alvos da perseguição às heresias?

b) Cite dois elementos da crise do século XIV mencionados no excerto.

c) Indique qual foi a principal instituição responsável pela condenação das heresias e explique seu papel na chamada “caça às bruxas”.



Resolução

O texto aborda a crise medieval ressaltando alguns aspectos como a Peste Negra (1347-1352), que foi uma das pandemias mais devastadoras da história, eliminando cerca de um terço da população europeia. A escassez de mão de obra que ela gerou, combinada com profundas crises econômicas e sociais, desestabilizou a Europa feudal, gerando mudanças no equilíbrio de poder entre camponeses, nobres e instituições religiosas. Além disso, no período subsequente, emergiram novas formas de controle social, marcadas pela crescente repressão das mulheres, especialmente aquelas que desafiavam normas sociais ou possuíam conhecimentos relacionados à saúde e à reprodução. Nesse contexto, as mulheres passaram a ser associadas à heresia e à feitiçaria, justificando perseguições sob a égide de um controle mais rígido sobre corpos e comportamentos. Dessa forma, temos:

a) Após a Peste Negra, houve uma crescente necessidade de estabilizar a sociedade economicamente e controlar a reprodução para repovoar a Europa. Mulheres que tinham conhecimentos relacionados à saúde reprodutiva, como parteiras ou curandeiras, passaram a ser vistas como uma ameaça, pois seu controle sobre a natalidade desafiava interesses econômicos e sociais. Além disso, a associação histórica entre as mulheres e o pecado, reforçada pela teologia medieval, contribuiu para a construção da imagem feminina como inerentemente ligada à heresia e à bruxaria. Assim, mulheres independentes, muitas vezes viúvas ou sem laços familiares fortes, foram retratadas como hereges, consolidando a perseguição de gênero.

b) Um dos principais elementos da crise do século XIV mencionados no excerto é a Peste Negra, uma epidemia devastadora que assolou a Europa entre 1347 e 1352, exterminando mais de um terço da população. Essa tragédia gerou uma profunda desestabilização demográfica, econômica e social, marcando o fim do equilibrio da sociedade feudal. Outro elemento destacado é a perseguição às heresias, que, após a disseminação da praga, adquiriu uma dimensão sexual e de gênero mais evidente, sendo direcionada especialmente contra as mulheres. Esse movimento culminou na transição para a caça às bruxas, em que figuras femininas passaram a ser o principal alvo das acusações de heresia.

c) A principal instituição responsável pela condenação das heresias foi a Inquisição, criada pela Igreja Católica no século XIII, com o objetivo inicial de combater movimentos religiosos considerados desviantes. Esse tribunal eclesiástico, em sua essência, visava garantir a ortodoxia religiosa, investigando, julgando e, frequentemente, condenando aqueles que se afastavam da doutrina oficial. Embora em seus primeiros séculos a Inquisição estivesse voltada para questões teológicas, seu foco ampliou-se ao longo do tempo, especialmente a partir do período pós-Peste Negra, quando a bruxaria e as práticas ligadas ao conhecimento feminino passaram a ser percebidas como ameaças.
A chamada caça às bruxas, intensificada entre os séculos XV e XVII, foi marcada por uma forte associação entre a heresia e a figura feminina. A Igreja e a Inquisição desempenharam um papel central ao legitimar a perseguição de mulheres, muitas delas curandeiras, parteiras ou mesmo mulheres marginalizadas, acusadas de fazer pactos demoníacos ou de praticar magia negra. A publicação de obras como o Malleus Maleficarum (1487), um manual inquisitorial escrito por Heinrich Kramer e Jacob Sprenger, reforçou a ideia de que a bruxaria era uma ameaça não apenas religiosa, mas também social e política, consolidando o imaginário da mulher como agente do mal.