A cidade medieval é, antes de mais nada, uma sociedade da abundância, concentrada num pequeno espaço em meio a vastas regiões pouco povoadas. Em seguida, é um lugar de produção e de trocas, onde se articula o artesanato e o comércio, sutentados por uma economia monetária. É também o centro de um sistema de valores particular, do qual emerge a prática laboriosa e criativa do trabalho, o gosto pelo negócio e pelo dinheiro, a inclinação para o luxo, o senso da beleza. É ainda um sistema de organização de um espaço fechado com muralhas, onde se penetra por portas e se caminha por ruas e praças e que é guarnecido por torres.
LE GOFF, J.; SCHMITT, J-C. Dicionário temático do Ocidente Medieval. Bauru: Edusc, 2006.
No texto, o espaço descrito se caracteriza pela associação entre a ampliação das atividades urbanas e a
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emancipação do poder hegemônico da realeza. |
b) |
aceitação das práticas usurárias dos religiosos. |
c) |
independência da produção alimentar dos campos. |
d) |
superação do ordenamento corporativo dos ofícios. |
e) |
permanência dos elementos arquitetônicos de proteção. |
a) Incorreta. Não é possível afirmar que a Idade Média foi caracterizada como um espaço de poder hegemônico da realeza. O período medieval está atrelado ao conceito de feudalismo, no qual o poder político é descentralizado e difuso entre os membros das classes senhoriais. Ainda que os reis existissem nesse período, seu poder dependia das relações de suserania e vassalagem estabelecidos com membros da nobreza, estes últimos detentores de fato do poder político difuso medieval. Um exemplo que ilustra essa relação de dependência do poder real para com a nobreza são as próprias relações militares, tendo em vista que não existiam exércitos nacionais e o uso da força militar pelo rei dependendia diretamente da adesão e da participação de nobres e seus exércitos no conflito.
b) Incorreta. É incorreto afirmar que a Igreja Católica aceitava as práticas usurárias neste contexto histórico. A usura, isto é, o ato de emprestar dinheiro com a cobrança de juros era condenada e classificada como pecado dentro de uma sociedade profundamente cristianizada como a medieval. É possível encontrar evidências que condenam a prática da usura dentro da cristandade desde a Antiguidade, ainda que a perseguição e coibição de tal prática tenha ganhado força especialmente a partir do século XI, contexto de crescimento do processo de renascimento urbano e comercial. Em linhas gerais, a usura era considerada um pecado por ser entendida como a venda de algo que não lhe pertence, isto é, o tempo entre o momento do emprétismo até o pagamento completo com juros. Portanto, por vender algo que não é de sua propriedade, a usura era associada ao roubo e ao pecado e condenado pela igreja.
c) Incorreta. A cidade medieval tinha profunda relações com as áreas rurais contíguas, fundamentais para o abastecimento de gêneros básicos e de materias para seu funcionamento. O próprio processo de Renascimento Urbano está intimamente atrelado ao excedente alimentar na produção agrícola, proporcionado por inovações técnicas surgidas ao longo dos séculos X e XI. Desta forma, como as áreas rurais eram responsáveis pela produção primária que abastecia os espaços urbanos, é incorreto afirmar que havia uma independência entre cidade e campo, ainda que o texto fornecido pela questão estabeleça um contraste entre a vida citadina e rural.
d) Incorreto. Ao contrário de uma suposta superação das corporações de ofício sugerida pela alternativa, tais instituições apresentam grande importância nas cidades medievais, sendo responsáveis pelo controle de diversos aspectos nos diferentes orfícios medievais. Estas corporações, por exemplo, eram responsáveis pelo recebimento e formação de aprendizes em determinadas profissões, além do controle contra a falsificação e mau desempenho de sua atividade. Também buscavam combater o acúmulo de atividades e serviços em um determinado mestre, desempenhando, portanto, uma forte influência e ordenação dentro das cidades medievais.
e) Correta. As cidades medievias apresentavam uma coexistência espacial de grandes estruturas de proteção - como muralhas e torres - e uma intensa vida citadina interna, conforme descrito pelo texto. Tais espaços urbanos eram importantes centros de poder, comércio e religião, abrigando desde sedes episcopais até espaços voltados para as transações comerciais. As estruturas de proteção eram fundamentais em um contexto de guerras e saques constantes, facilitando e permitindo assim o desenvolvimento econômico e sociais em suas áreas internas. Tal coexistência singular destas estruturas e da intensa vida citadina medieval é uma das principais características da urbe medieval.