A destruição dos habitats e o aumento da fragmentação ambiental com redução das interações populacionais têm aumentado a necessidade de intervenções para a conservação de espécies de animais. A miopatia da captura é a principal responsável pela morte de animais em intervenções que visam à sua preservação, sendo ocasionada pelo estresse induzido e pelo esforço físico que tipicamente ocorrem durante a perseguição, captura, contenção e transporte dos animais. Como sinais da miopatia da captura, os animais apresentam rigidez muscular, fraqueza, falta de coordenação motora, acidose metabólica e presença de mioglobina na urina.
(Adaptado de: BREED, D. et al. Conservation Physiology. Oxford, v. 7, p. coz027, jul. 2019.)
a) Foi proposto que a miopatia da captura poderia ser compreendida como um mecanismo inerente aos animais e que os levaria a morrer mais rápido quando capturados por um predador, o que auxiliaria o predador a conservar energia. Essa proposta está de acordo com a teoria da seleção natural? Justifique a sua resposta.
b) A condição da miopatia da captura é frequentemente fatal, e a degeneração do tecido muscular estriado esquelético é induzida por estresse ou esforço. Cite as duas proteínas que compõem os filamentos de uma miofibrila e que são responsáveis pela capacidade de contração do músculo estriado esquelético. Na placa motora, qual é a interação que determina a contração muscular?
A questão aborda o problema ecológico de fragmentação de habitats com o isolamento de populações, o que pode levar à dificuldade de interação de indivíduos de uma mesma espécie e à redução do fluxo gênico. Nesse contexto, os corredores ecológicos são uma alternativa para possibilitar a ligação entre fragmentos e reduzir o isolamento. No entanto, outras estratégias de conservação que envolvem a contenção, manuseio e transporte de animais selvagens podem ser necessárias, o que gera estresse aos animais selvagens e leva à miopatia da captura. Essa síndrome pode ser prevenida adotando metodologias que diminuem o impacto da contenção, principalmente com o uso de sedativos.
a) De acordo com o Darwinismo, os indivíduos de uma população apresentam variações, que são submetidas às pressões seletivas de determinado ambiente. As características que são mais vantajosas, ou seja, que garantem maior chance de sobrevivência aos indivíduos são selecionadas e, por meio da reprodução, são passadas às gerações futuras, aumentando em quantidade na população.
Pelos dados do enunciado, a miopatia da captura é um processo que prejudica o animal. Em uma relação de predação, esse processo, que pode ser induzido por esforço físico durante uma perseguição, dificultaria a fuga da presa e reduziria a sua chance de sobrevivência. Assim, a miopatia é uma síndrome desvantajosa e que não deve ser transferida às futuras gerações. Dessa forma, não está de acordo com o esperado por meio do processo de seleção natural, que seleciona os organismos por meio da sua capacidade de sobrevivência e reprodução.
b) As duas proteínas que compõem os filamentos de uma miofibrila e que são responsáveis pela capacidade de contração do músculo estriado esquelético são a actina e a miosina.
O músculo estriado esquelético é formado por feixes de fibras musculares chamados de fascículos. Cada fibra muscular de um fascículo representa uma única célula, que possui em seu citosol as miofibrilas. Cada miofibrila, por sua vez, é formada por inúmeras unidades de contração, chamadas de sarcômeros. E cada sarcômero é constituído por dois tipos de filamentos proteicos principais: a actina (filamento fino) e a miosina (filamento grosso) (Figura 1).
Figura 1: estrutura do músculo estriado esquelético, mostrando a miofibrila, o sarcômero e os filamentos de actina e miosina. Fonte: banco de imagem.
Os microfilamentos, ou filamentos de actina, são componentes do citoesqueleto da célula, enquanto a miosina é a proteína motora capaz de se associar aos filamentos de actina e se deslocar sobre eles, utilizando a energia derivada da hidrólise do ATP. Devido ao arranjo dos filamentos proteicos no sarcômero, essa estrutura é capaz de sofrer um processo de encurtamento, ou seja, de redução de tamanho, quando ocorre o movimento da actina sobre a miosina. O modelo subjacente ao funcionamento do sarcômero e que explica o processo de contração muscular é conhecido como modelo do deslizamento de filamentos: conforme os filamentos de actina deslizam sobre os filamentos de miosina, há uma redução do tamanho do sarcômero, o que resulta na redução do tamanho da miofibrila e, consequentemente, da fibra muscular e do músculo.
O processo de contração muscular depende, além do ATP, dos íons cálcio (Ca2+). Esses íons permitem a ligação da cabeça da miosina aos filamentos de actina, promovendo o deslizamento dos filamentos. Quando o músculo está relaxado, os íons cálcio ficam armazenados no retículo sarcoplasmático (retículo endoplasmático liso modificado) da célula. Quando o músculo recebe um sinal apropriado, o cálcio é liberado da organela, dispersando-se no citosol e promovendo a contração muscular. O sinal capaz de provocar a liberação dos cátions do retículo sarcoplasmático são neurotransmissores liberados por neurônios motores na placa motora (Figura 2).
Figura 2: a contração muscular depende da sinapse estabelecida entre o terminal axônico do neurônio motor e a fibra muscular (1); o terminal axônico libera o neurotransmissor acetilcolina, que se liga em neurorreceptores presentes na sarcolema da fibra muscular (2); a sarcolema é despolarizada, sendo o sinal levado até o retículo endoplasmático por invaginações da membrana, os túbulos T (3); após a despolarização do retículo sarcoplasmático, os íons cálcio são liberados no citosol (4); o cálcio permite a associação das cabeças da miosina com os sítios ativos presentes nos filamentos de actina, provocando o deslizamento dos filamentos e, assim, a diminuição do tamanho dos sarcômeros (5). Fonte: banco de imagem.
Na placa motora, a interação que determina a contração muscular é a sinapse.
A sinapse representa a região de comunicação entre dois neurônios, ou entre um neurônio e uma célula efetora, que pode ser uma célula muscular ou uma célula glandular. Na sinapse química, que representa a maioria das sinapses no corpo humano, a comunicação entre as células não envolve contato direto, sendo mediada por substâncias químicas chamadas de neurotransmissores. No caso das fibras musculares, a sinapse estabelecida é chamada de placa motora ou junção neuromuscular. Os neurônios que participam da junção neuromuscular são chamados de neurônios motores e eles liberam o neurotransmissor acetilcolina nas fibras estriadas esqueléticas. Quando a acetilcolina se liga em neurorreceptores, presentes na fibra muscular, ocorre a despolarização da sarcolema (membrana plasmática da célula muscular), o que leva à liberação dos íons cálcio do retículo sarcoplasmático e, como consequência, à contração muscular.