Para responder às próximas questões, leia a crônica “Nós, o dicionário e a professora Dina” da escritora angolana Ana Paula Tavares.
O dicionário e a professora Dina entraram nas nossas vidas ao mesmo tempo. Também as palavras tática, guerra, resistência. A professora Dina pretendia domesticar o nosso português corta-mato, infalível nas batalhas de rua, eficaz no nosso ódio à ordem, disciplina. Era um português praticado na rua pedindo de empréstimo às outras línguas palavras, construções, tudo o que pudesse facilitar a frase curta, intensa, eficaz. A professora […] apresentou-nos o Dicionário. A partir daquele dia tal livrinho devia permanecer aberto para sempre nas nossas vidas. A professora Dina acreditava […] que “se olhássemos tempo suficiente para o escuro, acabaríamos por ver aí alguma coisa”. Descobrimos juntos a história dos dicionários e da língua. Fomos à procura da palavra através da “compilação completa ou parcial das unidades léxicas de uma língua (palavras, locuções, afixos) ou de certas categorias dessa língua, organizadas numa certa ordem convencionada, geralmente alfabética, e que fornece, além das definições, informações sobre sinônimos, antônimos, ortografia, pronúncia, classe gramatical e etimologia”. Descobrimos os mais variados dicionários, desde os especializados na linguagem de uma época, ou de um escritor determinado, aos das diferentes áreas do saber. A história da língua tornou-se-nos familiar através da origem das palavras e da sua evolução no tempo.
Fomos tomando posse de uma língua que era a nossa língua materna mas da qual só conhecíamos o ruído, o grito, a ponta afiada para ser usada na rua. O silêncio, as formas de pensar e julgar, e as escalas de valor foram aprofundados com a consulta do dicionário. […] Um dicionário, mesmo de recursos simples, oferece palavras e expressões saídas da poeira da memória, que voltam aqui prontas para nosso serviço […]. A linguagem em si não é precisa nem imprecisa. Nós é que a podemos usar de forma menos cuidada, alterando os caminhos que a semântica nos propõe. […] A sugestão continua a ser: mantenham o dicionário sempre aberto, em revisita aos falares e sabores em e da língua portuguesa e de todas as outras que nos rodeiam.
(Ana Paula Tavares. Um rio preso nas mãos, 2019.)
Observa-se o emprego de palavra formada com sufixo que, no contexto, expressa afetividade em:
a) |
“A partir daquele dia tal livrinho devia permanecer aberto para sempre nas nossas vidas.” (1º parágrafo) |
b) |
A sugestão continua a ser: mantenham o dicionário sempre aberto, em revisita aos falares e sabores em e da língua portuguesa e de todas as outras que nos rodeiam.” (2º parágrafo) |
c) |
“Descobrimos os mais variados dicionários, desde os especializados na linguagem de uma época, ou de um escritor determinado, aos das diferentes áreas do saber.” (1º parágrafo) |
d) |
“O dicionário e a professora Dina entraram nas nossas vidas ao mesmo tempo.” (1º parágrafo) |
e) |
“A história da língua tornou-se-nos familiar através da origem das palavras e da sua evolução no tempo.” (1º parágrafo) |
a) Correta. No trecho trazido pela alternativa, há a palavra “livrinho”, formada por meio do processo de derivação (acréscimo do sufixo “-inho” à palavra primitiva “livro”). Tal sufixo pode, a depender do contexto, gerar sentidos completamente opostos, como afetividade; carinho ou mesmo desprezo; ironia. Nesse sentido, é essencial que o candidato se atente ao significado deste morfema dentro de seu contexto. Na crônica “Nós, o dicionário e a professora Dina” da escritora angolana Ana Paula Tavares, o “livrinho” é descrito de forma afetiva pela narradora, pois, a partir do momento em que a professora apresenta o “livrinho” (um dicionário, objeto normalmente de tamanho diminuto), ela e seus colegas de turma foram “(...) tomando posse de uma língua que era a nossa língua materna mas da qual só conhecíamos o ruído, o grito, a ponta afiada para ser usada na rua”. Isto é, o “livrinho” dá início a um processo de aprendizado e apropriação da língua materna dos personagens, o qual é narrado com grande carga sentimental.
As alternativas b), c), d) e e) estão incorretas. Não ocorre nos trechos citados o emprego de palavra formada com sufixo que, no contexto, expresse afetividade.