Evanildo Bechara prepara a sua aposentadoria de pouco em pouco, como se a adiasse ao máximo. Aos 95 anos, o imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL) alcançou um status de astro pop no mundo da filologia e da gramática. Quando ainda tinha saúde para viagens mais longas, o filólogo lotava plateias em suas palestras na Europa e no Brasil, que não raro terminavam com filas para selfies.
A idade acentuou o lado "cientista" e professoral de Bechara, que adota um tom técnico na conversa até mesmo diante das perguntas mais pessoais. — "Qual o seu tipo preferido de leitura?". — "A minha leitura está dividida em duas partes, a cientifica e a literária, estabelecendo uma relação de causa e efeito entre elas." — responde.
Ainda adolescente, Bechara descobriu a lexicologia. Um "novo mundo" se abriu para o pernambucano, que se mantém atento às metamorfoses do nosso idioma. Seu colega de ABL, o filólogo Ricardo Cavaliere, se lembra de quando deu carona para o mestre e este encucou com os estrangeirismos do aplicativo de navegação instalado no veiculo. — "A vozinha do aplicativo avisou que havia um radar de velocidade 'reportado' à frente", lembra Cavaliere. — "Esse 'reportado' é uma importação, né?", notou Bechara.
Disponível em: https://oglobo.globo.com. Acesso em: 3 jan. 2024 (adaptado).
Nesse texto, as falas atribuídas a Evanildo Bechara são representativas da variedade linguística
a) |
situacional, pois o contexto exige o uso da linguagem formal. |
b) |
regional, pois ele traz marcas do falar de seu local de nascimento. |
c) |
sociocultural, pois sua formação pressupõe o uso de linguagem rebuscada. |
d) |
geracional, pois ele emprega termos característicos de sua faixa etária. |
e) |
ocupacional, pois ele faz uso de termos especificas de sua área de atuação. |
a) Incorreta. Um dos contextos mencionados pelo texto se situa em uma carona entre colegas, cena típica do cotidiano. Logo, não seria necessário usar uma variedade formal.
b) Incorreta. Apesar de o texto mencionar que Bechara é pernambucano, a variedade notada nas falas do filólogo não é regional. Não há, nesses trechos, quaisquer termos que remetam à variedade pernambucana ou nordestina.
c) Incorreta. De fato, as condições sociais influem no modo de falar dos indivíduos, gerando, assim, certas variações na maneira de usar uma mesma língua. Por ocupar uma posição de prestígio quanto ao domínio da norma-padrão (professor e estudioso da gramática), é esperado que Bechara opte por utilizar a variante padrão. Embora essa afirmação esteja correta, as falas atribuídas a ele no texto focalizam mais a visão professoral e científica do gramático. Por exemplo, ao notar que o aplicativo de navegação do carro faz uso do termo “reportado” ao alertar sobre um radar, Bechara identifica-o como um estrangeirismo (palavra ou expressão estrangeira usada em um texto ou fala, tomada como tal e não incorporada ao léxico da língua receptora). Logo, ainda que a formação de Bechara pressuponha um uso formal da língua, as falas selecionadas pela questão são representativas da variante ocupacional.
d) Incorreta. As variações históricas tratam das mudanças ocorridas na língua com o decorrer do tempo. Algumas expressões deixaram de existir, outras novas surgiram e outras se transformaram com a ação do tempo. De acordo com o texto, “a idade acentuou o lado ‘cientista’ e professoral de Bechara”. Assim, a maior idade do gramático o fez estar ainda mais atualizado sobre a língua, que “se mantém atento às metamorfoses do nosso idioma”. No entanto, nos trechos selecionados pela questão, não há análises acerca de variações históricas, o que invalida a alternativa.
e) Correta. A variação ocupacional é classificada como diastrática, isto é, corre entre diferentes grupos sociais, como os termos usados em algumas profissões, popularmente chamados de jargões. Exemplo disso ocorre quando o filólogo nota que o aplicativo de navegação do carro faz uso do termo “reportado” para alertar sobre um radar. No mesmo instante, Bechara identifica-o como um estrangeirismo [“Esse ‘reportado’ é uma importação, né?] (palavra ou expressão estrangeira usada em um texto ou fala, tomada como tal e não incorporada ao léxico da língua receptora), termo comum aos gramáticos e estudiosos da língua.