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Questão 36 Fuvest 2025 - 1ª fase

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Questão 36

Nós matamos o cão tinhoso

    “Madala pensou que devia dizer qualquer coisa ao Djimo, mas não se lembrou de repetir a pergunta para si mesmo e por isso não soube o que dizer.

    O capataz fazia sinais à Maria, mas esta parecia não entender.

    A planta que Madala segurava na mão oferecia ao seu esforço uma resistência exagerada. Por isso, o punho de Madala tremia.

    (...)

    O tom da voz de Djimo revelava certo nervosismo:

    - Madala...

    Mas o nervosismo desapareceu logo. Djimo deu uma ordem:

    - Madala, não olhes para lá!

    Dentro de Madala, qualquer coisa se crispou. Mas não eram os fios da sua doença.”

Luís Bernardo Honwana. “Dina”. In: Nós matamos o cão tinhoso!.

 

Considerando o papel da antologia Nós matamos o cão tinhoso! na literatura moçambicana e como a sociedade de Moçambique dos anos 1950 e 1960 se configura literariamente no conto “Dina”, é correto afirmar:



a)

O conto apresenta, de modo documental e objetivo, a condição econômico-social de uma família, mediante a enumeração de objetos que conotam a vida difícil dos moçambicanos em busca de um lugar na hierarquia preestabelecida pelo colonizador europeu.

b)

O conto demonstra como Luís Bernardo Honwana recria consistentemente a estrutura do português do colonizador a partir das línguas originárias de Moçambique, fazendo da linguagem um instrumento de luta anticolonial.

c)

O conto retrata as primeiras reações dos trabalhadores do campo, como Madala e Djimbo, que se levantam em armas contra os aparelhos repressivos do Estado português e a violência nas relações de trabalho, representados no texto pelo capataz.

d)

No conto, a sociedade moçambicana vai sendo apresentada sob o ponto de vista do colonizador, de modo a comprovar o ideal civilizatório da colonização portuguesa na África e a convivência equilibrada entre colonizadores e colonizados.

e)

No conto, embora perceba ter ultrapassado um limite moral ao descobrir o parentesco entre Maria e Madala, o capataz personifica a imposição da violência e do patriarcalismo metropolitanos aos homens e mulheres de Moçambique.

Resolução

a) Incorreta. A vida difícil dos moçambicanos, no conto, não é representada por uma enumeração de objetos, mas pela sujeição à opressão e à humilhação. Madala e sua filha, assim como os outros camponeses, são explorados pelos colonizadores. No entanto, internalizam sua revolta e aceitam sua situação, sem buscar um lugar na hierarquia que lhes é imposta.

b) Incorreta. Embora o autor utilize alguns termos das línguas originárias de Moçambique, como “machamba”, a linguagem não se configura como um instrumento de luta anticolonial. Pelo contrário, verifica-se, no conto, a incapacidade de expressão verbal contra a opressão imposta aos camponeses moçambicanos: Madala, diante da agressão sexual sofrida por sua filha, não consegue verbalizar sua revolta.

c) Incorreta. No conto, não há uma reação dos trabalhadores contra o Estado e, nem mesmo, contra a violência nas relações de trabalho. O capataz, explora os camponeses e agride sexualmente a filha de Madala, um dos trabalhadores. No entanto, o pai, embora sofra com a opressão que lhe é imposta, não reage.

d) Incorreta. A sociedade moçambicana é apresentada sob o ponto de vista do colonizado, e não do colonizador. O conto ilustra a opressão e violência impostas ao povo moçambicano pelos portugueses, representados na figura do capataz, que desrespeita o idoso e a mulher. Desse modo, não se verifica um ideal civilizatório por parte dos portugueses, e muito menos uma convivência equilibrada entre colonizadores e colonizados.

e) Correta. O capataz, ao descobrir que Maria era filha de Madala, demonstra, por um momento, a percepção de que, ao ter explorado sexualmente a moça, ultrapassou um limite moral. Tal fato fica evidente na observação do narrador a cerca de “certo nervosismo” em seu tom de voz ao se dirigir a Madala; porém, “o nervosismo desapareceu logo”. Assim, apesar desse momento de hesitação, o capataz mantém sua postura de opressão. Percebe-se que, no conto, que o capataz representa a violência imposta pelos colonizadores ao povo moçambicano, seja na exploração do trabalho, seja no abuso infligido à mulher.