Inverno! Inverno! Inverno!
Inverno! Inverno! Inverno!
Tristes nevoeiros, frios negrumes da longa treva escapa-nos sempre, desesperadamente, para lá do horizonte, pérpetua solidão inóspita, onde apenas se ouve a voz do vento que passa uivando como uma legião de lobos, através da cidade de catedrais e túmulos de cristal na planíce, fantasmas que a miragem povoam e animam, tudo isto: decepções, obscuridade, solidão, desespero, e a hora invisível que passa como o vento, tudo isto é o frio inverno da vida.
Há no espírito o luto profundo daquele céu de bruma dos lugares onde a natureza dorme por meses, à espera do sol avaro que não vem.
POMPEIA, R. Canções sem metro. Campinas; Unicamp, 2013.
Reconhecido pela linguagem impressionista, Raul Pompeia desenvolveu-a na prosa poética, em que se observa a
a) |
Imprecisão no sentido dos vocábulos. |
b) |
dramaticidade como elemento expressivo. |
c) |
subjetividade em oposição à verossimilhança. |
d) |
valorização da imagem com efeito persuasivo. |
e) |
plasticidade verbal vinculada à cadência melódica. |
a) Incorreta. Não é correto afirmar que há uma imprecisão no sentido dos vocábulos. Além disso, mesmo se houvesse, não seria essa uma característica da linguagem impressionista de Raul Pompeia.
b) Incorreta. O fato de o texto apresentar certa dramaticidade, na escolha de termos como "desesperadamente" ou "luto profundo", não é suficiente para associar essa estratégia a uma linguagem impressionista, uma vez que esse movimento, orignal das artes plásticas, preza mais pela descrição de paisagens e elementos visuais, baseada nas impressões do autor, que pela interpretação destes.
c) Incorreta. Embora a subjetividade possa, de fato, ser verificada no texto, esta não aparece em oposição à verossimilhança, uma vez que o narrador não demonstra a intenção de estabelecer qualquer tipo de comparação entre a sua percepção do mundo e a percepção real desse mundo.
d) Incorreta. Não há, no texto, nenhum indício da construção de um efeito persuasivo, apenas a enunciação das impressões do narrador.
e) Correta. A plasticidade verbal, ou seja, a capacidade de um termo poder ser usado de forma conotativa, não literal, garante ao texto a possibilidade de a descrição trazida por ele se beneficiar também de elementos que conferem cadência melódica, como o ritmo alcançado pela pontuação na primeira linha do texto ou as aliterações presentes ao longo dele (Tristes nevoeiros, frios negrumes da longa treva boreal... / se ouve a voz do vento que passa uivando...). Esses elementos se associam a uma linguagem impressionista na medida em que contribuem para enunciar a impressão do narrador a respeito do ambiente que descreve, o inverno.