je ne parle pas bien*
je ne parle pas bien
je ne parle pas bien
je ne parle pas bien
eu tenho uma língua solta
que não me deixa esquecer
que cada palavra minha
é resquício da colonização
cada verbo que aprendi conjugar
foi ensinado com a missão
de me afastar de quem veio antes
nossas escolas não nos ensinam
a dar voos
[...]
reinvenção
nossa revolução surge e urge
das nossas bocas
das falas aprendidas
que são ensinadas
e muitas não compreendidas
salve, a cada gíria
je ne parle pas bien
[...]
o que era pra ser arma de colonizador
está virando revide de ex colonizado
estamos aprendendo as suas línguas
e descolonizando os pensamento
* Je ne parle pas bien, do francês, significa “Eu não falo direito”.
(Fragmentos do poema Je ne parle pas bien, de Luz Ribeiro, publicado na Revista Opiniães:Revista dos alunos de Literatura Brasileira, n.10, 2017.)
Podemos afirmar que o uso repetido do verso Je ne parle pas bien no poema slam de Luz Ribeiro
a) |
expressa a necessidade de repetir muitas vezes uma mesma sentença como forma de resistir ao esquecimento de uma língua. |
b) |
enfatiza a ideia de que a língua francesa do colonizador ainda não foi aprendida e precisa ser repetida várias vezes. |
c) |
é uma constatação de que, na posição de ex-colônia, não conseguimos aprender línguas estrangeiras. |
d) |
indica um posicionamento de resistência por meio de uma crítica à aprendizagem forçada da língua do colonizador. |
a) Incorreta. É incorreto afirmar que o uso repetido do verso “Je ne parle pas bien” esteja associado a uma forma de resistir ao esquecimento de uma língua, uma vez que o poema coloca essa língua (francês) como a do colonizador e problematiza, justamente, o fato de os colonizados serem silenciados a partir da dominação dos colonizadores. Nesse sentido, não se procura resistir ao esquecimento da língua do colonizador, mas usá-la como estratégia de descolonização do pensamento, como deixam claros os versos finais.
b) Incorreta. A repetição do verso “Je ne parle pas bien” não indica que a língua francesa ainda não foi aprendida, uma vez que o movimento expresso pelo poema é o de que essa língua (do colonizador) foi aprendida, mas está sendo usada como forma de contestar a dominação exercida por ela. Ou seja, o poema não aponta para a ideia de que a língua deve ser aprendida e, por isso, repetida.
c) Incorreta. Não é correto afirmar que o uso repetido do verso “Je ne parle pas bien” representa uma constatação de que habitantes de ex-colônias não consigam aprender novas línguas, uma vez que a língua mencionada é justamente retratada como aquela que foi ensinada/imposta aos colonizados. Logo, aprender a língua estrangeira não foi uma dificuldade e o foco do poema é discutir o que pode ser feito com essa língua e, de forma mais abrangente, com a própria posição de ex-colônia.
d) Correta. O posicionamento destacado a partir do uso repetido do verso “Je ne parle pas bien” é o de resistência, uma vez que o poema constrói a visão de que a língua foi imposta com a finalidade de distanciar os colonizados de suas origens (“cada verbo que aprendi conjugar / foi ensinado com a missão / de me afastar de quem veio antes”) e, por isso, é importante que saibamos como usar essa língua para reconfigurarmos a relação com o colonizador. Os versos finais do poema (“o que era pra ser arma de colonizador / está virando revide de ex colonizado / estamos aprendendo as suas línguas / e descolonizando os pensamento”) deixam ainda mais evidente o viés crítico à imposição da língua: o que era para ser uma ferramenta para manipular o colonizado se transforma em um “revide”, que usa essa língua aprendida por imposição para questionar e contestar as ideias do colonizador.