Carlos Drummond de Andrade foi o criador de uma obra lírica que, ao mesmo tempo, se aproxima e se afasta do Modernismo de 1922, propondo, a partir de traços desse movimento, uma poética original. Com base no exposto, em Alguma poesia (1930),
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os aspectos prosaicos da linguagem modernista ganham expressão lírica a partir de um sujeito poético que repropõe, em versos livres, a nostalgia romântica da infância idealizada. |
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o sujeito poético incorpora, sob a perspectiva de uma lírica de raiz subjetiva, vários procedimentos estilísticos das vanguardas modernistas, em especial a escrita automática e o surrealismo. |
c) |
a tópica literária do desconcerto do mundo ganha uma reconfiguração moderna, a partir de um sujeito poético que, mais do que revelar um mundo às avessas, focaliza o seu desajuste frente à realidade. |
d) |
o nacionalismo literário, tão típico da revisão empreendida pela primeira geração modernista sobre a realidade brasileira, apresenta-se como eixo temático de cunho ufanista. |
e) |
a paisagem mineira, no espaço literário, é configurada pelo sujeito poético como ambiente bucólico e refúgio privilegiado para os seus desajustes frente ao “vasto mundo”. |
a) Incorreta. Drummond não propõe a nostalgia romântica da infância idealizada, pelo contrário, em poemas como “Infância” e “Iniciação amorosa”, o poeta questiona e satiriza a concepção romântica idealizada da infância.
b) Incorreta. Em “Alguma Poesia”, não se observa a presença de elementos surrealistas tais como a escrita automática. A linguagem dos poemas se aproxima da estética da geração de 22, com elementos próximos da prosa, o verso livre e os poemas-piada.
c) Correta. A tópica literária do desconcerto do mundo remonta à literatura clássica e alude à falta de lógica e racionalidade em um mundo que se encontra “às avessas”. Em “Alguma Poesia”, o sujeito poético drummondiano reconfigura essa tópica numa perspectiva moderna a partir da visão do sujeito “gauche” que, amaldiçoado por um “anjo torto, desses que vivem na sombra”, vê o “vasto mundo” como um problema para o qual não há solução possível. Num mundo “inabitável e cada vez mais habitado” tomado pelos avanços tecnológicos, onde “máquinas terrivelmente complicadas” anulam o sentido das ações humanas, “os homens se matam como percevejos”, e fazer poesia se torna uma atividade quase impossível. Nesse sentido, o poeta lida com o absurdo e a falta de sentido das ações humanas, dos valores e instituições sociais, restando-lhe somente contemplar, com suas “retinas tão fatigadas”, o problema sem solução da própria existência, representada pela intransponível “pedra no meio do caminho”.
d) Incorreta. Em poemas como “Também já fui brasileiro”, Drummond ironiza o nacionalismo literário, colocando-o em questão em versos como “Eu também já fui brasileiro/ moreno como vocês./ (...) e aprendi na mesa dos bares/ que o nacionalismo é uma virtude./ Mas há uma hora em que os bares se fecham/ e todas as virtudes se negam”. Os versos de “Explicação” também apontam para uma visão não idealizada da realidade brasileira: “Aqui ao menos a gente sabe que tudo é uma canalha só,/ lê o seu jornal, mete a língua no governo,/ queixa-se da vida (a vida está tão cara)”.
e) Incorreta. Em "Alguma Poesia", Drummond desconstrói uma série de lugares comuns que associam o meio rural, a “roça” de Minas Gerais como um ambiente bucólico e idealizado, retratando-os com ironia, como se pode observar em “Cidadezinha qualquer”, em que o ambiente interiorano de Minas é o lugar da “vida besta”. No poema “Família mineira”, também se observa a representação da paisagem mineira como um lugar monótono e sem perspectivas.