Leia o soneto do poeta português Manuel Maria Barbosa du Bocage, para responder às questões de 13 a 16.
Olha, Marília, as flautas dos pastores,
Que bem que soam, como estão cadentes!
Olha o Tejo a sorrir-se! Olha: não sentes
Os Zéfiros1 brincar por entre as flores?
Vê como ali, beijando-se, os Amores
Incitam nossos ósculos2 ardentes!
Ei-las de planta em planta as inocentes,
As vagas borboletas de mil cores!
Naquele arbusto o rouxinol suspira;
Ora nas folhas a abelhinha para.
Ora nos ares, sussurrando, gira.
Que alegre campo! Que manhã tão clara!
Mas ah!, tudo o que vês, se eu não te vira,
Mais tristeza que a noite me causara.
(Manuel Maria Barbosa du Bocage. Poemas escolhidos, 1974.)
1 Zéfiro: vento que sopra do ocidente.
2 ósculo: beijo.
A paisagem retratada no soneto constitui um tópico recorrente na poesia
a) |
realista. |
b) |
romântica. |
c) |
naturalista. |
d) |
arcádica. |
e) |
simbolista. |
a) Incorreta. Diferentemente do que se vê no poema, a paisagem realista é desprovida de idealizações e retratada de maneira objetiva.
b) Incorreta. Embora seja possível identificar, em alguns poemas românticos, o retrato de uma natureza idealizada, que reflete os estados de alma do eu-poemático, nota-se, no soneto de Bocage, alguns elementos próprios das convenções árcades, como os pastores tocando flautas. Outro fator é a presença das chamadas “maiúsculas alegorizantes” – em “Zéfiros” e “Amores”, remetendo a uma tradição clássica e referindo-se à mitologia greco-romana. Vale destacar também que, na estética romântica, há uma maior exploração do sentimentalismo, enquanto que, no poema apresentado, as emoções associadas à paisagem são mais contidas, equilibradas.
c) Incorreta. Na literatura naturalista, a paisagem é comumente retratada com foco em aspectos degradantes, insalubres, que geralmente induzem os seres humanos a desenvolverem comportamentos imorais e animalescos.
d) Correta. Manuel Maria Barbosa du Bocage é o mais conhecido poeta árcade português. No soneto em questão, a paisagem retratada segue os padrões da poesia cultivada durante o período literário denominado de Arcadismo, a começar pelo ambiente bucólico, com a presença de pastores e a citação de elementos da natureza na descrição do espaço campestre. Além disso, Bocage segue a temática do locus amoenus, ou seja, estabelece um clima agradável, harmônico e alegre, ao elogiar a música das flautas e personificar determinados elementos, como “o (rio) Tejo a sorrir-se”, os ventos (Zéfiros) brincando, as borboletas inocentes, o rouxinol que suspira e a abelhinha que sussurra. Outro elemento é a exploração da “maiúscula alegorizante” como referência à tradição clássica e à mitologia greco-romana, como se verifica nos termos “Zéfiros” e “Amores”. Finalmente, na última estrofe, o primeiro verso retoma e resume essa paisagem idealizada, carcteristicamente arcádica: “Que alegre campo! Que manhã tão clara!”.
e) Incorreta. A estética simbolista tende a explorar paisagens noturnas e a retratar ambientes de modo vago, sugerindo ao invés de nomear. As situações representadas são permeadas por misticismo, religiosidade e/ou ambientes oníricos. Assim, por meio da exploração de figuras de linguagens como metáforas, sinestesias e aliterações, a poesia simbolista busca alcançar um mundo que transcende a matéria.