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Questão 11 Unicamp 2024 - 1ª fase

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Questão 11

Tarde Mário de Andrade

Em 1921, Mário de Andrade, escrevendo a série de artigos “Mestres do passado”, publicados no Jornal do Comércio (edição de São Paulo), observou:

"Tarde [de Olavo Bilac] foi uma promessa de anos seguidos. Tais são, tão salientes os artifícios e tão repetidos que muito bem provam o esforço do poeta decaído da poesia e a sua parca inspiração (...).”

(ANDRADE, M. Mestres do passado – Olavo Bilac. In: BRITO, M.S. História do modernismo brasileiro. Antecedentes da Semana de Arte Moderna. 5.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, p. 288-289, 1978.)

 


Relacione, ao poema a seguir, o trecho da crítica anterior, assnalando a alternativa que coincide com a ideia geral de Mário sobre a obra de Bilac.

As estrelas

Olavo Bilac

Desenrola-se a sombra no regaço

Da morna tarde, no esmaiado anil;

Dorme, no ofego do calor febril,

A natureza, mole de cansaço.

 

Vagarosas estrelas! passo a passo,

O aprisco desertando, às mil e às mil,

Vindes do ignoto seio do redil

Num compacto rebanho, e encheis o espaço...

 

E, enquanto, lentas, sobre a paz terrena,

Vos tresmalhais tremulamente a flux,

– Uma divina música serena

 

Desce rolando pela vossa luz:

Cuida-se ouvir, ovelhas de ouro: a avena

Do invisível pastor que vos conduz...

(BILAC, Olavo. Tarde. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, p. 42-43, 1919.)

Esmaiado: esmaecido, pálido

Aprisco: curral

Redil: curral para o gado ovino ou caprino; rebanho de ovelhas

Tresmalhar: Afastar-se, perder-se do rebanho

Flux: fluxo

Avena: flauta pastoril



a)

O crítico lamenta o espaçamento da criação poética de Bilac, o que se expressa no poema pela imagem das estrelas que se afastam umas das outras.

b)

O crítico elogia os salientes artifícios da linguagem poética de Tarde, o que se pode perceber, por exemplo, pela variedade de sinônimos para a palavra “curral”.

c)

O crítico evoca, como resultado da pouca inspiração artística do poeta, a sobrecarga de investimento formal (os hipérbatos ou inversões, por exemplo).

d)

O crítico associa a poesia de Bilac ao estilo decadentista, o que é reforçado pelas imagens de esgotamento, como se vê nas palavras “morna”, “esmaiado”, “ofego”, “mole”, “lentas”.

Resolução

 

a) Incorreta. Mário de Andrade não lamenta o fato de Bilac ter ficado um longo tempo sem escrever. A menção ao fato de a obra “Tarde” ter sido “uma promessa de anos seguidos” serve para sustentar o argumento de que o poeta parnasiano estaria preso na repetição de recursos poéticos e desprovido de inspiração.

b) Incorreta. Fica clara na crítica de Andrade uma visão negativa a respeito da obra de Bilac, por meio de expressões como “poeta decaído da poesia” e “sua parca inspiração”. Assim, seria incorreto afirmar que ele elogia o autor de “Tarde”.

c) Correta. Conforme afirma Mário de Andrade, em “Tarde”, Bilac demonstra sua “parca inspiração” ao recorrer a “artifícios repetidos”. Dessa forma, a exploração de aspectos formais recorrentes no estilo parnasiano, como o hipérbato, seria uma maneira de mascarar a ausência de criatividade. De fato, no poema “As estrelas”, as inversões gramaticais, ou hipérbatos, são recorrentes. Nos primeiros versos, por exemplo: “Desenrola-se a sombra no regaço / Da morna tarde,no esmaiado anil”, a ordem direta seria “A sombra desenrola-se no regaço da tarde morna, no anil esmaiado”.

d) Incorreta.  O estilo decadentista foi explorado por poetas que possuíam uma visão subjetiva e pessimista diante de um mundo que passava por uma crise de valores. Esse movimento associa-se ao estilo simbolista, e não ao parnasianismo, movimento no qual se insere a poesia de Olavo Bilac. Assim, Mário de Andrade não relaciona a obra “Tarde” ao decadentismo; ele utiliza o termo “decaído” para expressar uma visão pejorativa a respeito de Bilac, cujos poemas estariam ultrapassados.