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Questão 34 Unicamp 2025 - 1ª fase

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Questão 34

Sociologia e Sérgio Buarque de Holanda

Texto 1

Em Raízes do Brasil (São Paulo, Companhia das Letras, 2016), Sérgio Buarque de Holanda argumenta que as formas de convívio social no país seriam ditadas preferencialmente por uma ética de fundo emotivo: a cordialidade. No entanto, a cordialidade não seria sinônimo de afetividade ou de gentileza. Ela corresponderia a um mecanismo de defesa do indivíduo diante da sociedade e reforçaria sentimentos particularistas e antipolíticos, característicos do ambiente doméstico. Ao tipo social guiado pela ética da cordialidade, o autor dá o nome de homem cordial.

Texto 2

"Sabe, no fundo eu sou um sentimental

Todos nós herdamos no sangue lusitano uma boa dosagem de lirismo (além da sífilis, é claro)

Mesmo quando as minhas mãos estão ocupadas em torturar, esganar, trucidar

Meu coração fecha os olhos e sinceramente chora... (...) Se trago as mãos distantes do meu peito

É que há distância entre intenção e gesto”

(Trecho da canção “Fado Tropical”, de Chico Buarque de Holanda, 1973).


Tendo em vista os textos 1 e 2, é possível afirmar que o homem cordial



a)

manifesta adesão a normas de convívio pessoalizadas, marcadas pela ética da cordialidade e pela centralidade de vínculos privados mesmo em espaços coletivos e públicos.

b)

é um tipo social que se originou na colonização portuguesa, marcado pela ética emotiva e solidária da cordialidade e por uma prática de cunho coletivo e supraindividual.

c)

percebe, como ambiente propício ao seu desenvolvimento individual, a vida em sociedade; para ele, a ética da cordialidade permite a impessoalidade dos vínculos sociais.

d)

manifesta um apego aos valores da personalidade configurada pelo recinto doméstico, ambiente próprio da concorrência entre os cidadãos.

Resolução

O conceito de homem cordial, presente na obra Raízes do Brasil, faz referência ao tipo ideal do brasileiro: aquele que apresenta dificuldade de lidar com situações sociais que são excessivamente formais,  impessoais e com regras muito rígidas, uma vez que deseja impor laços afetivos e pessoais mesmo em ambientes públicos e coletivos, os quais deveriam ser regidos pela racionalidade e formalidade. Sérgio Buarque de Holanda adverte que não devemos confundir tal cordialidade com gentileza ou simpatia porque a cordialidade do brasileiro se manifesta de formas violentas, opressoras, desrespeitadoras das regras e leis impostas, sempre sob o pretexto do afeto, da simpatia, da informalidade e da flexibilidade.

Consideramos cordial a dificuldade de cumprir prazos e horários combinados, o uso frequente do diminutivo na língua portuguesa, a proximidade informal que os brasileiros possuem com imagens de santos do catolicismo e o paternalismo da nossa política, por exemplo.

a) Correta. A alternativa define corretamente o conceito de homem cordial, na medida em que reforça o comportamento marcado pela pessoalidade, mesmo em ambiente públicos e coletivos.

b) Incorreta. Para Sérgio Buarque de Holanda, a cordialidade teria sido originada pela colonização portuguesa, mas não é caracterizada por uma ética solidária, nem por práticas coletivas e supraindividuais.  

c) Incorreta. O problema dessa alternativa é a ideia de que "a ética da cordialidade permite a impessoalidade dos vínculos sociais". Na lógica da cordialidade, os vínculos são absolutamente pessoais, afetivos e informais.

d) Incorreta. O ambiente considerado próprio da concorrência entre os cidadãos é o espaço público e coletivo, não o recinto doméstico. A cordialidade representa a prática de transpor comportamentos tipicamente domésticos e privados para os espaços coletivos e públicos.